Em meio a tensões globais, a China amplia projetos bilionários para transformar carvão em petróleo e gás, reforçando sua segurança energética e atraindo investimentos para regiões menos desenvolvidas.
A China acelera sua estratégia energética ao transformar carvão em petróleo e gás, um movimento que tem ganhado cada vez mais força diante da instabilidade geopolítica mundial. A iniciativa busca reduzir a dependência de importações de combustíveis, que podem ser interrompidas em caso de conflito, ao mesmo tempo em que impulsiona o desenvolvimento de regiões menos favorecidas do país.
Com o apoio maciço do governo central e aproveitando a abundância de carvão barato, o setor se expande em um ritmo sem precedentes. Grandes projetos industriais, especialmente no noroeste do território chinês, consolidam a tendência e projetam a transformação da matriz energética do país para os próximos anos.
Crescimento acelerado da conversão de carvão em energia
O volume de carvão convertido em derivados energéticos impressiona. Somente no último ano, segundo o China National Petroleum and Chemical Planning Institute, foram 276 milhões de toneladas de carvão transformadas em petróleo, gás e produtos químicos. Para se ter uma ideia, esse montante equivale ao consumo anual de carvão de toda a Europa.
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Se todos os projetos em andamento se concretizarem, a capacidade do setor deve praticamente dobrar em cinco anos, conforme projeções da Sinolink Securities. Essa expansão é sustentada por três pilares: abundância de carvão nacional, preços competitivos no mercado interno e forte incentivo governamental.
Investimentos bilionários moldam o futuro
Entre os maiores empreendimentos do setor está o da Ningxia Baofeng Energy, que investiu 48 bilhões de iuans (cerca de US$ 6,7 bilhões) em um complexo industrial capaz de converter milhões de toneladas de carvão em produtos químicos usados principalmente na fabricação de plásticos.
Em unidades como a instalada em Ordos, na Mongólia Interior, o processo de conversão envolve aquecer o carvão a 1.300 graus Celsius para gerar gás sintético. Esse gás é posteriormente transformado em metanol e, em seguida, em olefinas, um componente essencial para a produção de plásticos e outros insumos da indústria petroquímica.
Esses projetos não apenas diversificam a matriz energética da China, mas também consolidam cadeias produtivas estratégicas, reduzindo vulnerabilidades frente às oscilações do mercado global de petróleo e gás.
Proteção contra riscos internacionais
A política de conversão de carvão em energia atende a duas necessidades centrais de Pequim. De acordo com Lauri Myllyvirta, cofundador do Centre for Research on Energy and Clean Air, a medida reduz o risco de um bloqueio marítimo às importações e, simultaneamente, direciona investimentos para áreas menos desenvolvidas.
“Na China, quando você é uma empresa estatal com uma missão clara e politicamente determinada, os custos de capital se tornam um problema menor”, afirma Myllyvirta. “Isso faz uma enorme diferença.”
O impulso ganhou ainda mais força após as tensões comerciais com os Estados Unidos durante o governo Donald Trump, que expuseram a vulnerabilidade chinesa diante de um mercado externo incerto. Desde então, Pequim tem reforçado a busca por alternativas domésticas que garantam sua segurança energética de longo prazo.
Carvão para gás: setor em plena expansão
Entre os diversos segmentos, a transformação de carvão em gás é o que mais cresce. Uma análise feita pela Reuters com base em dados da Agora Energy China, da China National Coal Association e da Guosen Securities mostra que a capacidade em construção hoje é quatro vezes maior do que a instalada na última década.
O resultado desse avanço será uma produção anual de 19,5 bilhões de metros cúbicos de gás sintético, equivalente a um quinto das importações de gás natural liquefeito (GNL) feitas pela China no ano passado.
Grande parte desses projetos está localizada no noroeste do país, onde há abundância de reservas de carvão. Só nessa região, cerca de 12 bilhões de metros cúbicos por ano de capacidade já estão em construção, com previsão de mais 10 bilhões de metros cúbicos adicionais nos próximos anos.
Vantagem econômica frente ao GNL importado
A competitividade do gás derivado do carvão é outro ponto que explica sua rápida expansão. Segundo dados da Oilchem, o preço médio desse gás é inferior a 2 iuans por metro cúbico, contra 2,87 iuans do GNL importado, sem incluir custos extras como transporte e regaseificação. Embora o gás transportado por gasoduto ainda seja mais barato, o avanço do gás sintético representa uma economia significativa para a China.
“Espera-se que a conversão de carvão em gás substitua ainda mais parte do GNL importado”, explica Sun Yang, analista da Oilchem.
Competitividade no setor químico
O impacto econômico não se limita ao setor energético. A produção de olefinas à base de carvão, por exemplo, alcançou margens de 800 a 900 iuans por tonelada recentemente, enquanto as usinas que utilizam derivados do petróleo, como nafta ou propano, registraram perdas de cerca de 200 iuans por tonelada.
Esse diferencial reforça a posição estratégica do carvão não apenas como fonte energética, mas também como matéria-prima essencial para a indústria química chinesa. Com os preços do carvão nos níveis mais baixos dos últimos quatro anos, a tendência é que a atratividade dessa rota de produção se mantenha nos próximos períodos.
Uma estratégia de longo prazo
Mesmo com oscilações históricas na viabilidade do setor, o atual cenário de preços e tensões globais impulsiona a expansão da tecnologia de conversão de carvão em petróleo e gás. Para Pequim, trata-se de mais do que uma solução de curto prazo: é uma política estratégica de Estado, capaz de assegurar autonomia, atrair investimentos e projetar o país como líder em alternativas energéticas.