Estratégia chinesa redefine o mercado da soja e pressiona Brasil e EUA com nova lógica geopolítica e comercial
China prioriza segurança alimentar e amplia controle sobre cadeia da soja
A soja, antes vista apenas como uma commodity agrícola, ganhou status de ativo geopolítico essencial neste século.
Em 2025, três países concentram os principais polos dessa disputa estratégica: Brasil, Estados Unidos e China.
O Brasil lidera a produção global, os EUA dominam a industrialização, enquanto a China responde por 61% das importações mundiais, segundo dados da FAO.
Em fevereiro de 2025, o governo chinês publicou o “Documento Central nº 1”.
O documento reforçou a prioridade absoluta da segurança alimentar, com destaque para a soja.
A meta chinesa é produzir internamente 700 milhões de toneladas de grãos por ano.
O país mantém estoques estratégicos superiores a 100 milhões de toneladas, conforme o Ministério da Agricultura e Assuntos Rurais da China.
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Ainda que o país não busque autossuficiência total em soja, visa reduzir sua vulnerabilidade externa.
Isso ocorre especialmente diante das tensões comerciais com os EUA.
Portanto, para alcançar esse objetivo, a China vem investindo em três frentes complementares:
Expansão da produção doméstica com foco em produtividade.
Diversificação de fornecedores com maior controle da cadeia.
E substituição parcial da soja por outras fontes proteicas.
Pequim aposta em inovação agrícola e armazenamento estratégico
Desde 2020, o governo chinês ampliou os investimentos em tecnologia agrícola, buscando maior rendimento por hectare.
Mais de 100 condados receberam incentivos para modernizar o cultivo de soja.
As ações incluem rotação de culturas, combate a pragas, uso de sementes aprimoradas e cultivo intercalar com milho.
Segundo o Instituto de Pesquisa em Soja da Academia Chinesa de Ciências Agrícolas, a produtividade média aumentou 18% nos últimos três anos.
Além disso, a expansão dos silos e depósitos estratégicos tem sido acelerada.
Na província de Hebei, foi construído o complexo Qinhuangdao Haigang, com 370 mil metros quadrados.
Ele é hoje o maior centro de armazenagem de grãos do planeta.
Opera com 90 silos verticais e sistema de monitoramento digital.
O investimento superou US$ 3,3 bilhões, segundo a Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma da China.
Com essa estrutura, a China garante maior autonomia logística.
Ela reduz riscos de interrupção e fortalece sua posição nas negociações comerciais com EUA e Brasil.
Brasil lidera produção, mas depende da China e enfrenta riscos crescentes
O Brasil colheu 168 milhões de toneladas de soja na safra 2024/2025, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
O Mato Grosso respondeu por 50,6 milhões de toneladas.
A produção ocupa cerca de 40 milhões de hectares.
Ela representa 28% do PIB do agronegócio brasileiro.
Historicamente, o Brasil se beneficiou da expansão chinesa.
Desde a guerra comercial entre EUA e China em 2018, os embarques brasileiros cresceram vertiginosamente.
Em 2024, o Brasil exportou 75 milhões de toneladas à China, totalizando US$ 36,5 bilhões.
Em contrapartida, os EUA exportaram 22 milhões de toneladas, somando US$ 12 bilhões.
Entretanto, essa relação de dependência tornou-se crítica.
Cerca de 73% da soja brasileira tem como destino o mercado chinês.
Esse patamar impõe riscos significativos ao país.
Qualquer retração nas compras da China poderá causar excedente interno.
Haveria queda nos preços e impacto no superávit comercial brasileiro.
A economia sofreria com perda de divisas, oscilação cambial e redução da arrecadação dos estados exportadores.
Estados Unidos modernizam cultivo e buscam retomar espaço com apoio político
Mesmo após perder a liderança para o Brasil, os Estados Unidos seguem como potência na produção de soja.
Foram cerca de 118 milhões de toneladas colhidas em 2024, conforme o USDA.
A região do Alto Centro-Oeste concentra a maior produção.
Estados como Illinois, Iowa e Minnesota são os principais produtores.
Mais de 87 milhões de acres foram cultivados com soja.
Cerca de 70 milhões de toneladas foram destinadas à indústria de esmagamento.
Outras 44 milhões de toneladas foram exportadas.
A China recebeu 52% do total exportado pelos EUA.
Em agosto de 2024, o ex-presidente Donald Trump sugeriu que Pequim aumentasse as compras de soja americana.
A China sinalizou disposição para negociar novo acordo, semelhante ao firmado em 2020.
O chamado “Acordo de Fase 1” previa a compra anual de US$ 40 bilhões em produtos agrícolas dos EUA por dois anos consecutivos.
Caso as compras americanas aumentem, o Brasil poderá perder espaço.
Os dois exportadores disputariam um único e poderoso comprador: a China.
Pressão chinesa pode forçar o Brasil a rever sua estratégia global
Mesmo com mudanças internas, a China continuará sendo o maior destino da soja mundial. No entanto, a atual política externa sinaliza o fim do crescimento garantido.
Dessa forma, o Brasil precisará rever sua dependência da China. Além disso, será essencial desenvolver novas estratégias comerciais para enfrentar os desafios do mercado global.
Para isso, será necessário diversificar os mercados, agregar valor à produção rural e, ao mesmo tempo, investir fortemente na industrialização do agronegócio nacional.
Ademais, a exportação de produtos derivados da soja, como farelo, óleo e biodiesel, poderá reduzir de forma significativa a vulnerabilidade externa do país.
Além disso, o Brasil tem potencial para ampliar a exportação de proteína animal processada, o que trará um maior valor agregado à cadeia produtiva.
Com isso, o fortalecimento das rotas logísticas e a assinatura de novos acordos comerciais poderão ampliar consideravelmente a base de compradores internacionais.
Enquanto isso, Ásia, Europa e África surgem como mercados estratégicos que precisam ser explorados com mais intensidade por produtores e exportadores brasileiros.
A soberania econômica brasileira dependerá da sua capacidade de adaptação. Por esse motivo, o setor agrícola precisa reagir com rapidez às mudanças geopolíticas.
Hoje, o mundo agrícola está cada vez mais integrado ao tabuleiro geopolítico. Dessa forma, a soja passou de commodity simples para peça central de um jogo dinâmico.