Estudo revela tarifa de 10,76 % sobre aço brasileiro rumo à Europa, antecipando impacto financeiro e acelerando investimentos em descarbonização por Gerdau, Usiminas e CSN antes da cobrança efetiva em 2026.
O custo ambiental entrou de vez na conta das siderúrgicas brasileiras.
Um levantamento da OPIS, braço de inteligência da Dow Jones, indica que o Carbon Border Adjustment Mechanism (CBAM) vai adicionar 10,76 % a cada dólar em produtos de ferro e aço enviados do Brasil para a União Europeia.
O impacto começa a pesar desde agora, ainda que a cobrança financeira só esteja prevista para 1.º de janeiro de 2026, e pressiona gigantes como Gerdau, Usiminas e CSN a revisar a estratégia de exportação.
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Sobrecusto já aparece nas planilhas de venda
O Brasil destinou 12,5 % de suas exportações de ferro-aço ao mercado europeu nos últimos 12 meses.
Com o CBAM em fase de testes desde outubro de 2023, os importadores precisam remeter relatórios trimestrais sobre emissões.
Em pouco mais de um ano, terão de comprar certificados de carbono calculados pelo preço médio semanal dos leilões do EU ETS.
O índice de exposição ao comércio (Trade Exposure Index) de 0,942 — o mais alto da América Latina — reforça o risco para o setor, que já paga três vezes mais que a média exigida de fornecedores europeus (3,21 %).
Como funciona o CBAM
Criado para “nivelar o campo de jogo” entre bens produzidos dentro e fora do bloco, o CBAM contabiliza o carbono emitido ao longo da cadeia e cobra uma tarifa equivalente ao custo enfrentado pelos fabricantes europeus que participam do EU Emissions Trading System (ETS).
Entre 2023 e 2025, as empresas devem apenas informar dados.
A partir de 2026, cada tonelada importada de aço, alumínio, cimento, fertilizantes, eletricidade e hidrogênio precisará de um certificado lastreado no ETS.
O cronograma estipula a entrega dos primeiros créditos até fevereiro de 2027, relativos às importações do ano anterior.
Brecha de isenção continua estreita
Apesar das discussões em Bruxelas, analistas consideram improvável uma anistia ampla.
A Comissão Europeia chegou a propor a exclusão de até 80 % dos importadores para reduzir burocracia, mas os volumes elegíveis são residuais.
Em maio último, o Parlamento Europeu apoiou deixar fora do escopo cargas inferiores a 50 toneladas anuais e adiar a compra obrigatória de certificados para 2027 — mudança que afeta apenas 1 % das emissões envolvidas.
O grosso da conta, portanto, permanece para quem embarca grandes volumes, caso das siderúrgicas brasileiras.
Conta salgada para o aço nacional
O estudo da OPIS calcula que a alíquota média de 10,76 % equivale a mais de US$ 100 por tonelada, caso o preço do carbono se mantenha no intervalo de € 90 a € 110 previsto para 2026.
Com margens já apertadas, as companhias precisam decidir se absorvem parte do valor ou o repassam ao cliente final.
Nos dois cenários, a competitividade do aço brasileiro se deteriora frente a produtores norte-americanos, que não pagam a tarifa ao vender dentro dos Estados Unidos.
Gerdau acelera projetos de aço verde
Metade da receita da Gerdau vem da América do Norte, mas a empresa mantém um fluxo constante de semiacabados de alto valor para a Europa.
Para mitigar riscos, anunciou investimentos de R$ 3,2 bilhões até 2026 na expansão de capacidade de mineração e em tecnologia de baixo carbono no Brasil, além de reforçar o uso de sucata metálica e fornos elétricos em operações norte-americanas — rota isenta do CBAM.
Usiminas adapta inventários de emissões
A Usiminas exporta placas e chapas galvanizadas que alimentam a indústria automotiva europeia.
O relatório de sustentabilidade mais recente confirma alinhamento ao GHG Protocol e detalha a construção de um inventário de emissões compatível com as planilhas exigidas por Bruxelas.
A companhia discute contratos de venda com cláusula de “FOB neutro em carbono” para evitar custos adicionais ao comprador.
CSN mapeia pegada de carbono
Já a CSN diversifica exportações entre aço, minério e cimento.
Em teleconferência de resultados, a diretoria listou o “mapeamento de pegada de carbono” como prioridade de 2025, passo considerado fundamental para evitar sobretaxas aos clientes europeus.
A empresa também analisa a conversão parcial de altos-fornos para rotas que usem gás natural e, no futuro, hidrogênio verde.
Choque político em Bruxelas
Em meio ao trâmite técnico, a discussão ganhou contornos políticos.
O comissário europeu para o Clima, Wopke Hoekstra, defende limitar o CBAM aos 20 % de importadores responsáveis por 97 % das emissões, reduzindo obrigações para pequenas firmas sem mexer na tarifa por tonelada de CO₂.
Parlamentares, por sua vez, votaram por estender a isenção a 90 % das empresas, mas adiar somente a cobrança — não a extinção — dos certificados.
Para especialistas, a medida simplifica a papelada, mas não muda o jogo para produtores intensivos em carbono, como Brasil e Turquia.
O que falta fazer até 2026
As siderúrgicas brasileiras precisam cumprir uma série de etapas: inventariar emissões de cada usina segundo a metodologia europeia, certificar cadeias de suprimento — do coque à energia elétrica — e negociar contratos que já internalizem o custo do carbono ou repassem a diferença ao comprador.
Sobretudo, é preciso investir em rotas tecnológicas de menor emissão, como fornos elétricos alimentados por sucata ou hidrogênio verde.
Monitorar o comportamento do EUA Allowance, referência para o preço dos certificados, também virou rotina nos departamentos de planejamento.
Prazos que entram no radar
O calendário é apertado.
O último relatório trimestral da fase transitória deve ser enviado até 31 de janeiro de 2026.
No dia 1.º seguinte, começa a acumular a obrigação financeira, calculada retrospectivamente sobre cada embarque.
A entrega dos primeiros certificados, correspondente ao ano de 2026, foi marcada para fevereiro de 2027.
Paralelamente, a Comissão Europeia publicará no quarto trimestre de 2025 a revisão do CBAM, que pode incluir setores como autopeças e máquinas, ampliando o alcance da tarifa.
Por que o tema deve ganhar evidência
A combinação de prazo fechado, impacto direto no custo do aço e potencial repasse ao preço de carros, eletrodomésticos e obras públicas deve elevar o CBAM ao topo da agenda de buscas e manchetes.
Além disso, a tensão entre metas climáticas rigorosas e a necessidade de preservar a competitividade industrial confere apelo tanto econômico quanto ambiental, um prato cheio para algoritmos de recomendação de conteúdo.
Será que o setor conseguirá transformar a corrida por descarbonização em vantagem competitiva antes que a tarifa europeia comece a pesar no caixa?