Com o avanço da tributação internacional e a falta de acordos entre países, quem possui contas no exterior pode acabar pagando imposto de herança no Brasil e no país onde o dinheiro está depositado, o que gera risco de dupla cobrança.
Ter contas no exterior é uma prática cada vez mais comum entre brasileiros que buscam diversificação financeira, investimentos internacionais ou proteção cambial. No entanto, em caso de falecimento do titular, esses recursos podem estar sujeitos à bitributação no imposto sobre herança, já que tanto o Brasil quanto o país estrangeiro podem exigir o pagamento do tributo.
A ausência de tratados bilaterais que evitem a dupla cobrança e as diferenças entre as legislações sucessórias criam um cenário complexo. Dependendo de onde os valores estão aplicados, o inventário pode ocorrer fora do país e o imposto ser cobrado novamente no Brasil, o que aumenta a carga tributária sobre os herdeiros.
Como funciona a sucessão de bens no exterior
De acordo com a legislação brasileira, a Justiça do Brasil é competente para processar o inventário de bens localizados em território nacional.
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Já os ativos mantidos em outros países seguem as regras da jurisdição onde estão depositados.
Isso significa que uma mesma herança pode ser dividida em processos diferentes, com tributações independentes.
Em países como os Estados Unidos, o limite de isenção do imposto sobre herança para estrangeiros não residentes é de US$ 60 mil (cerca de R$ 320 mil).
Acima desse valor, pode incidir uma alíquota de até 40%, variando conforme o estado. No entanto, o saldo mantido em contas bancárias comuns costuma ser isento, ao contrário de investimentos e imóveis, que são tributáveis.
No Brasil, o ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação) é de competência estadual e pode chegar a 8%, de acordo com cada unidade da federação.
Como o país não possui acordo para evitar a bitributação de heranças, os herdeiros podem acabar pagando imposto nos dois países sem possibilidade de compensação.
Diferenças entre legislações e conflitos na partilha
A legislação brasileira estabelece que metade do patrimônio deve obrigatoriamente ser destinada aos herdeiros necessários, como filhos e cônjuges.
Já em jurisdições como os EUA e o Reino Unido, há maior liberdade para o testador definir quem receberá os bens o que pode gerar conflitos quando os recursos estão em contas no exterior.
Em casos de discrepância, o Judiciário brasileiro pode intervir para anular disposições consideradas fraudulentas ou contrárias à lei nacional.
“Não dá para transferir todo o patrimônio para uma conta fora do país e deixar herdeiros diretos sem nada. O Brasil reconhece o vínculo familiar e protege essa parte legítima”, explica o advogado tributarista Matheus Piconez.
Essa diferença de sistemas faz com que planejamentos sucessórios internacionais exijam análise detalhada, considerando tanto a legislação do país onde estão os ativos quanto as regras brasileiras de sucessão.
Mecanismos para evitar inventário no exterior
Alguns países oferecem instrumentos que reduzem a burocracia e aceleram a sucessão. Um exemplo é o “joint tenancy with right of survivorship”, usado em Estados Unidos, Canadá, Reino Unido e Austrália.
Nesse modelo, os bens passam automaticamente ao coproprietário em caso de falecimento, sem necessidade de inventário judicial.
Apesar de agilizar o processo, o arranjo não elimina o risco de tributação, já que o Brasil pode considerar a transferência como fato gerador do ITCMD.
Além disso, há discussões sobre quando o imposto deve incidir se no momento em que a conta é aberta em conjunto ou apenas após a morte de um dos titulares.
No Brasil, a conta conjunta segue regra diferente: os valores nela depositados entram normalmente no processo de partilha entre os herdeiros, mesmo que o cotitular continue vivo.
Planejamento sucessório e armadilhas tributárias
Para quem tem contas no exterior, o planejamento sucessório é essencial. Estruturas como trusts, testamentos e cotitularidade de bens podem ajudar a reduzir burocracias, mas precisam ser bem elaboradas para não gerar novas obrigações fiscais.
Advogados especializados alertam que não há solução única ou isenta de riscos. Contas abertas em paraísos fiscais ou países de baixa tributação como Luxemburgo e Ilhas Virgens Britânicas podem escapar do imposto local, mas o Brasil ainda pode exigir o ITCMD sobre esses valores quando a legislação estadual autorizar.
“O principal cuidado é avaliar a legislação do país onde estão os ativos. Uma estratégia que funciona nos EUA pode ser inviável no Brasil.
Cada caso exige um desenho próprio e transparente perante o Fisco”, ressalta Hermano Barbosa, tributarista do BMA Advogados.
Um cenário de mudanças e novas regras
Com a reforma tributária aprovada em 2023, os estados ganharam mais clareza sobre como regulamentar a cobrança do ITCMD em heranças no exterior.
Muitos governos estaduais já se preparam para atualizar suas leis e tributar transmissões internacionais de patrimônio, o que deve aumentar o número de casos de bitributação nos próximos anos.
A expectativa é que, sem um tratado bilateral, a carga tributária sobre heranças fora do país se torne mais pesada, afetando especialmente brasileiros com investimentos em dólar ou imóveis no exterior.
Você acha justo que quem tem contas no exterior pague imposto de herança duas vezes, no Brasil e no país onde o dinheiro está aplicado? A bitributação é uma forma de equilíbrio fiscal ou um excesso do sistema tributário? Deixe sua opinião nos comentários queremos saber como você vê esse tema na prática.