Análise da CNN detalha “via intermediária” do governo para regular as big techs, fortalecendo autarquia contra práticas anticompetitivas
O Brasil está definindo um caminho próprio para a regulação econômica das big techs, optando por uma “via intermediária” que se diferencia dos modelos adotados nos Estados Unidos e na Europa. A estratégia, detalhada em análise de especialistas à CNN, foca em fortalecer o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) como o “xerife” do setor. A proposta prevê a criação de uma superintendência específica dentro da autarquia para monitorar e combater práticas anticompetitivas das gigantes de tecnologia.
A decisão de centralizar essa responsabilidade no Cade, segundo o advogado Bruno Bastos Becker, mestre pela USP e ouvido pela CNN, reflete o resultado de uma consulta pública do Ministério da Fazenda. A maioria dos respondentes indicou o Cade como o órgão mais preparado para a tarefa, descartando a criação de uma nova agência ou a transferência da competência para a Anatel. O impacto esperado é um modelo que busca equilibrar inovação e controle, sem engessar o mercado digital.
O dilema global: intervir antes ou punir depois?
O debate sobre como supervisionar as plataformas digitais é global e, segundo Becker, divide o mundo em dois polos principais: a regulação ex-ante (preventiva) e a ex-post (punitiva). A escolha do Brasil por um caminho híbrido tenta extrair o melhor dos dois mundos, mas o desafio é complexo e envolve o ritmo acelerado da inovação tecnológica. A discussão central é onde o poder regulatório deve agir: antes que o problema ocorra ou apenas após a constatação de um abuso.
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Em entrevista à CNN, o especialista usou uma analogia clara para diferenciar os modelos. “Imagine uma plataforma digital como um shopping virtual. A regulação ex-ante funciona como regras definidas antes das lojas abrirem as portas: já está estabelecido que não pode ter corredor bloqueado, que cada lojista pode escolher o meio de pagamento e que o dono do shopping não pode esconder os concorrentes para promover só a própria loja”, comparou Becker.
“Já a regulação ex-post acontece depois, quando surge uma denúncia de que o dono do shopping dificultou a entrada de uma loja ou favoreceu a sua própria , aí a autoridade investiga e, se confirmar o abuso, aplica sanções”, acrescentou o advogado. Este modelo ex-post é o que prevalece nos Estados Unidos, onde se concede maior liberdade inicial às plataformas, focando na investigação e sanção após o fato consumado.
Por que o Cade foi escolhido como “xerife”?
A escolha do Cade não foi aleatória. Conforme relatado pela CNN, a consulta pública do Ministério da Fazenda foi decisiva, pois o órgão já possui um acúmulo de conhecimento técnico sobre o comportamento das big techs. Temas cruciais como lojas de aplicativos, sistemas de pagamentos virtuais, contratos de exclusividade e self-preferencing (quando a plataforma favorece seus próprios produtos) já são objeto de investigações e análises de mercado na autarquia.
O projeto de lei, anunciado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, solidifica essa escolha ao propor uma nova superintendência dedicada exclusivamente às plataformas digitais dentro do Cade. Para Becker, “essa solução me parece acertada”. O especialista pondera, no entanto, que para o modelo funcionar, será necessário um “reforço do quadro técnico e cooperação com ANPD (Autoridade Nacional de Proteção de Dados), Banco Central e Anatel”, aproveitando a base existente e evitando os custos de criar uma autoridade do zero.
A “via intermediária” do Brasil vs. a rigidez da Europa
A Europa adotou o caminho oposto dos EUA com o Digital Markets Act (DMA), uma regulação ex-ante extremamente robusta. O DMA impõe obrigações preventivas severas aos chamados “gatekeepers” (as maiores big techs). Segundo a análise de Becker à CNN, o DMA europeu “recebe críticas por rigidez, custos de compliance e maior litigiosidade“, o que levanta a questão se vale a pena adotar um controle tão estrito que pode frear a agilidade do mercado.
A lei europeia, por exemplo, força a abertura dos ecossistemas para lojas de aplicativos alternativas (sideloading), exige interoperabilidade, proíbe o uso de dados de lojistas para competir contra eles e veda a autopreferência em rankings. “É um pacote robusto que, se mal calibrado, pode reduzir agilidade”, argumenta o especialista. O Brasil, por outro lado, estaria se alinhando a países como Alemanha, Reino Unido e Japão, que também buscam um meio-termo.
O modelo brasileiro, portanto, propõe medidas intermediárias e menos rígidas que o DMA. A ideia é preservar mecanismos preventivos elementares, mas combiná-los com a fiscalização ex-post que o Cade já executa. Na visão do especialista ouvido pela CNN, a medida é acertada “porque não engessa demais as plataformas, mas reconhece a necessidade de maior acompanhamento de suas atividades”.
A decisão do Brasil de usar o Cade para regular as big techs, em vez de copiar o modelo rígido da Europa (DMA) ou o modelo mais livre dos EUA, é um dos debates mais importantes para o futuro da economia digital no país.
Besteira falar que a Europa é ex-ante. As regras na Europa só foram criadas DEPOIS que identificaram os abusos! Isso foi reativo! Como não temos leis específicas, ou normas com punição, isso significa que as big techs estão ganhando tempo por aqui e vai acabar na justiça protelando. Enquanto isso, o estrago já foi feito. Ninguém falou dos riscos aos consumidores.
No Nepal deu super certo
Não tenho conhecimento pra opinar mas, a ideia de um controle moderado, sem muita rigidez ou “porteira aberta” pra castigar abusos, me agrada!