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Brasil é um dos países que MAIS GASTAM com servidores! 65% são ‘estabilizados’, enquanto na Suécia apenas 1% tem este benefício

Escrito por Alisson Ficher
Publicado em 11/11/2024 às 09:22

Brasil lidera o ranking de gastos com servidores e concede estabilidade ampla, superando até países desenvolvidos. Com críticas e resistências políticas, especialistas debatem a necessidade urgente de reformas que tornem o sistema mais eficiente.

Com os maiores gastos do mundo em funcionalismo público e um sistema que oferece estabilidade ampla para cargos variados, o Brasil ocupa uma posição única e intrigante no cenário global.

Enquanto a maior parte dos países desenvolvidos segue um modelo mais flexível, onde a estabilidade no emprego é um privilégio restrito a algumas carreiras específicas, como juízes e policiais, o Brasil aplica essa proteção a uma variedade de cargos, desde professores e enfermeiros até funções administrativas.

Este sistema gera debates acalorados e levanta a questão: será que este modelo ainda se sustenta?

O peso da estabilidade no Brasil

Cerca de 65% dos servidores públicos brasileiros possuem estabilidade, um percentual que contrasta fortemente com o de países como Suécia, Alemanha e Reino Unido, onde a estabilidade é concedida apenas a uma pequena parcela de funcionários com “poder de Estado”, ou seja, aqueles em cargos essenciais para a estrutura de governança.

De acordo com um levantamento da Folha de S. Paulo, aproximadamente 12,1 milhões de brasileiros ocupam cargos públicos, sendo a maioria estatutária, regida pelo Estatuto do Servidor Público Federal (Lei 8.112/90), com forte proteção contra demissões e com vantagens específicas, como licenças remuneradas e promoção automática.

Conforme a pesquisa do Ministério do Trabalho e Emprego, enquanto países como a França possuem um modelo semelhante ao brasileiro, com estabilidade mais ampla que em outros locais, ainda assim o número de servidores com esse benefício é menor e com vantagens limitadas.

Em muitas dessas nações, quando o orçamento precisa de ajustes ou há mudanças nas funções oferecidas pelo governo, demitir servidores se torna uma opção — uma possibilidade quase inexistente no Brasil.

O “ponto fora da curva” dos benefícios

Para Humberto Falcão, especialista em gestão pública da Fundação Dom Cabral, o modelo brasileiro é um “ponto fora da curva” quando se trata de estabilidade no setor público.

Ele argumenta que a proteção poderia ser restrita a algumas funções essenciais, mas não a todas. Professores universitários, por exemplo, são frequentemente citados como cargos que poderiam operar sob um regime mais próximo ao do setor privado, sem estabilidade absoluta.

Segundo Falcão, essa discussão esbarra no fator político e nas resistências de setores que buscam manter esses privilégios intactos.

Além da estabilidade, os servidores públicos brasileiros contam com regimes próprios de previdência, distintos do INSS, que asseguram condições mais vantajosas.

Isso inclui benefícios como licenças prolongadas e progressões automáticas de carreira, mesmo sem avaliação de desempenho efetiva, o que destaca uma ausência de controle de qualidade em algumas funções.

Impasses na reforma administrativa

A tentativa de ajustar esse sistema não é nova. Em 1998, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, o então ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira conduziu uma reforma que visava limitar a estabilidade a carreiras com “poder de Estado”.

Contudo, segundo Bresser-Pereira, as propostas foram barradas pelo “corporativismo” de categorias que defendiam a manutenção das vantagens para o setor público em geral.

Esse cenário persiste até hoje, com projetos como o de regulamentação da avaliação de desempenho, engavetados no Congresso há mais de duas décadas.

Conforme levantamento da Folha de S. Paulo, há ainda um entrave considerável para demitir servidores por baixo desempenho ou infrações graves: o índice de desligamentos é extremamente baixo.

Em 2015, por exemplo, apenas 0,1% dos servidores foi demitido por motivos disciplinares ou por não cumprir com suas funções de forma adequada, conforme detalhado pelo estudo “A Reforma do RH do Governo Federal”, conduzido por Ana Carla Abrão, Arminio Fraga e Carlos Ari Sundfeld.

Estrutura comparativa dos gastos

O gasto com o funcionalismo público no Brasil equivale a 8,9% do Produto Interno Bruto (PIB), uma cifra considerável em comparação com outros países.

Dados do Fundo Monetário Internacional (FMI) mostram que, entre nove países analisados, apenas África do Sul (12,6%) e Suécia (10,4%) têm proporções maiores.

Em contraste, países da América Latina, como Chile (6,8%), Colômbia (5,6%) e México (3,8%), gastam menos, adotando estruturas mais flexíveis de contratação e menor número de servidores estáveis.

Embora o Brasil tenha um número inferior de servidores públicos em relação ao total de pessoas ocupadas e à sua população quando comparado a outros países, os gastos elevados refletem o peso das garantias estendidas ao funcionalismo.

Segundo Daniel Duque, do Centro de Liderança Pública, a falta de flexibilidade no setor público brasileiro prejudica a possibilidade de redistribuir funcionários conforme as demandas de cada área.

“Com o envelhecimento da população, precisaremos de mais médicos e enfermeiros e de menos professores”, pontua Duque, alertando para a rigidez na administração de pessoal.

Os impactos da estabilidade no serviço público

Para muitos especialistas, o regime de estabilidade no Brasil limita a eficiência e a inovação dentro do serviço público.

Bruno Carazza, autor de “O País dos Privilégios”, argumenta que o Brasil poderia avançar com uma reforma administrativa que tornasse as carreiras menos burocráticas e mais alinhadas com as reais necessidades da população.

“É fundamental avaliar o impacto da tecnologia, mapear as carreiras e promover ajustes para evitar novas contratações desnecessárias”, afirma.

Conforme o Banco Mundial, embora os salários do serviço público brasileiro sejam altos quando comparados aos do setor privado nacional, eles são competitivos globalmente apenas em determinadas áreas.

Os maiores rendimentos estão concentrados no Judiciário e no Legislativo federais, enquanto os menores salários estão nos cargos municipais, que atendem diretamente à população, como professores e assistentes sociais.

Nos municípios, a maioria dos servidores recebe menos de R$ 5.000 ao mês, enquanto no governo federal, os rendimentos podem ultrapassar R$ 15 mil.

A necessidade de ajustes e as resistências internas

Algumas mudanças já foram iniciadas. Nos últimos anos, estados e municípios têm buscado reduzir o número de cargos com estabilidade, aumentando as contratações temporárias e comissionadas, o que diminuiu os gastos com o funcionalismo.

O Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos também anunciou planos para revisar as 250 tabelas de remuneração e os mais de 300 agrupamentos de carreiras, em busca de uma estrutura mais racional e ajustada às necessidades.

No entanto, a questão da estabilidade permanece complexa. Gabriela Lotta, pesquisadora da Fundação Getúlio Vargas, defende que, enquanto algumas carreiras deveriam manter a estabilidade como proteção contra pressões políticas, outras poderiam adotar regimes mais flexíveis.

Ela cita exemplos de auditores fiscais e agentes ambientais que, sob forte pressão governamental, garantiram que o cumprimento da lei prevalecesse em casos emblemáticos, como as restrições ambientais durante o governo Bolsonaro.

A discussão sobre a estabilidade plena no Brasil ainda está em um ponto inicial, especialmente quando comparada a outras nações onde reformas profundas foram implementadas para aumentar a eficiência e a flexibilidade do setor público.

Contudo, há questionamentos sobre a viabilidade de uma mudança abrangente em um contexto marcado por resistências políticas e corporativistas.

Reforma administrativa, um caminho possível?

O Brasil está em um impasse sobre o futuro da estabilidade dos servidores públicos, e as perspectivas de reforma enfrentam resistência significativa.

Com um setor público robusto e uma estrutura de estabilidade que se destaca globalmente, o país caminha em direção a um debate essencial para ajustar as carreiras às demandas atuais da população.

Será que o Brasil conseguirá reestruturar o serviço público de forma a equilibrar a segurança no trabalho com a eficiência e flexibilidade administrativa? Deixe seu comentário!

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Alisson Ficher

Jornalista formado desde 2017 e atuante na área desde 2015, com seis anos de experiência em revista impressa e mais de 12 mil publicações online. Especialista em política, empregos, economia, cursos, entre outros temas. Se você tiver alguma dúvida, quiser reportar um erro ou sugerir uma pauta sobre os temas tratados no site, entre em contato pelo e-mail: alisson.hficher@outlook.com. Não aceitamos currículos!

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