Brasil e China firmam acordos bilionários para explorar lítio e terras raras na América do Sul, mirando liderança na transição energética e desafiando os EUA.
Enquanto o mundo disputa o controle dos minerais que vão sustentar a próxima revolução energética, o Brasil acaba de dar um passo que pode redesenhar o tabuleiro geopolítico das baterias, veículos elétricos e tecnologias limpas. Em acordos bilionários firmados com a China, o país abre as portas para investimentos massivos em lítio, terras raras e outros minerais estratégicos, criando uma parceria que promete acelerar a transição energética e, ao mesmo tempo, desafiar o domínio histórico dos Estados Unidos sobre cadeias de suprimento críticas.
Esses entendimentos, que envolvem desde projetos de mineração e beneficiamento até desenvolvimento industrial, colocam o Brasil em posição de protagonista na geopolítica dos recursos verdes. Mais que contratos comerciais, eles representam a convergência de dois gigantes econômicos que compartilham interesses em reduzir a dependência de fornecedores tradicionais e criar novos polos de produção fora da órbita ocidental.
Um mercado bilionário em disputa dos minerais críticos
O lítio, apelidado de “ouro branco” da nova economia, é essencial para a fabricação de baterias de íons de lítio utilizadas em veículos elétricos, smartphones e sistemas de armazenamento de energia.
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Já as terras raras — um grupo de 17 elementos químicos como neodímio e praseodímio — são insumos indispensáveis para motores de alto desempenho, turbinas eólicas, painéis solares e componentes militares.
Segundo projeções da Agência Internacional de Energia (IEA), a demanda por lítio deve crescer mais de 400% até 2035, enquanto a de terras raras pode dobrar no mesmo período. O controle sobre essas cadeias não é apenas uma questão econômica, mas também estratégica e militar.
Atualmente, a China domina o processamento global desses minerais, respondendo por cerca de 60% a 70% do refino de lítio e mais de 80% do refino de terras raras. O Brasil, com suas reservas ainda pouco exploradas e custo competitivo de produção, surge como um parceiro natural para Pequim diversificar fornecedores e ampliar sua base de suprimento.
Os acordos e investimentos
Entre os anúncios mais relevantes está a aquisição, pela chinesa BYD, de direitos minerários no chamado “Vale do Lítio”, em Minas Gerais, uma das regiões mais promissoras do mundo para a exploração desse metal. O investimento não se limita à extração: o plano inclui a instalação de plantas de processamento e possivelmente fábricas de baterias no território brasileiro.
Outras empresas chinesas já demonstraram interesse em joint ventures para exploração de terras raras no Brasil e na Bolívia, aproveitando a logística integrada e os acordos comerciais regionais. Essa integração poderia transformar o Brasil em um hub latino-americano para fornecimento desses minerais à indústria global.
O modelo acordado prevê que parte significativa do valor agregado permaneça no país, com transferência de tecnologia e capacitação local. Isso significa criar uma cadeia produtiva doméstica, reduzindo a dependência de exportações primárias e agregando valor à economia.
Impacto geopolítico da parceria entre China e Brasil
Para os Estados Unidos e a União Europeia, esses acordos soam como um alerta. O Ocidente busca reduzir a dependência da China para insumos críticos, mas vê Pequim expandir sua influência justamente em uma das regiões mais estratégicas do planeta: a América do Sul.
O Brasil, por sua vez, busca equilibrar suas parcerias. O governo sinaliza que está aberto a investimentos de múltiplas origens, mas, na prática, os aportes chineses chegam com mais rapidez e maior volume de capital. Esse movimento reforça o papel do país no BRICS como fornecedor estratégico de commodities essenciais para a economia verde.
Analistas apontam que o avanço dessa parceria pode influenciar negociações comerciais, tratados ambientais e até alinhamentos diplomáticos, especialmente em fóruns internacionais onde se discute transição energética e mudanças climáticas.
Desafios e críticas
Apesar do otimismo, o projeto não está livre de polêmicas. Ambientalistas alertam para os riscos da mineração em larga escala, especialmente em áreas sensíveis como o Cerrado e a Amazônia Legal. O processamento de minerais como lítio e terras raras envolve substâncias químicas que, se mal geridas, podem causar contaminação de solo e água.
Há também o desafio de garantir que os benefícios sejam distribuídos internamente, evitando que a exploração se limite à exportação de matéria-prima. Para que o Brasil colha frutos de longo prazo, será preciso investir em tecnologia, mão de obra qualificada e políticas industriais que incentivem a manufatura local de componentes e equipamentos.
Outro ponto de atenção é a reação dos EUA, que podem intensificar a busca por acordos bilaterais com países vizinhos e adotar medidas comerciais para proteger seus interesses na região.
Um novo capítulo na transição energética
Se bem-sucedida, a parceria Brasil–China no setor de minerais críticos pode criar um novo eixo de poder no mercado global de energia limpa. Mais do que fornecer insumos, o Brasil terá a oportunidade de se inserir de forma competitiva em uma das cadeias de valor mais dinâmicas e estratégicas das próximas décadas.
Essa é uma disputa que vai muito além de contratos de mineração. Trata-se de definir quem controlará as chaves da economia verde — e, ao que tudo indica, o Brasil decidiu que quer ser um dos donos dessa porta.