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O Brasil comemora a abertura de 17 novos shoppings em 2025 enquanto 26 milhões de consumidores desaparecem, dívidas familiares explodem e o varejo físico respira por aparelhos em meio à crise silenciosa do consumo

Escrito por Fabio Lucas Carvalho
Publicado em 31/10/2025 às 19:06
Brasil abre mais shoppings em 2025, mas perde milhões de visitantes e enfrenta crise silenciosa com consumo digital e endividamento recorde
Brasil abre mais shoppings em 2025, mas perde milhões de visitantes e enfrenta crise silenciosa com consumo digital e endividamento recorde
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Mesmo com 17 novos empreendimentos previstos e recorde de 640 centros comerciais, o Brasil vive o colapso silencioso do varejo físico, impulsionado por endividamento, juros altos e consumo digital em expansão

Durante décadas, o corte de fitas vermelhas, os sorrisos de lojistas e as fotos de prefeitos em inaugurações simbolizaram prosperidade. Mas essa cena tradicional do varejo brasileiro vem escondendo uma realidade preocupante: o país celebra aberturas enquanto o setor vive seu próprio velório.

O Brasil soma hoje mais de 640 shoppings em 249 municípios — o maior número da história —, mas por trás da aparência de crescimento há uma corrida de sobrevivência.

Em 2024, nove novos centros comerciais foram inaugurados, e 2025 promete mais 17, segundo o censo da Abrasce. A expansão, porém, é ilusória.

Desde 2019, 26 milhões de visitantes desapareceram dos corredores, reduzindo o fluxo mensal de 502 milhões para 476 milhões. O shopping brasileiro, que já foi símbolo de lazer e consumo coletivo, tenta esconder o encolhimento sob o concreto de novas obras.

O retrato de um setor em declínio

Os números mostram um mercado que finge vitalidade. Com 18 milhões de metros quadrados de área bruta locável e ocupação média de 95%, o setor ainda ostenta bons indicadores aparentes.

A Abrasce prevê crescimento de 1,6% no faturamento em 2025, o que, na prática, não cobre nem a inflação estimada de 3,5% pelo Banco Central. Traduzindo: o volume de vendas cresce apenas no papel, enquanto o poder de compra do consumidor cai.

O Índice de Confiança do Consumidor da FGV fechou setembro de 2025 em 87,5 pontos — um dos menores níveis desde a pandemia.

O subíndice de situação atual caiu para 82 pontos, refletindo a piora nas finanças familiares. De acordo com o IBGE, a renda média real dos trabalhadores cresceu apenas 0,4% em 2024, enquanto o custo de vida avançou quase o dobro.

A Confederação Nacional do Comércio revelou que seis em cada dez famílias encerraram o ano com dívidas acima de 30% da renda mensal.

Os juros no cartão de crédito ultrapassaram 400% ao ano, sufocando o consumo fora das classes mais ricas. E é justamente nelas que o shopping ainda respira: as vendas das classes A e B cresceram 9,9% e 9,4% respectivamente, mostrando um setor sustentado por poucos — enquanto a maioria observa das vitrines.

O disfarce do brilho

Para disfarçar a crise, os shoppings investem em aparência. Cerca de 31% já possuem boulevards gastronômicos e 26% criaram programas de fidelidade. Mas o problema é estrutural.

Os centros comerciais dependem das chamadas lojas âncora — como C&A, Renner e Centauro — que atraem o fluxo de consumidores. Essas lojas pagam aluguéis mais baixos, servindo como isca para as pequenas, as chamadas satélites, que garantem o lucro real. Quando uma âncora fecha, o corredor esvazia, o fluxo some e o shopping implode.

Nos Estados Unidos, esse mesmo modelo colapsou entre 2017 e 2020, com o fechamento de mais de 12 mil lojas de departamento, como Gap e Forever 21. Segundo o Credit Suisse, um quarto dos shoppings americanos estava condenado antes de 2022.

O Brasil, agora, repete o roteiro. Entre as grandes redes de moda nacionais, o lucro médio caiu 9% em 2024, mas novos empreendimentos continuam sendo erguidos.

A mudança do desejo

A revolução digital transformou o comportamento do consumidor. Se antes o sábado era reservado para o “rolê” no shopping, hoje ele é apenas o plano C. O comércio eletrônico sequestrou o desejo de compra. A Amazon, por exemplo, já responde por 37% do varejo digital americano, segundo dados da Morgan Stanley. No Brasil, o e-commerce triplicou entre 2020 e 2024 — saltando de R$ 87 bilhões para R$ 262 bilhões, de acordo com a Nielsen.

Em 2025, 73% dos consumidores já preferem comprar online quando o frete é gratuito ou rápido, segundo a PwC. O shopping perdeu a disputa mais importante da era moderna: a do tempo das pessoas. As plataformas digitais não apenas vendem — elas adivinham o que o cliente quer, entregam com conveniência e substituem o passeio físico por um clique.

O fantasma dos “dead malls”

O fenômeno dos “dead malls” — shoppings com menos de 40% de ocupação — se espalha pelo mundo. Nos Estados Unidos, mais de 300 centros comerciais foram abandonados entre 2017 e 2024, e hoje um em cada cinco está parcial ou totalmente ocioso. Corredores vazios, letreiros piscando e escadas rolantes paradas se tornaram o retrato da obsolescência do consumo coletivo.

No Brasil, o cenário ainda não é terminal, mas a sombra já aparece. Em estados como São Paulo, Rio Grande do Sul e Ceará, há empreendimentos com menos da metade das lojas ativas, segundo o censo da Abrasce. Os sintomas são claros: fluxo reduzido, inadimplência crescente e vitrines cobertas de papel pardo. O shopping, que já foi o “terceiro lugar” entre casa e trabalho, tornou-se um espaço fantasma de concreto e vidro.

O jurista e pesquisador Ronaldo Lemos sintetiza o diagnóstico: os shoppings perderam a disputa mais cara do século XX — a disputa pelo tempo. “Eles falharam em competir com o e-commerce e agora se tornam ruínas elegantes da era pré-digital, quando o consumo era coletivo e o tempo, mais lento”, afirma.

A metamorfose do metro quadrado

A reconfiguração do setor já está em curso. Para sobreviver, os shoppings se transformam em organismos de aluguel de tempo. Clínicas, academias e coworkings ocupam o espaço que antes pertencia às vitrines. Segundo a consultoria Cushman & Wakefield, o número de clínicas médicas em shoppings cresceu 42% entre 2020 e 2024. Já o setor de serviços e conveniência responde hoje por 10,4% das lojas — ultrapassando o varejo de moda em diversas praças regionais.

Redes como Smart Fit, Dr. Consulta e WeWork se tornaram novas “âncoras” dessa era de transição. Cada loja vazia vira uma nova utilidade: escola, consultório, coworking ou restaurante. O shopping deixa de vender produtos para vender tempo, conveniência e necessidade.

A financeirização do colapso

Enquanto o setor se reinventa, o mercado financeiro transforma a crise em lucro. Em 2025, os fundos imobiliários de shoppings valorizaram 18,4%, superando o índice médio de fundos do setor, segundo dados da B3. Gestoras como XP Malls, Riza e Pátria Investimentos enxergam oportunidade onde o varejo vê desespero.

A XP Malls vendeu nove empreendimentos por R$ 1,6 bilhão, reduzindo dívidas e transferindo riscos. A Riza ampliou portfólio, lucrando com a renegociação de aluguéis, e a Pátria investiu R$ 2,5 bilhões em ativos desvalorizados. É o novo jogo do varejo: transformar falência em oportunidade.

A vacância média dos shoppings caiu para 4,8% em junho de 2025, mas não porque o público voltou — e sim porque o espaço ficou caro demais para os pequenos lojistas. O shopping de elite sobrevive; o popular, definha. A JHSF, dona do Cidade Jardim, viu alta de 17% no segundo trimestre, impulsionada por um salto de quase 27% nas vendas do próprio empreendimento. O luxo se tornou o último refúgio da confiança: Rolex, Dior e Prada substituíram C&A e Riachuelo como novas âncoras do consumo.

O novo papel do shopping

Hoje, seis em cada dez brasileiros vão ao shopping não para comprar, mas para jantar, cortar o cabelo ou resolver burocracias. O templo do consumo virou praça de conveniência. Estacionamentos viraram hubs gastronômicos; no Shopping Tijuca, no Rio, o espaço da antiga Forever 21 foi ocupado por restaurantes e uma sala VIP, aumentando o aluguel em 80%.

O endereço é o mesmo, mas o propósito mudou. Os shoppings que entenderam isso estão trocando o luxo pela funcionalidade, o desejo pela utilidade. Os que insistirem em viver apenas do aluguel, ignorando o novo tempo, se tornarão fósseis da era do consumo coletivo.

Da ruína ao recomeço

Toda crise carrega a semente da reinvenção. Os shoppings brasileiros mudam de pele, ainda que à custa de dor e reestruturação. A sobrevivência depende de enxergar que o verdadeiro ativo nunca foi o espaço, e sim o fluxo — de pessoas, ideias e valor. O consumo muda, o cenário muda, o cliente muda. Mas a regra continua a mesma: quem se antecipa à mudança, lidera. Quem ignora, desaparece.

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Fabio Lucas Carvalho

Jornalista especializado em uma ampla variedade de temas, como carros, tecnologia, política, indústria naval, geopolítica, energia renovável e economia. Atuo desde 2015 com publicações de destaque em grandes portais de notícias. Minha formação em Gestão em Tecnologia da Informação pela Faculdade de Petrolina (Facape) agrega uma perspectiva técnica única às minhas análises e reportagens. Com mais de 10 mil artigos publicados em veículos de renome, busco sempre trazer informações detalhadas e percepções relevantes para o leitor.

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