Mesmo com níveis inéditos de geração e liderança no uso de fontes renováveis, a energia eólica no Brasil atravessa um momento ambíguo: enquanto consolida sua relevância na matriz elétrica, sofre desaceleração na expansão de novas plantas e enfrenta entraves regulatórios.
A energia eólica no Brasil alcançou marcas históricas em 2024, reafirmando seu papel central no processo de transição energética. Em novembro, o país bateu dois recordes de geração: no dia 3, registrou a maior média horária da história, com 23.699 megawatts médios (MWmed); no dia 4, veio o recorde de geração diária, com 18.976 MWmed. Esses resultados destacam a força do setor, que já ocupa a segunda posição entre as fontes da matriz elétrica nacional — atrás apenas da hidrelétrica.
Apesar disso, o setor vive uma queda preocupante no número de novas instalações. Em 2024, houve uma retração de 31,25% na construção de usinas eólicas em comparação com o ano anterior, totalizando apenas 3,3 gigawatts (GW) adicionados.
Avanços na geração de energia eólica contrastam com queda nos investimentos
O contraste entre o desempenho na geração e a desaceleração dos investimentos evidencia desafios mais profundos.
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A advogada Bianca Bez, especialista em energia do escritório BBL Advogados, aponta dois fatores principais para esse recuo: a sobreoferta no mercado regulado de energia e a crise enfrentada pelos fabricantes de aerogeradores — os equipamentos responsáveis por transformar vento em eletricidade.
“Embora o potencial técnico da energia eólica – especialmente offshore – coloque o Brasil entre os líderes globais em capacidade de expansão renovável, as perspectivas futuras não podem ser analisadas apenas sob a ótica das promessas tecnológicas. É preciso considerar os entraves institucionais e econômicos que hoje impedem a plena realização desse potencial”, explica Bez.
Ela alerta ainda que políticas públicas mal desenhadas podem comprometer os avanços. “Mesmo bem-intencionadas, essas medidas podem levar a alocações ineficientes de recursos, caso não levem em conta os riscos reais enfrentados pelos agentes do setor”, afirma.
Como funciona a energia eólica?
A energia eólica é gerada a partir do movimento do vento, que gira as pás dos aerogeradores conectados a turbinas.
Esse movimento mecânico é convertido em energia elétrica, que é enviada à rede de transmissão. Trata-se de um processo limpo, eficiente e cada vez mais competitivo, especialmente em regiões com alto índice de ventos constantes, como o Nordeste.
Armazenamento de energia entra na pauta, mas leilão é suspenso
Com o avanço de fontes intermitentes como a eólica, cresce a necessidade de soluções para garantir estabilidade e segurança ao fornecimento de energia.
O uso de sistemas de armazenamento por baterias tem sido adotado globalmente para oferecer suporte à rede elétrica em momentos de baixa geração.
No entanto, no Brasil, uma medida que poderia incentivar essa tecnologia foi adiada.
O Ministério de Minas e Energia cancelou o leilão de reserva de capacidade, que estava previsto para ocorrer no final de junho de 2024. A decisão ocorreu em meio a uma disputa judicial entre empresas do setor.
Segundo a Pasta, uma consulta pública será aberta em breve para discutir as novas diretrizes do leilão, com foco na contratação de energia ao menor custo possível para o consumidor.
O governo espera definir prazos para que o certame ainda ocorra este ano.
O futuro da energia eólica no Brasil exige mais que vento favorável
O potencial da energia eólica no Brasil, inclusive em projetos offshore (em alto-mar), é imenso.
No entanto, especialistas apontam que a expansão do setor depende de um ambiente mais estável, com segurança jurídica, previsibilidade regulatória e planejamento de longo prazo.
Mesmo com os recordes de geração e o destaque internacional, a real consolidação da energia eólica no país passa por superar gargalos estruturais, evitar erros na formulação de políticas públicas e criar condições sustentáveis para novos investimentos.
Fonte: Exame