Tarifas mais baixas e mercado receptivo atraem marcas chinesas, que buscam no Brasil alternativa ao excesso de produção e restrições globais
Nos últimos meses, o Brasil recebeu cinco novas marcas automotivas chinesas: GAC, Geely, Zeekr e Omoda & Jaecoo. Além delas, Lynk & Co, Jetour, Avatr, Leapmotor e MG Motors já anunciaram que devem iniciar operações no país em breve.
Esse ritmo intenso pode dar a impressão de que o mercado brasileiro está no centro das atenções mundiais.
No entanto, o mais importante é entender que a motivação não está no Brasil, mas sim na própria China e nas dificuldades que suas fabricantes enfrentam no cenário global.
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Excesso de produção na China
Em 2024, a China produziu 31,3 milhões de veículos, mas vendeu internamente apenas 22,6 milhões, segundo a CPCA. Isso gerou um excedente de quase 9 milhões de unidades que precisaram ser exportadas.
O problema é que os principais mercados estão cada vez mais restritivos. Os Estados Unidos aplicam tarifa de 100% sobre veículos elétricos chineses.
Já a União Europeia, além do imposto padrão de 10%, cobra sobretaxas específicas: SAIC, 35,3%; Geely, 18,8%; BYD, 17%; empresas cooperantes, 20,7%; e demais, até 35,3%. Em alguns casos, o total supera 45%.
Com barreiras tão altas, o Brasil surge como alternativa estratégica. Aqui, as tarifas variam entre 25% e 30% para carros eletrificados.
Mesmo com a retomada gradual do imposto de importação, que chegará a 35% em 2026, seguimos mais competitivos do que EUA e Europa.
Ambiente favorável no Brasil
As vantagens vão além das tarifas. O país oferece ambiente regulatório menos politizado, demanda crescente por veículos eletrificados — especialmente híbridos — e logística facilitada pelo acesso ao Mercosul.
A advogada Andrea Weiss, especialista em direito aduaneiro, destaca que, mesmo com tarifas em alta, o Brasil continua estratégico. “Temos um ambiente mais receptivo aos investimentos chineses”, afirma.
Dados da Anfavea confirmam o avanço: no primeiro semestre de 2025, 134.582 veículos foram importados da China, o equivalente a 62,1% das importações brasileiras de automóveis.
Desafio para montadoras tradicionais
Enquanto as marcas chinesas ampliam sua presença, as fabricantes já instaladas no país enfrentam forte pressão competitiva.
O consultor automotivo Cássio Pagliarini observa que as chinesas atuam com margens “muito mais agressivas” e não seguem a lógica tradicional de rentabilidade.
“Elas estão aqui para dominar o mercado, e isso afeta diretamente quem já produz localmente”, afirma.
A preocupação é que, sem medidas de proteção ou incentivo à indústria nacional, as fábricas instaladas no Brasil percam espaço não apenas em vendas, mas também em decisões de investimento globais.
Risco de dependência externa
Andrea Weiss alerta que depender excessivamente de um único país ou fornecedor pode deixar o mercado vulnerável a crises geopolíticas e econômicas. Para ela, o Brasil precisa diversificar suas parcerias e fortalecer a produção interna.
O avanço das montadoras chinesas no Brasil, portanto, não é fruto de um entusiasmo repentino pelo mercado local, mas de uma conjuntura internacional marcada por excesso de produção e portas fechadas em outras regiões.
O consumidor, por enquanto, ganha com mais opções, tecnologia e preços competitivos. Mas o risco de desindustrialização e dependência externa está no horizonte, e a decisão sobre como o país vai reagir ainda está em aberto.
Com informações de UOL.