Decisão de 2025 garante proteção social e reforça princípios constitucionais, ao impedir que o Bolsa Família seja usado para restringir acesso ao Benefício de Prestação Continuada
A Justiça Federal em Registro, São Paulo, decidiu em 2025 que o Programa Bolsa Família não integra o cálculo da renda familiar para a concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS). O juiz federal Maycon Michelon Zanin proferiu a sentença e, portanto, determinou que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) conceda o benefício a uma criança com deficiência, mesmo após a negativa inicial.
Entenda a decisão judicial
O governo editou o Decreto nº 12.534/2025, e, com isso, revogou trecho do Decreto nº 6.214/2007. A mudança previa que os valores do Bolsa Família entrariam na renda per capita das famílias. Entretanto, o juiz afirmou que a medida extrapolou os limites do poder regulamentar previstos na Constituição Federal.
Além disso, conforme destacou Zanin, “decretos não podem criar restrições a direitos fundamentais que não estejam previstos em lei”. Ele citou a doutrina de Celso Antônio Bandeira de Mello e, assim, classificou a alteração como ilegal e sem respaldo legislativo. Por essa razão, o magistrado reforçou que a exclusão do Bolsa Família segue os princípios constitucionais de proteção social.
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Situação da família analisada
O INSS negou o BPC, alegando que a renda familiar ultrapassava o limite de 1/4 do salário mínimo por pessoa. Contudo, as provas apresentadas demonstraram vulnerabilidade concreta.
- Perícia médica judicial apontou que a criança, de sete anos, sofria de epilepsia focal sintomática, malformação no sistema nervoso central, TDAH e hematoquezia em investigação.
- Fotografias da residência revelaram moradia precária, sem conforto mínimo e sem patrimônio.
- Laudo socioeconômico de dezembro de 2023 mostrou que o pai recebia R$ 800,00 como ajudante de pedreiro, além do Bolsa Família de R$ 650,00.
Posteriormente, em 2024, o pai conseguiu emprego formal com salário médio de R$ 1.890,00. Ainda assim, a Justiça considerou que a vulnerabilidade já havia sido comprovada, e, portanto, o benefício deveria ser concedido.
Apoio em decisões do STF e do STJ
O magistrado baseou a decisão em precedentes de cortes superiores e, consequentemente, reforçou sua legitimidade.
- Em 2020, o Supremo Tribunal Federal julgou o Tema 312. O STF decidiu que benefícios assistenciais ou previdenciários de valor mínimo não entram no cálculo da renda per capita familiar. Além disso, o tribunal reconheceu omissão legislativa na Lei nº 10.741/2003 (Estatuto do Idoso).
- O Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Tema 640, definiu que benefícios de até um salário mínimo recebidos por idosos ou pessoas com deficiência são personalíssimos e não compõem a renda familiar.
Dessa forma, a decisão de 2025 acompanhou não apenas a Constituição, mas também a jurisprudência consolidada das mais altas cortes.
Retrocesso social e dignidade humana
O juiz ressaltou que o decreto representava um retrocesso social proibido pela Constituição.
“O BPC e o Bolsa Família possuem naturezas distintas e complementares. O BPC garante renda mínima a quem não pode trabalhar, enquanto o Bolsa Família busca reduzir a pobreza extrema. Usar um benefício voltado ao combate à miséria para negar outro essencial à subsistência gera um paradoxo que afronta a Constituição”, disse Zanin.
Além disso, ele destacou possíveis distorções graves. Se o Bolsa Família fosse incluído, famílias que recebem R$ 600,00 poderiam perder o BPC. Esse benefício garante um salário mínimo e, portanto, custeia tratamentos e medicamentos. Assim, a situação violaria a dignidade humana e o direito ao mínimo existencial.
Conclusão da sentença
O juiz afastou a aplicação do Decreto nº 12.534/2025 e, com isso, manteve a exclusão do Bolsa Família do cálculo da renda per capita.
A decisão reforçou princípios constitucionais como dignidade da pessoa humana, vedação ao retrocesso social e proteção integral às pessoas em situação de vulnerabilidade.
Dessa forma, o INSS deve conceder imediatamente o Benefício de Prestação Continuada à criança. A medida assegura amparo financeiro essencial para sua sobrevivência e, portanto, reafirma a força da proteção social prevista na Constituição.