Mudanças no Código Civil reacendem alerta: quem vive em união estável sem contrato pode enfrentar disputas judiciais e ter o direito à herança questionado.
A discussão sobre os direitos de quem vive em união estável sem contrato formal voltou ao centro do debate jurídico no Brasil. A proposta de reforma do Código Civil, atualmente em análise no Congresso Nacional, reacendeu o alerta entre advogados de família: a ausência de contrato pode expor milhões de casais a disputas patrimoniais e sucessórias em casos de separação ou morte.
Embora a Constituição reconheça a união estável como entidade familiar, as novas propostas discutem mudanças que podem exigir maior formalização da relação, especialmente quanto ao regime de bens e ao direito à herança.
O novo Código Civil e as possíveis mudanças nas uniões estáveis
Uma Comissão de Juristas instituída pelo Senado Federal em 2023 trabalha na atualização do Código Civil de 2002, com foco em temas como sucessões, regime de bens, responsabilidade civil e direito digital.
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No campo familiar, o grupo propõe rever regras de união estável, casamento e regimes patrimoniais. Entre as sugestões em estudo, está a possibilidade de exigir contrato formal de união estável para definir o regime de bens, substituindo a presunção automática da comunhão parcial, aplicada atualmente quando não há escritura.
Se aprovada, a mudança exigirá que casais que vivem juntos formalizem a união em cartório, definindo regras patrimoniais para garantir segurança jurídica em caso de partilha ou falecimento.
O que dizem as normas atuais
Pelas regras vigentes, quem vive em união estável sem contrato é regido pelo regime de comunhão parcial de bens, segundo o artigo 1.725 do Código Civil. Isso significa que todos os bens adquiridos após o início da convivência — comprovada judicialmente — pertencem aos dois, independentemente de quem pagou.
No entanto, bens adquiridos antes da união, heranças e doações permanecem de propriedade individual. É nesse ponto que surgem as maiores disputas judiciais: quando o casal não formaliza a união e não há documentação clara sobre a origem dos bens.
Tema 809 do STF e o direito à herança
Outro ponto sensível é o direito à herança. Até 2017, o artigo 1.790 do Código Civil previa regras distintas para companheiros e cônjuges, restringindo a participação do companheiro na herança.
Isso mudou com o julgamento do Tema 809 pelo Supremo Tribunal Federal, que declarou inconstitucional a diferenciação. O STF decidiu que companheiros e cônjuges devem ter o mesmo tratamento sucessório.
Porém, a Corte modulou os efeitos da decisão: o novo entendimento vale apenas para processos que ainda não tinham decisão definitiva na época do julgamento. Isso significa que milhares de companheiros ainda enfrentam incertezas em inventários antigos ou quando a união não está formalmente reconhecida.
Riscos da falta de formalização
A ausência de contrato ou escritura de união estável continua sendo um dos maiores pontos de vulnerabilidade jurídica. Em casos de morte, é comum que familiares do falecido contestem a existência da união, alegando ausência de registro formal.
Quando isso ocorre, o companheiro sobrevivente precisa comprovar a relação — o que pode levar anos e exigir provas como testemunhos, fotos, contas conjuntas ou declarações fiscais. Só depois disso é possível pleitear direitos sucessórios ou participar do inventário.
Essas situações são recorrentes em tribunais estaduais. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, por exemplo, já decidiu que a ausência de escritura não impede o reconhecimento da união, mas torna o processo mais demorado e litigioso (TJMG – Apelação Cível nº 1.0000.20.051466-7/001).
O que pode mudar com o novo Código Civil
Se a proposta da comissão for mantida no texto final, o Brasil poderá ter um novo marco regulatório para uniões estáveis. As principais mudanças em discussão incluem:
- Formalização obrigatória em cartório para definir o regime de bens;
- Maior transparência sobre patrimônio adquirido antes da união;
- Regras mais claras sobre herança e dependência econômica;
- Maior proteção em caso de dissolução litigiosa.
Especialistas alertam que, caso as alterações sejam aprovadas, quem não formalizar a união poderá ter dificuldade em comprovar direitos patrimoniais e sucessórios, principalmente diante de familiares e herdeiros legais.
União estável não é casamento — e isso faz diferença
Mesmo com o reconhecimento constitucional, a união estável não é automaticamente idêntica ao casamento. O casamento civil é ato público, registrado e com certidão oficial, o que dá mais segurança nas partilhas e inventários.
Já a união estável depende de prova da convivência pública, contínua e duradoura, o que abre margem para contestação judicial. Por isso, o contrato de união estável — lavrado em cartório — é hoje a forma mais segura de garantir direitos, definir o regime de bens e evitar conflitos futuros.
Como formalizar e proteger direitos
A escritura pública de união estável pode ser feita em qualquer cartório de notas. O documento deve conter:
- A data de início da convivência;
- O regime de bens escolhido (comunhão parcial, total, separação etc.);
- Cláusulas patrimoniais adicionais, se desejado;
- Identificação dos conviventes e das testemunhas.
O contrato tem validade imediata e serve como prova em qualquer disputa judicial, tanto para partilha de bens quanto para herança.
A reforma do Código Civil reacendeu o alerta entre casais que vivem em união estável sem registro. Mesmo que a lei atual reconheça a convivência, a falta de contrato pode gerar anos de disputa judicial e colocar em risco o acesso à herança ou ao patrimônio construído em conjunto
Enquanto o novo texto não é aprovado, a recomendação é clara: quem vive em união estável deve formalizar a relação o quanto antes. No amor, a confiança é fundamental — mas no direito, a segurança vem do documento.