Sem cláusulas de proteção, herança pode ser dividida com genro ou nora em caso de separação. Entenda o risco e como evitar perder o patrimônio familiar.
Pouca gente imagina que um simples detalhe jurídico pode colocar em risco o patrimônio construído por toda uma vida. O que deveria ser uma herança protegida para filhos ou netos pode, em certas situações, acabar sendo dividida com genros e noras em um processo de divórcio. E o motivo é simples: a ausência das chamadas cláusulas de proteção patrimonial nos testamentos e escrituras de doação.
Falta de cláusulas no testamento pode abrir brecha legal
O Código Civil brasileiro, em vigor desde 2002, é claro sobre a importância dessas cláusulas. O artigo 1.659, inciso I, estabelece que bens recebidos por herança não entram na partilha entre cônjuges, desde que tenham sido transferidos com cláusula de incomunicabilidade.
Ou seja: se o testador ou doador não incluir expressamente essa condição, os bens herdados podem sim ser comunicados ao cônjuge e, em caso de separação, divididos no divórcio.
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O artigo 1.848 do Código Civil reforça essa possibilidade ao permitir que o autor da herança imponha cláusulas de incomunicabilidade, inalienabilidade e impenhorabilidade, justamente para evitar que terceiros se tornem proprietários dos bens destinados aos herdeiros legítimos.
Em outras palavras, quem faz uma doação ou deixa um testamento sem prever essas cláusulas, corre o risco de ver parte da herança parar nas mãos do genro, da nora ou até de credores do herdeiro.
Casos reais confirmam a importância da cláusula
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) já confirmou a validade dessa interpretação.
No Recurso Especial nº 1.382.170/SP, julgado em 2015, o tribunal decidiu que bens herdados sem cláusula de incomunicabilidade poderiam integrar a partilha do casal, conforme o regime de bens escolhido.
Em outro caso, o STJ reafirmou que a ausência de restrições no testamento torna o bem comunicável em casamentos sob regime de comunhão parcial ou universal de bens.
Essas decisões servem de alerta: sem uma redação cuidadosa no testamento ou na doação, o patrimônio familiar pode acabar diluído em disputas judiciais e separações.
Regime de bens também influencia o resultado
Além das cláusulas, o regime de casamento escolhido pelos herdeiros tem papel decisivo.
- Na comunhão parcial de bens (a mais comum), tudo o que for adquirido após o casamento é dividido igualmente, mas bens herdados só ficam fora da partilha se tiverem cláusulas restritivas.
- Na comunhão universal, todos os bens — inclusive os herdados — são comunicáveis, salvo se houver cláusula expressa em sentido contrário.
- Já na separação total de bens, cada cônjuge mantém seu patrimônio, mas doações e heranças ainda podem gerar confusão se não estiverem bem especificadas no documento.
Em todos os cenários, a ausência de cláusulas de proteção deixa brechas para litígios e disputas judiciais entre familiares e ex-cônjuges.
As três cláusulas que blindam o patrimônio familiar
Advogados especialistas em direito sucessório destacam que existem três proteções principais que qualquer testamento ou doação pode conter:
- Incomunicabilidade: impede que o bem herdado seja dividido com o cônjuge ou companheiro.
- Inalienabilidade: proíbe o herdeiro de vender ou transferir o bem, preservando-o na família.
- Impenhorabilidade: evita que o bem seja tomado por dívidas do herdeiro.
Essas cláusulas funcionam como escudos jurídicos — especialmente úteis para famílias que desejam garantir que o patrimônio continue entre os descendentes diretos.
Um alerta para quem tem bens e filhos casados
De acordo com advogados do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), a falta dessas previsões é um dos erros mais comuns em testamentos e doações entre familiares.
O problema costuma aparecer anos depois, em processos de separação ou herança, quando o bem é reconhecido judicialmente como parte do patrimônio do casal e acaba dividido com o ex-cônjuge.
O recado dos especialistas é claro: quem tem filhos casados, em união estável ou em processo de casamento deve revisar imediatamente testamentos e escrituras, incluindo as cláusulas protetivas. Isso garante que o patrimônio permaneça na linha sucessória desejada e evita desgastes familiares no futuro.
Herança é proteção, não armadilha
A herança é, por definição, uma forma de preservar o legado familiar. Mas, sem amparo jurídico, ela pode se tornar o oposto: uma porta de entrada para disputas e perdas irreversíveis.
A decisão de incluir cláusulas não é burocrática é uma garantia de que o desejo do autor da herança será respeitado e de que o patrimônio não cairá nas mãos erradas.
Em um país onde a maioria dos casamentos ocorre sob comunhão parcial de bens, entender o impacto dessas cláusulas é fundamental. Afinal, uma simples omissão pode custar caro e transformar um presente em uma dor de cabeça judicial.