O Brasil é conhecido como o país da cana desde o século 16, mas uma virada silenciosa vem acontecendo: o etanol de milho já responde o mercado nacional e cresce em ritmo impressionante
Enquanto a produção de etanol de cana permanece praticamente no mesmo patamar há uma década, o milho avança em uma taxa média de 33% ao ano desde 2020. E a Petrobras está de olho nesse movimento.
A empresa que mais produz etanol no Brasil usa qual matéria-prima? A resposta correta não é a cana-de-açúcar, mas sim o milho. Em 2024, a Inpasa produziu 3,7 bilhões de litros de etanol, superando a Raízen, que ficou em 3,1 bilhões.
A Inpasa começou sua trajetória no Paraguai, em 2007, mas inaugurou sua primeira usina brasileira em 2019, em Sinop (MT). O resultado financeiro acompanha o avanço: em 2024, registrou receita líquida de R$ 13,6 bilhões, crescimento de 23% em relação ao ano anterior. Segundo a Moody’s, sua margem líquida gira em torno de 18%, o que sugere um lucro de R$ 2,4 bilhões.
-
Após anos de paralisação, Petrobras enfrenta pressão ao retomar fábricas de fertilizantes na Bahia e em Sergipe com Engeman
-
NetZero inaugura em fevereiro fábrica pioneira em Minas para produzir 4.000 toneladas anuais de biocarvão à base de cana-de-açúcar
-
Galinhas criadas soltas: o sistema australiano que combina pasto rotativo, controle de acasalamento e lucros de até US$ 800 mil por ano
-
Brasil é líder global em proteína animal e exporta bilhões em carne, mas precisa importar cerca de 45% do trigo consumido internamente para abastecer o mercado, segundo dados da Secex
Além disso, o dono, José Odvar Lopes, o “Seu Zé”, diversifica: adquiriu participação de 3% na Vibra, dona dos postos BR, investimento avaliado em R$ 800 milhões.
A empresa que começou no Paraguai hoje lidera a produção de etanol no Brasil.
FS: a força que disputa espaço com a cana
A primeira companhia 100% dedicada ao etanol de milho no Brasil foi a FS, criada em 2017 e controlada pela americana Summit. A empresa começou com uma usina em Lucas do Rio Verde (MT), produzindo 280 milhões de litros. Em 2020, já havia ultrapassado 1 bilhão, chegando a 2,4 bilhões em 2024.
No mesmo ano, o faturamento da FS saltou 32%, alcançando R$ 10,7 bilhões, com lucro líquido de R$ 937 milhões. Hoje, ela é a terceira maior produtora de etanol do país, atrás apenas da Inpasa e da Raízen.
Inpasa e FS concentram juntas 80% do etanol de milho no Brasil, dominando um mercado que não para de crescer.
Petrobras: de saída a possível volta
A Petrobras deixou o setor de etanol em 2018, mas agora pretende voltar. A presidente Magda Chambriard declarou que não faz sentido deixar de lado um combustível que concorre com a gasolina.
A estatal busca parcerias minoritárias, como joint ventures, e segundo a Bloomberg, negocia com Inpasa e FS.
O milho, que até pouco tempo parecia secundário, pode ser a chave para o retorno estratégico da Petrobras ao setor.
Por que o milho atrai?
O etanol de milho é até 40% mais barato de produzir que o de cana. Em 2024/2025, o custo médio foi de R$ 1,88 por litro, contra R$ 2,36 da cana.
Isso acontece porque a área plantada de milho cresceu 15% desde o fim da década passada, e a produção subiu 25%. Além disso, os preços internacionais caíram 35% nos últimos três anos.
Outro diferencial está nos subprodutos. O processo gera DDG, grãos secos ricos em proteína usados na alimentação animal, e óleo de milho, destinado ao biodiesel.
A simbiose com a soja e o milho-safrinha
O avanço do etanol de milho se conecta à soja. No Centro-Oeste, após a colheita da soja no verão, entra o milho-safrinha no outono. Esse ciclo garante aproveitamento de terras e abastecimento constante às usinas.
Hoje, já existem 24 usinas dedicadas ao milho, consumindo 15% da produção nacional. Um terço volta ao setor alimentício, em forma de DDG.
Cana segue relevante, mas perde espaço no crescimento
Mesmo com o avanço do milho, o etanol de cana continua vital. Em 2023, o governo elevou a mistura obrigatória na gasolina de 27% para 30%, com possibilidade de chegar a 35%. E 80% da produção de etanol ainda vem da cana.
Porém, a concorrência com o açúcar tem limitado a expansão do etanol canavieiro. Entre 2011 e 2019, a proporção nas usinas era de 44,4% açúcar e 55,6% etanol. Já entre 2020 e 2025, passou para 48,8% e 51,2%.