A Suécia recicla tanto que ficou sem lixo: menos de 1% dos resíduos vai para aterros e o país agora importa toneladas de lixo para gerar energia em usinas modernas.
Enquanto grande parte do mundo ainda luta para reduzir o volume de lixo enviado a aterros sanitários, a Suécia atingiu um patamar tão avançado em reciclagem e reaproveitamento de resíduos que enfrenta um “problema” inusitado: não tem lixo suficiente para manter suas usinas de energia funcionando. Sim, o país nórdico é tão eficiente em sua política ambiental que passou a importar lixo de outros países da Europa para alimentar suas instalações de incineração — transformando resíduos em calor, eletricidade e receita.
Um país sem lixo: como a Suécia virou referência global
Desde a década de 1990, a Suécia investe pesadamente em educação ambiental, logística reversa, reciclagem avançada e geração de energia a partir de resíduos sólidos urbanos. O resultado? Desde 2011, menos de 1% de todo o lixo gerado pela população vai parar em aterros sanitários — número impressionante mesmo entre países desenvolvidos.
Hoje, mais de 99% do lixo sueco é reciclado, compostado ou convertido em energia, colocando o país entre os líderes mundiais em sustentabilidade urbana.
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Esse modelo é baseado em três pilares:
- Separação eficiente na fonte — os suecos são educados desde cedo a separar corretamente papel, plástico, vidro, orgânicos e eletrônicos;
- Logística pública estruturada — o sistema de coleta é integrado, pontual e amplamente utilizado por toda a população;
- Aproveitamento energético dos resíduos — rejeitos que não podem ser reciclados são incinerados de forma controlada em usinas WtE (Waste-to-Energy), gerando vapor que aquece edifícios e produz eletricidade.
Lixo vira energia: as usinas que aquecem cidades inteiras
A Suécia opera mais de 30 usinas de energia movidas a resíduos urbanos, localizadas em diferentes regiões do país. Uma das mais conhecidas é a usina de Högdalen, em Estocolmo, que transforma cerca de 700 mil toneladas de lixo por ano em energia suficiente para aquecer mais de 100 mil residências.
Essas usinas de energia com resíduos funcionam por incineração controlada. Os resíduos não recicláveis são queimados em altas temperaturas, gerando vapor que movimenta turbinas para produzir eletricidade e calor, depois distribuído por redes de aquecimento urbano — um sistema comum nos países nórdicos.
A eficiência energética é alta, e o impacto ambiental é mitigado por sistemas modernos de filtragem de gases e controle de emissões. Além disso, as cinzas geradas pela queima do lixo são tratadas, e os metais presentes são extraídos e reutilizados. Apenas a fração tóxica das cinzas (cerca de 15% do total) é enviada de volta ao país de origem — quando o lixo é importado.
A Suécia importa lixo? Sim — e cobra por isso
O sucesso do modelo sueco criou um efeito curioso: o país passou a ter déficit de lixo para manter suas usinas funcionando em plena capacidade. Para evitar a ociosidade, a Suécia firmou acordos com outros países, como Noruega, Reino Unido, Irlanda e Itália, para importar resíduos que seriam destinados a aterros.
Funciona assim:
- A Suécia recebe o lixo já separado e não reciclável;
- Incinera os resíduos em suas usinas e aproveita a energia gerada;
- Cobra dos países exportadores pelo serviço;
- Envia de volta as cinzas tóxicas para descarte controlado.
Com isso, os países que exportam o lixo economizam espaço em aterros e reduzem emissões de metano, enquanto a Suécia lucra, gera energia limpa e mantém sua economia circular em pleno funcionamento.
Estima-se que o país importe anualmente mais de 1 milhão de toneladas de resíduos para alimentar seu sistema WtE.
O que faz a reciclagem na Suécia ser tão eficaz?
Alguns fatores ajudam a explicar o desempenho excepcional:
- Educação ambiental nas escolas desde os primeiros anos;
- Forte incentivo fiscal para empresas que utilizam materiais reciclados;
- Proibição de envio de resíduos combustíveis a aterros desde 2005;
- Altos impostos sobre incineração de resíduos recicláveis, que forçam a triagem eficiente;
- Cooperação entre setor público, privado e sociedade civil.
Além disso, a população sueca possui uma cultura de responsabilidade coletiva muito forte, o que facilita a adesão a programas ambientais.
Um modelo replicável ou exclusivo?
Apesar de inspirador, o modelo sueco enfrenta críticas e limitações. Ambientalistas alertam que a incineração de resíduos, mesmo com filtros modernos, ainda emite gases de efeito estufa e pode desincentivar a redução no consumo e o reaproveitamento completo dos materiais.
No entanto, a Suécia deixou claro que trata a incineração como último recurso da cadeia. Antes de queimar qualquer resíduo, o país esgota todas as possibilidades de reaproveitamento, reciclagem e compostagem.
O desafio agora é encontrar um equilíbrio entre eficiência energética e redução na geração de lixo, além de estimular outros países a adotarem modelos semelhantes, com foco em infraestrutura de coleta, educação ambiental e inovação tecnológica.
Enquanto países em desenvolvimento ainda lutam para implantar coleta seletiva básica, a Suécia já transformou o lixo em produto de exportação — ou melhor, de importação remunerada. O país prova que, com planejamento, tecnologia e consciência coletiva, é possível inverter a lógica do desperdício e criar um sistema onde o lixo gera energia, aquece casas e movimenta a economia.
E, no processo, a Suécia se tornou o país sem lixo — não porque ele deixou de existir, mas porque aprendeu a aproveitá-lo até o fim da cadeia.