O processo geológico, que criará um novo oceano em milhões de anos, já se manifesta com vulcões, terremotos e uma rachadura que avança 7 milímetros por ano.
A imagem de uma fissura gigante rasgando o continente africano alimenta a ideia de que a África está se dividindo de forma iminente. A realidade, no entanto, é um processo geológico monumental, porém extremamente lento, que de fato está separando o continente e que, em um futuro distante, dará origem a um novo oceano.
Este fenômeno, conhecido como Sistema do Rifte da África Oriental (EARS), não é uma teoria, mas um processo em câmera lenta que já rasga o continente com vulcões ativos, terremotos e fissuras dramáticas. Entenda o que está por trás dessa grande divisão, como a ciência a monitora e quais serão suas consequências para o futuro do planeta.
O que é o Sistema do Rifte da África Oriental?
A superfície da Terra é formada por placas tectônicas que estão em constante movimento. O Sistema do Rifte da África Oriental é uma área onde a Placa Africana está se partindo em duas: a Placa Núbia (maior) e a Placa Somali (menor). O processo é semelhante ao que separou a América do Sul da África e criou o Oceano Atlântico há milhões de anos.
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Essa separação é impulsionada por uma pluma do manto, uma coluna de rocha superaquecida que sobe das profundezas da Terra, funcionando como um ‘maçarico’ geológico sob o continente. Essa pluma aquece e estica a crosta terrestre por baixo, enfraquecendo-a e fazendo com que ela se frature. O resultado é a formação de um vasto sistema de vales, falhas e vulcões que se estende por cerca de 3.500 km, desde a Etiópia até Moçambique.
Vulcões e terremotos: as manifestações da divisão em andamento
A prova mais visível de que a África está se dividindo é a intensa atividade geológica ao longo do rifte.
Vulcões: A região abriga alguns dos vulcões mais ativos do mundo. O Nyiragongo, na República Democrática do Congo, é famoso por seus fluxos de lava rápidos e perigosos. O Erta Ale, na Etiópia, possui um raro lago de lava persistente. Até mesmo os pontos mais altos da África, como o Monte Kilimanjaro, são vulcões adormecidos formados por essa atividade.
Terremotos: O EARS é o sistema de rifte sismicamente mais ativo da Terra. Embora a maioria dos tremores seja de baixa magnitude, o sistema pode gerar terremotos grandes e destrutivos.
Fissuras: Em 2018, uma fissura com vários quilômetros de comprimento se abriu no Quênia, cortando uma rodovia e capturando a atenção do mundo. O evento foi causado pela erosão de cinzas vulcânicas que preenchiam uma falha pré-existente. A diferença entre as duas ramificações do rifte explica essa variedade de eventos: o ramo oriental, mais quente e com mais magma, tende a ‘vazar’ a tensão em erupções; já o ramo ocidental, mais frio, acumula a tensão por mais tempo, liberando-a em terremotos maiores e mais destrutivos.
A ciência que mede a rachadura: os 7 milímetros que a África se afasta por ano
Graças a tecnologias de satélite como o GPS de alta precisão e o InSAR (radar interferométrico), os cientistas conseguem medir o movimento das placas em tempo real. Os dados confirmam que a Placa Somali está se afastando da Placa Núbia a uma taxa média de 6 a 7 milímetros por ano.
Embora pareça pouco, em uma escala de tempo geológica, esse movimento é significativo. É essa medição precisa que permite aos cientistas projetar o futuro do continente com um alto grau de confiança.
Um novo oceano africano: como será o futuro em 10 milhões de anos?
Se a separação continuar no ritmo atual, o resultado final será a criação de um novo oceano. O processo acontecerá em etapas, ao longo de milhões de anos.
Primeiro, o vale do rifte continuará a se alargar e afundar. Eventualmente, a crosta se romperá por completo, e as águas do Mar Vermelho e do Golfo de Áden inundarão toda a extensão da fenda. Isso formará um novo e estreito mar, que com o tempo se expandirá para se tornar uma bacia oceânica completa. O processo todo deve levar de 5 a 10 milhões de anos. O mapa da África será drasticamente redesenhado, com o Chifre da África e partes de outros países formando um novo e grande continente-ilha. Países que hoje não têm acesso ao mar, como Uganda e Zâmbia, de repente teriam uma nova costa, mudando para sempre a geopolítica e a economia da região.
Os riscos e os recursos criados pela fenda
Para os milhões de pessoas que vivem na região, a constatação de que a África está se dividindo traz uma realidade de perigos e oportunidades.
Riscos: A atividade geológica representa uma ameaça constante. Terremotos, erupções e fissuras podem destruir cidades e infraestruturas, especialmente em uma região com muitas construções vulneráveis.
Oportunidades: As mesmas forças geológicas também criam recursos valiosos. O calor do manto que alimenta os vulcões dota a região de um potencial imenso para a geração de energia geotérmica, uma fonte limpa e renovável. O Quênia já é um líder mundial nesse setor. Além disso, o processo concentra depósitos minerais importantes, como ouro e ferro.
O futuro da África Oriental dependerá de sua capacidade de gerenciar essa dualidade, aproveitando o calor que gera energia limpa enquanto se prepara para a terra que treme. É um desafio de engenharia e planejamento que definirá o destino de milhões de pessoas que vivem sobre um continente em transformação.