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A batalha secreta por um campo de US$ 1 trilhão: como a Exxon quase frustrou o sonho bilionário da Chevron e virou o setor de petróleo de cabeça para baixo

Escrito por Alisson Ficher
Publicado em 22/07/2025 às 14:50
Exxon e Chevron travam disputa bilionária por campo de US$ 1 trilhão na Guiana, redefinindo estratégias no setor de petróleo mundial.
Exxon e Chevron travam disputa bilionária por campo de US$ 1 trilhão na Guiana, redefinindo estratégias no setor de petróleo mundial.
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Disputa de gigantes do petróleo mobilizou bilhões, expôs cláusulas contratuais pouco conhecidas e redefiniu estratégias globais, mudando o futuro do setor energético mundial.

Uma disputa silenciosa e prolongada entre gigantes do petróleo sacudiu o setor energético mundial, colocando em jogo um ativo avaliado em US$ 1 trilhão e alterando a dinâmica entre as maiores empresas do ramo no Hemisfério Ocidental.

Durante 20 meses, a Exxon Mobil Corporation e a Chevron Corporation travaram uma batalha jurídica e estratégica pelo controle do megacampo offshore de petróleo da Guiana, um dos maiores descobertos na última geração.

Segundo a agência de notícias Bloomberg, o embate teve início com uma cláusula pouco conhecida de um acordo operacional, firmado há mais de dez anos, que definia as regras de cooperação no campo de Stabroek, na costa guianense.

Este documento se tornou o centro de um caso de arbitragem capaz de comprometer a aquisição da Hess Corporation pela Chevron, uma transação estimada em US$ 53 bilhões.

Para além do valor envolvido, a disputa expôs fissuras profundas na relação entre executivos de empresas normalmente acostumadas à colaboração no setor de óleo e gás.

Como se desenrolou a disputa entre Exxon, Chevron e Hess

No fim de 2023, o setor petrolífero dos Estados Unidos vivia o auge dos lucros gerados pela valorização do barril após a invasão da Ucrânia pela Rússia.

Enquanto o mundo discutia alternativas para a transição energética, a dependência dos combustíveis fósseis se mostrava ainda essencial, favorecendo uma onda de consolidações bilionárias.

Em outubro daquele ano, a Exxon anunciou a aquisição da Pioneer Natural Resources Company, por US$ 60 bilhões, a maior transação do ciclo.

Duas semanas depois, a Chevron respondeu com a proposta de compra da Hess Corporation.

O que tornava a Hess um alvo cobiçado era sua participação minoritária, de 30%, no bloco Stabroek, região onde a Exxon lidera as operações e detém 45% do capital, enquanto a chinesa Cnooc Limited mantém outros 25%.

Desde 2015, a Exxon comandou a exploração que revelou 11 bilhões de barris em reservas recuperáveis, transformando o campo em um dos mais rentáveis fora da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep).

O interesse da Chevron no campo foi classificado como estratégico e de longo prazo.

O CEO da empresa, Mike Wirth, considerou Stabroek o principal ativo de crescimento do setor.

Já a cordialidade pública entre Wirth e John Hess, presidente da Hess Corporation, contrastava com a insatisfação interna da Exxon, que via a Chevron falando como se já fosse dona do campo, embora uma disputa contratual estivesse apenas começando.

Direito de preferência foi o pivô do impasse

O coração do conflito estava em uma cláusula de direito de preferência do acordo de operação conjunta.

Segundo este dispositivo, qualquer venda de participação deveria ser previamente ofertada aos demais sócios.

A Chevron e a Hess, amparadas por pareceres jurídicos, entenderam que a fusão não configurava uma venda de ativos, mas uma incorporação societária, o que afastaria a aplicação da cláusula.

No entanto, a Exxon discordou da interpretação, defendendo que a troca de controle da Hess acionaria o direito de preferência, e decidiu recorrer à arbitragem internacional.

As tratativas privadas rapidamente evoluíram para embate público.

Em março de 2024, a Exxon formalizou o pedido de arbitragem, surpreendendo o mercado e elevando a tensão entre os executivos.

O episódio teve impacto imediato nas ações da Hess, que caíram abaixo do valor da oferta da Chevron.

Fundos de investimento especializados em arbitragem, como Adage Capital Management e Millennium Management, passaram a operar fortemente os papéis das companhias, apostando na indefinição do desfecho.

O papel da arbitragem internacional e a influência dos órgãos reguladores

A disputa foi submetida a um painel convocado pela Câmara de Comércio Internacional (CCI), com expectativa inicial de decisão em poucos meses.

Entretanto, divergências entre as partes e a complexidade do contrato – elaborado sob legislação inglesa, que privilegia o texto literal sobre intenções subjetivas – prolongaram a análise, lançando a Chevron em um cenário de incerteza que se estendeu até meados de 2025.

Nesse período, fatores externos também contribuíram para aumentar a pressão sobre os envolvidos.

Em maio de 2024, o então líder do Senado dos Estados Unidos, Chuck Schumer, solicitou à Federal Trade Commission (FTC) uma avaliação rigorosa da aquisição, argumentando que o acordo poderia elevar ainda mais o custo da energia para consumidores e intensificar a concentração do setor.

Consultorias independentes e fundos de hedge, como HBK Capital Management, recomendaram aos acionistas da Hess que adiassem a aprovação da fusão até esclarecimento total da arbitragem.

Mesmo assim, John Hess intensificou esforços para garantir apoio dos investidores, promovendo reuniões em centros financeiros internacionais.

A votação dos acionistas aprovou o acordo por margem apertada, reflexo do ambiente de forte insegurança jurídica.

Detalhes contratuais e estratégias das empresas

A avaliação dos investidores e especialistas foi reforçada pela consulta a modelos contratuais similares, como o divulgado pela Association of International Energy Negotiators.

Tais documentos sugerem que a cláusula de preferência só se aplica quando não há controle contínuo pela mesma afiliada, tese defendida por Chevron e Hess.

A Exxon, porém, sustentava que o formato da fusão violava o espírito do contrato, pois permitia à Chevron assumir indiretamente a participação da Hess no campo bilionário sem ofertá-la aos demais sócios.

Enquanto o processo seguia sem solução, a FTC, após investigações sobre supostas conversas indevidas entre executivos da Hess e autoridades da Opep durante a pandemia de Covid-19, autorizou a fusão, mas impôs restrições à participação de John Hess no conselho da Chevron.

Posteriormente, as acusações foram consideradas infundadas e descartadas.

Desfecho: Chevron e Hess conquistam vitória após mais de um ano de incertezas

No segundo semestre de 2024, o desgaste era visível.

Executivos da Hess demonstravam frustração com o prolongamento da arbitragem e a postura da Exxon.

A diferença de valor entre as ações da Hess e o preço oferecido pela Chevron refletia a ansiedade dos mercados.

Mesmo assim, os dirigentes das duas empresas mantiveram confiança pública no sucesso da operação.

O impasse só foi superado em julho de 2025, quando a FTC, já sob nova presidência, revogou o impedimento à participação de John Hess no conselho.

Poucas horas depois, o painel internacional decidiu em favor da Chevron e da Hess, permitindo a conclusão da aquisição.

Assim, a Chevron consolidou sua posição em um dos campos mais valiosos do mundo, enquanto a Exxon reafirmou sua reputação de rigor contratual e defesa dos interesses de seus investidores.

O caso do bloco Stabroek revela a complexidade das grandes negociações do setor de energia, onde contratos antigos, estratégias globais e decisões regulatórias podem definir o destino de trilhões de dólares.

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Alisson Ficher

Jornalista formado desde 2017 e atuante na área desde 2015, com seis anos de experiência em revista impressa, passagens por canais de TV aberta e mais de 12 mil publicações online. Especialista em política, empregos, economia, cursos, entre outros temas. Registro profissional: 0087134/SP. Se você tiver alguma dúvida, quiser reportar um erro ou sugerir uma pauta sobre os temas tratados no site, entre em contato pelo e-mail: alisson.hficher@outlook.com. Não aceitamos currículos!

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