Em 2016, em meio à sua maior crise, a Petrobras vendeu sua operação na Argentina, mas fez uma aposta estratégica: manter uma fatia do campo de gás de Río Neuquén, hoje a chave para o seu retorno ao país.
Em 2016, em meio à maior crise de sua história, a Petrobras tomou uma decisão drástica que mudaria o mapa energético da América do Sul: vender sua operação na Argentina. A venda de seus ativos para a empresa local Pampa Energía foi um movimento de sobrevivência, mas que escondia uma jogada de mestre. Enquanto se desfazia de um vasto portfólio, a estatal brasileira fez questão de manter uma participação minoritária no promissor campo de gás de Río Neuquén, uma aposta estratégica que hoje se mostra visionária.
Quase uma década depois, o sucesso estrondoso da exploração de Vaca Muerta transformou a região na nova fronteira energética do continente. E o ativo que a Petrobras salvou é agora a porta de entrada para seu retorno estratégico ao país, validando uma decisão que passou quase despercebida na época.
Por que a Petrobras precisou vender seus ativos na Argentina em 2016?
Em meados da década de 2010, a Petrobras enfrentava uma crise existencial. O escândalo de corrupção da Operação Lava Jato abalou a empresa, enquanto sua dívida atingia a marca de US$ 130 bilhões, uma das maiores do setor no mundo. Para sobreviver, a estatal lançou um grande programa de desinvestimentos.
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A estratégia era clara: vender ativos “não estratégicos” para levantar capital e focar todos os recursos nos campos de altíssima produtividade do pré-sal brasileiro. Nesse contexto, a operação na Argentina, a Petrobras Argentina (PESA), foi colocada à venda.
A visão do comprador: O negócio de US$ 897 milhões que transformou a Pampa Energía
Enquanto a Petrobras recuava, a Pampa Energía, liderada pelo empresário Marcelo Mindlin, avançava. A empresa já era a maior do setor elétrico na Argentina, mas tinha o plano de se tornar uma gigante de energia totalmente integrada. Faltava a peça do petróleo e gás.
A compra da operação da Petrobras foi o movimento que tornou esse plano realidade. Em julho de 2016, a transação foi concluída por US$ 897 milhões. Com o negócio, a Pampa adquiriu um vasto portfólio de campos de petróleo e gás na Argentina, incluindo áreas na promissora formação de xisto de Vaca Muerta, na Bacia de Neuquén.
A aposta em Vaca Muerta: Como a Pampa transformou a região em uma “máquina de dinheiro”
Após a aquisição, a Pampa Energía iniciou um agressivo plano de investimentos, com foco total em desbloquear o potencial de Vaca Muerta. A empresa destinou mais de US$ 1,6 bilhão para o desenvolvimento de seus blocos de shale oil entre 2025 e 2026.
Os resultados foram espetaculares. A produção de petróleo e gás da empresa disparou. O lucro da Pampa em 2024 cresceu 105%, atingindo US$ 619 milhões. E o mais impressionante: a dívida líquida da companhia caiu para US$ 410 milhões, o menor nível desde a aquisição da Petrobras em 2016.
O campo de gás de Río Neuquén, a joia que a Petrobras não vendeu
A venda da Petrobras na Argentina, no entanto, teve uma cláusula crucial. No mesmo acordo de venda, a estatal brasileira fez um movimento de “carve-out”: ela recomprou da recém-adquirida PESA uma fatia de 33,6% do campo de gás de Río Neuquén, localizado na Bacia de Neuquén, por um valor líquido de US$ 52 milhões.
Mesmo em meio à crise, a equipe técnica da Petrobras identificou o imenso potencial daquele ativo específico e garantiu que a empresa mantivesse um pé no futuro do gás não convencional argentino.
O círculo se fecha em 2025: A Petrobras volta à Argentina de olho em Río Neuquén
Quase uma década depois, a história tem uma reviravolta irônica. Com o sucesso estrondoso de Vaca Muerta e a necessidade de gás para o Brasil, a Petrobras agora busca ativamente reentrar no mercado argentino.
Recentemente, a empresa assinou um acordo de cooperação com a estatal argentina YPF para avaliar projetos em conjunto. O foco principal? O mesmo campo de gás de Río Neuquén, o ativo que a Petrobras fez questão de manter. A busca da gigante brasileira pelo gás argentino hoje é a validação final da aposta visionária que a Pampa Energía fez em 2016 e, principalmente, da jogada estratégica da própria Petrobras de manter sua joia na Argentina.