União Europeia busca acordo com Brasil para garantir etanol e biocombustíveis, reagindo ao avanço chinês no mercado de energia limpa.
O Brasil é hoje o segundo maior produtor de etanol do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos. Somente em 2024, foram produzidos mais de 33 bilhões de litros, com forte presença da cana-de-açúcar como matéria-prima, que tem rendimento muito superior ao milho usado no etanol norte-americano. Isso garante ao produto brasileiro uma competitividade internacional única: baixo custo, elevada produtividade e uma pegada de carbono reduzida, fatores que encantam investidores europeus em busca de soluções sustentáveis.
A União Europeia, que pretende cortar em 55% as emissões de CO₂ até 2030, vê no Brasil uma alternativa imediata para garantir estoques de biocombustíveis a preços competitivos. As negociações caminham em paralelo ao acordo comercial Mercosul–UE, travado há anos por questões ambientais, mas agora pressionado pela urgência climática.
A ofensiva chinesa: contratos e investimentos bilionários
Enquanto Bruxelas negocia, Pequim age. Nos últimos anos, a China ampliou de forma agressiva sua presença no setor, assinando contratos bilionários de importação de etanol brasileiro e investindo em joint ventures com usinas nacionais. O objetivo é claro: assegurar suprimentos para alimentar sua transição energética, reduzir a dependência de carvão e construir reservas estratégicas que fortaleçam sua autonomia em relação ao Ocidente.
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De acordo com a Agência Internacional de Energia (IEA), a China já responde por mais de 20% do crescimento global no consumo de biocombustíveis desde 2020. Esse avanço preocupa tanto a União Europeia quanto os Estados Unidos, que enxergam no etanol e no biodiesel não apenas uma alternativa energética, mas também uma arma de poder econômico e diplomático.
Gargalos e riscos para o Brasil
Se por um lado o Brasil se beneficia da disputa entre gigantes, por outro enfrenta gargalos internos que podem comprometer sua capacidade de atender a essa demanda crescente. A infraestrutura de escoamento é uma das maiores barreiras: portos saturados, falta de dutos específicos e logística rodoviária ainda cara e ineficiente.
Além disso, há pressões ambientais. A União Europeia cobra garantias de que a expansão da produção de etanol não esteja associada ao desmatamento da Amazônia ou do Cerrado.
Sem comprovar rastreabilidade e sustentabilidade, parte das exportações brasileiras pode enfrentar barreiras regulatórias a partir de 2026, quando entram em vigor as regras mais rígidas do regulamento europeu contra desmatamento (EUDR).
O Brasil entre a Europa e a China
Nesse tabuleiro, o Brasil aparece como fiel da balança. Ao mesmo tempo em que negocia com a União Europeia para ganhar mercado e atrair investimentos, também fortalece laços com a China, seu maior parceiro comercial. A estratégia, segundo especialistas, é clara: usar a rivalidade entre os dois blocos para extrair vantagens em tecnologia, infraestrutura e financiamento.
A grande questão é se o país conseguirá equilibrar as pressões externas sem comprometer sua autonomia. Para a UE, o etanol brasileiro é chave na corrida pela descarbonização.
Para a China, trata-se de um ativo estratégico na disputa por hegemonia energética. Para o Brasil, a disputa pode se traduzir em crescimento econômico — ou em um gargalo que revele fragilidades logísticas e ambientais.
O futuro dos biocombustíveis como “arma de poder”
Com a guerra no leste europeu e a instabilidade no Oriente Médio, a corrida por fontes seguras de energia limpa se intensificou.
O etanol, antes visto como combustível alternativo, passou a ser tratado como commodity estratégica. Se confirmados os acordos, o Brasil pode se tornar a Arábia Saudita dos biocombustíveis, ocupando um papel central na transição energética global.
Mas especialistas alertam: sem investimentos massivos em infraestrutura e regulação ambiental rígida, o país corre o risco de perder espaço para concorrentes e se ver refém de disputas internacionais que escapam ao seu controle.
O avanço das negociações com a União Europeia coloca o Brasil no epicentro de uma disputa energética inédita. A promessa é de crescimento, investimentos e liderança em um mercado bilionário. O risco é de que as pressões externas — ambientais, logísticas e comerciais — transformem o combustível verde em uma nova dependência, tão ou mais vulnerável quanto a do petróleo.
O futuro dos biocombustíveis brasileiros está em jogo. A dúvida é: o país aproveitará a oportunidade para liderar a transição energética mundial ou ficará preso a mais uma armadilha geopolítica?