Empresa gaúcha fecha as portas após acumular dívidas milionárias, crise com clientes e impactos da pandemia, além de enfrentar novas tarifas impostas pelos Estados Unidos que atingiram em cheio o setor calçadista brasileiro.
A indústria calçadista Mulher Sofisticada, de Três Coroas (RS), paralisou a produção nesta segunda-feira (15), revelou o jornal Zero Hora.
De acordo com a publicação, a empresa informou que vai ingressar com pedido de autofalência nesta semana após acumular R$ 18,3 milhões em dívidas.
O encerramento das atividades resulta na demissão de 77 trabalhadores, segundo o sindicato local.
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A direção afirma que os salários do mês serão quitados, enquanto as verbas rescisórias devem ser habilitadas como créditos trabalhistas.
Encerramento e demissões em Três Coroas
O comunicado interno foi feito aos funcionários na manhã desta segunda.
De acordo com a empresa, a medida decorre do quadro financeiro “insustentável” e sucede tentativas frustradas de renegociação com credores.
O Sindicato dos Sapateiros de Três Coroas informou que 77 empregados foram desligados e que orientou os trabalhadores sobre procedimentos para garantia de direitos na Justiça do Trabalho.
A administração reiterou que os pagamentos salariais deste mês ocorreriam entre os dias 15 e 16 de setembro.
Produção e histórico da empresa
Fundada em 2012, a Mulher Sofisticada atuava como fabricante para marcas nacionais e já chegou a produzir 3,7 mil pares por dia.
Antes do fechamento, a operação vinha reduzida a cerca de 1,5 mil pares diários.
A companhia tinha aproximadamente 80 empregados no quadro recente, número que varia conforme a fonte — o sindicato fala em 77 desligados, enquanto relatos da direção mencionam “cerca de 80” colaboradores.
Como a crise se formou
O desequilíbrio começou em 2018, quando um dos principais clientes deixou de honrar pagamentos.
A partir de 2020, a pandemia derrubou a demanda e a fábrica operou com metade da capacidade.
Em 2022, a situação piorou com a falência de dois clientes relevantes.
No ano seguinte, as enchentes de 2024 no Rio Grande do Sul provocaram novos prejuízos logísticos e comerciais.
Em 2025, somou-se o impacto do tarifaço dos Estados Unidos sobre produtos brasileiros, pressionando margens de exportadores de calçados e alongando a sequência de choques que a empresa vinha absorvendo desde antes da pandemia.
O efeito do tarifaço dos EUA sobre o setor calçadista
A tarifa total de 50% sobre bens do Brasil foi confirmada por ordem executiva do governo dos Estados Unidos em 30 de julho de 2025, o que levou a Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados) a alertar para a inviabilidade de vendas ao mercado norte-americano nesse patamar.
Na virada de agosto, a medida completou um mês em vigor, enquanto autoridades brasileiras discutiam mitigação de danos e apoio a exportadores.
Ainda que o impacto agregado na economia brasileira tenha sido classificado como “modesto” por avaliações técnicas do governo federal, a indústria de calçados está entre as mais sensíveis ao aumento tarifário nos EUA, principal destino internacional do setor.
Para a Mulher Sofisticada, que operava como fornecedora de marcas com presença no exterior, a elevação de custos no acesso ao mercado norte-americano adicionou pressão num negócio já fragilizado por inadimplência de clientes e choques recentes.
Sinais no comércio exterior
Dados da Abicalçados indicam que, em agosto de 2025, as exportações brasileiras de calçados para os Estados Unidos caíram 17,6% na comparação com agosto de 2024, com leve recuo de receita no período.
O movimento reforça a leitura de que a alíquota de 50% funciona como barreira relevante para as vendas do setor ao maior mercado importador do segmento.
Próximos passos e direitos trabalhistas
Com a fábrica parada, a direção prepara o protocolo do pedido de autofalência no foro competente ainda nesta semana.
A orientação repassada aos empregados é reunir documentação, acompanhar os prazos processuais e buscar o sindicato para suporte.
Segundo a empresa, os salários do mês serão pagos nos próximos dias, enquanto as verbas rescisórias serão requeridas como créditos trabalhistas no processo.
Esse formato é comum em casos de autofalência, quando o passivo inviabiliza acordos imediatos com ex-colaboradores e fornecedores.
Repercussão regional e impactos
O fechamento da Mulher Sofisticada soma-se a dificuldades vividas por fabricantes do Vale do Paranhana e de outras regiões calçadistas do Rio Grande do Sul.
Além do encarecimento das exportações para os Estados Unidos, empresas locais ainda administram consequências de eventos climáticos, como as enchentes de 2024, que afetaram infraestrutura e logística.
Representantes setoriais e do governo estadual têm se reunido para avaliar alternativas de apoio à indústria, inclusive em razão das novas tarifas norte-americanas sobre produtos brasileiros.
Enquanto a empresa formaliza o pedido na Justiça, resta a dúvida central para o setor: quais medidas podem de fato reduzir o impacto do tarifaço e preservar empregos nas regiões calçadistas do Rio Grande do Sul?