Lecar anuncia rede de vendas para carros ainda inexistentes, promete modelos híbridos com autonomia de 1.000 km, projeta fábrica no Espírito Santo e busca atrair revendedores mesmo sem veículos prontos ou linha de produção definida.
A empresa brasileira Lecar tenta viabilizar uma rede de vendas para seus futuros automóveis, mesmo sem ter fábrica ou modelos prontos para circular.
Fundada por Flávio Figueiredo Assis, que se apresenta como o “Elon Musk brasileiro”, a marca promete lançar em 2026 o híbrido Lecar 459, com motor fornecido pela Horse, autonomia de até 1.000 quilômetros e versões também em picape.
Até agora, porém, só foram exibidas maquetes estáticas em eventos, como destacou o site Auto Papo em reportagem publicada na última quinta-feira (28).
-
A nova reunião do BRICS, convocada por Lula, tem como eixo a criação de mecanismos de comércio em moedas locais para escapar da pressão do dólar
-
Escassez de mão de obra chega no Nordeste! Trabalhadores recusam carteira assinada com medo de perder o Bolsa Família
-
Estradas de concreto duram até 30 anos, 3x mais que o asfalto brasileiro: por que não fazemos estradas como os americanos?
-
Montadoras tradicionais desistem de brigar com BYD e outras chinesas após virada histórica no mercado de elétricos acessíveis
Projetos ainda no papel
Desde 2023, a Lecar anuncia a intenção de criar uma montadora totalmente nacional, mas a proposta já passou por diversas mudanças.
Inicialmente, o 459 seria um carro 100% elétrico fabricado no Rio Grande do Sul.
Depois, a produção foi transferida para o Espírito Santo e, mais tarde, cogitou-se importar os veículos da China.
O plano atual prevê fabricar híbridos em série, nos quais o motor a combustão funciona apenas como gerador, semelhante ao sistema E-Power da Nissan.
A empresa também apresentou a picape Campo em feiras, mas, assim como o sedã, trata-se apenas de um mockup sem interior ou capacidade de rodagem.
Em redes sociais, a marca exibe ainda um chassi para demonstrar o trem de força planejado, composto por motor 1.0 turbo flex da Horse, motor elétrico de tração da chinesa HEPU Power, gerador da brasileira WEG e promessa de pacote tecnológico com assistentes de condução (ADAS).
Fábrica só em projeções
Apesar da previsão de estreia em agosto de 2026, a Lecar admite que o cronograma não será cumprido caso não encontre uma estrutura pronta para operar.
A fábrica de Sooretama, no Espírito Santo, existe apenas em imagens de computação gráfica.
Assis já se reuniu com a prefeitura de Jacareí (SP) para negociar a antiga unidade da Chery, hoje desativada, e afirmou que só conseguirá cumprir o prazo se concretizar a aquisição.
Mesmo sem confirmar um espaço físico, a companhia fala em abrir duas fábricas e produzir até 120 mil veículos por ano — número semelhante ao registrado pela Jeep em 2024.
O contrato assinado com a Horse, no entanto, cobre apenas 12 mil motores anuais, revelando uma discrepância entre a projeção de vendas e a capacidade contratada.
Rede de revendas virtual
Enquanto os automóveis não chegam às ruas, a estratégia da empresa é atrair interessados em abrir pontos de venda.
Em suas redes sociais, a Lecar divulga links de inscrição para revendedores. O investimento inicial é de R$ 15 mil, destinado a materiais de marketing.
Quem quiser expor um modelo poderá adquirir um mockup por R$ 200 mil, limitado a 20 unidades anuais.
Em live realizada no dia 27 de agosto, Flávio Figueiredo Assis explicou que o sistema não seguirá o formato tradicional de concessionárias. Segundo ele, bastaria ter um ponto comercial para atuar como vendedor.
O modelo de negócios, comparado pelo fundador ao adotado por marcas como Tesla e Porsche, prevê que o revendedor não precisará manter estoque, veículos de teste ou exposição obrigatória.
Questionado sobre os riscos para quem investir, Assis pediu confiança e alegou que forças contrárias estariam tentando minar o projeto.
Ainda assim, garantiu que os vendedores teriam retorno financeiro.
Ele também afirmou que serviços de manutenção e revisões ficarão a cargo da própria montadora, em centros especializados, cuja quantidade dependerá da demanda em cada região.
De acordo com o Auto Papo, o discurso do fundador foi marcado por promessas de retorno garantido aos futuros parceiros comerciais, embora ainda não haja carros prontos ou uma fábrica em funcionamento.
Condições de compra
A Lecar não pretende adotar financiamento bancário, leasing ou consórcios. A única modalidade disponível será a chamada “compra programada”. O valor fixado para o Lecar 459 e para a picape Campo é de R$ 159.300.
O cliente poderá parcelar em 48, 60 ou 72 vezes, sem juros, mas só terá acesso ao carro após quitar ao menos metade das prestações.
Isso significa que, mesmo com a previsão de lançamento para 2026, os primeiros compradores receberiam seus veículos apenas em 2027.
Caso desista do contrato, o cliente terá de pagar multa.
Segundo Assis, cerca de metade das reservas já realizadas veio de consumidores em Santa Catarina, embora a quantidade total de pedidos não tenha sido divulgada.
Parceiros e promessas
A estratégia da Lecar é usar componentes já disponíveis no mercado, o que, segundo o fundador, aceleraria o processo de desenvolvimento.
Entre os fornecedores citados estão Horse, Suspensys, Fras-le, Nakata, JBS Couros, Keko e o grupo Marcopolo.
A empresa também chegou a prometer blindagem de fábrica em suas publicações oficiais.
Ainda assim, especialistas do setor apontam que o prazo anunciado é ousado.
A chinesa BYD, por exemplo, afirma precisar de pelo menos 18 meses para criar um modelo novo, mesmo contando com mais de 100 mil engenheiros.
Fabricantes tradicionais levam de quatro a cinco anos para concluir todas as etapas de projeto, testes e validação.
O Auto Papo ressalta que, apesar das parcerias citadas, a Lecar ainda não apresentou um veículo funcional, o que reforça a distância entre os anúncios e a realidade da produção.
Expectativas futuras
Mesmo sem fábrica e sem um veículo rodando, a Lecar já divulgou planos de vender seus modelos no exterior, incluindo países da Europa, com a proposta de popularizar o uso do etanol.
Também apresentou esboços de um terceiro veículo, o chamado “SUV tático”.
Com tantas indefinições sobre cronograma, fábrica e capacidade real de produção, a dúvida central permanece: será que a Lecar conseguirá transformar suas maquetes em carros de verdade?