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Rios de São Paulo revelam ‘impactos’ de testes nucleares, diz estudo

Publicado em 27/10/2025 às 11:52
Testes nucleares, estudo, Rios, São Paulo
Imagem: Prefeitura de Eldorado / Divulgação
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Pesquisa da USP detecta vestígios de Césio-137 no Rio Ribeira de Iguape e mostra como testes nucleares dos anos 1960 deixaram marcas invisíveis que ajudam a definir o início do Antropoceno

Uma pesquisa de mestrado em Geografia Física na Universidade de São Paulo (USP) identificou vestígios de radioatividade em regiões pouco alteradas pela ação humana no interior de São Paulo. O estudo encontrou sinais de materiais relacionados a antigos testes nucleares, realizados no início dos anos 1960, e demonstrou que essas substâncias podem funcionar como marcadores seguros da presença humana em escala global.

Esses indícios se encaixam no conceito de Antropoceno, o período em que a atividade humana passou a ser o principal fator de transformação dos ambientes naturais.

Entre construções, exploração de recursos e disseminação de materiais artificiais, a radiação tornou-se uma das marcas mais duradouras dessa nova era geológica.

O legado dos testes nucleares

Entre 1953 e 1962, Estados Unidos, União Soviética, Reino Unido e França realizaram cerca de 2 mil testes nucleares.

O auge ocorreu em 1962, com mais de 120 detonações em um único ano. Em 1961, os soviéticos testaram a Tsar Bomb, considerada mais de 3 mil vezes mais potente que a bomba de Hiroshima.

Essas explosões geraram não apenas ondas de calor e choque, mas também uma dispersão massiva de partículas radioativas conhecidas como Fallout.

Esse material, ao cair sobre a superfície terrestre, contaminava áreas próximas aos locais de teste.

Contudo, o vento e outros fenômenos atmosféricos transportaram parte dessa chuva radioativa para regiões distantes, inclusive o Brasil.

Testes nucleares: marcas invisíveis no território brasileiro

Embora a concentração detectada no país seja muito baixa e sem risco à saúde, os registros contam uma história valiosa.

O ano de 1963 concentrou o maior volume de partículas radioativas, consequência direta dos testes de 1962.

A pressão pública e o medo de um conflito nuclear, especialmente após a Crise dos Mísseis de Cuba, resultaram em um acordo entre as principais potências atômicas.

Em agosto de 1963, Estados Unidos, Reino Unido e União Soviética assinaram o Tratado de Proibição Parcial de Testes (PTBT), que limitou detonações no ar, no espaço e sob a água.

O estudo no Rio Ribeira de Iguape

No Brasil, grupos de geofísicos da USP vêm investigando desde a década passada a presença de três marcadores: Carbono 14, Plutônio e Césio-137.

Esses elementos são buscados em ambientes naturais preservados, longe de fontes humanas de contaminação.

A pesquisa de Breno Rodrigues concentrou-se no Rio Ribeira de Iguape, entre Eldorado e Sete Barras, região conhecida por suas áreas de preservação, comunidades quilombolas e abundância de cavernas.

O local apresenta baixa intervenção urbana e agrícola, o que o torna ideal para estudos sobre fenômenos ambientais globais.

Segundo o grupo coordenado pela professora Cleide Rodrigues, o Ribeira é um rio meândrico, com muitas curvas.

Essa característica influencia a maneira como o Césio-137 se deposita e se preserva no ambiente. Por isso, compreender sua dinâmica ajuda a avaliar o impacto da chuva radioativa de 1963 sobre os sedimentos fluviais.

Como o Césio-137 revela o passado

O Césio-137 é um produto direto da fissão nuclear — processo em que um átomo de urânio se divide e libera energia.

Ele possui meia-vida de 30 anos, ou seja, em três décadas metade do material perde sua radioatividade e se transforma em Bário, um elemento estável.

Mesmo com o passar do tempo, cerca de um quarto do Césio-137 original ainda permanece na natureza. Detectá-lo, portanto, é possível e útil para datar camadas de sedimentos.

Essa capacidade permite determinar quando e como o material radioativo foi depositado, funcionando como um marcador histórico preciso.

Resultados e implicações do estudo

Os pesquisadores da USP confirmaram a presença residual de Césio-137 nos sedimentos do Rio Ribeira, associada ao fallout atmosférico da Guerra Fria. Contudo, observaram que a distribuição do material não é uniforme.

A variação entre os pontos de coleta ocorre devido à dinâmica natural do rio e aos processos de movimentação dos solos nas planícies.

Assim, os marcadores são constantemente retrabalhados por correntes, enchentes e deposições, assumindo diferentes posições ao longo do tempo.

Esses resultados reforçam a ideia de que o impacto das atividades humanas — mesmo aquelas realizadas a milhares de quilômetros de distância — pode ser registrado e identificado em ambientes naturais preservados.

Continuidade da pesquisa

O trabalho, que teve início no mestrado, segue em desenvolvimento. Breno Rodrigues é agora doutorando em Geografia pela USP e continua investigando como os processos fluviais interagem com elementos deixados pela radioatividade global.

Sua dissertação deve ser disponibilizada ainda neste semestre, complementando os dados já apresentados em congressos científicos e artigos especializados.

A pesquisa contribui para entender não apenas o comportamento de rios como o Ribeira, mas também como o planeta guarda as cicatrizes de eventos humanos de escala planetária.

O Antropoceno em evidência

Ao identificar o Césio-137 como marcador confiável, o estudo reforça o papel da radioatividade como assinatura inequívoca do Antropoceno.

Esse conceito, amplamente debatido na comunidade científica, destaca o ponto em que a ação humana passou a modificar profundamente os sistemas naturais da Terra.

Os vestígios atômicos espalhados pelo planeta contam uma história que ultrapassa fronteiras e gerações. Mesmo em regiões remotas, onde a natureza parece intocada, há sinais sutis da presença humana.

O caso do Rio Ribeira mostra que a história geológica recente não pode ser separada da história humana.

A radioatividade deixada pelas bombas do século passado continua a ecoar, silenciosa, nos sedimentos e nas águas, lembrando que nossas ações têm alcance global — e duram muito mais do que imaginamos.

Com informações de Agência Brasil.

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Romário Pereira de Carvalho

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