1. Início
  2. / Petróleo e Gás
  3. / Reverter a privatização vale a pena? Petroleiros cobram de Lula a reestatização da Refinaria de Manaus, anulando ordem de Bolsonaro
Localização AM Tempo de leitura 5 min de leitura Comentários 0 comentários

Reverter a privatização vale a pena? Petroleiros cobram de Lula a reestatização da Refinaria de Manaus, anulando ordem de Bolsonaro

Escrito por Rannyson Moura
Publicado em 16/09/2025 às 08:10
A Refinaria de Manaus, privatizada no governo Bolsonaro, enfrenta críticas por operar sem refino. Petroleiros cobram de Lula a reversão da venda e alertam para riscos à soberania energética no Norte do Brasil. Fonte: AEPET
A Refinaria de Manaus, privatizada no governo Bolsonaro, enfrenta críticas por operar sem refino. Petroleiros cobram de Lula a reversão da venda e alertam para riscos à soberania energética no Norte do Brasil. Fonte: AEPET
Seja o primeiro a reagir!
Reagir ao artigo

A Refinaria de Manaus, privatizada no governo Bolsonaro, enfrenta críticas por operar sem refino. Petroleiros cobram de Lula a reversão da venda e alertam para riscos à soberania energética no Norte do Brasil.

A Refinaria de Manaus (Ream), no Amazonas, tornou-se centro de um debate nacional que envolve o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-presidente Jair Bolsonaro e entidades do setor de petróleo. Privatizada no fim de 2022, durante o governo Bolsonaro, a unidade está praticamente paralisada, o que gera críticas sobre aumento dos preços e riscos à soberania energética da região Norte.

No último domingo, representantes do Sindicato dos Petroleiros do Amazonas (Sindipetro-AM) e da Federação Única dos Petroleiros (FUP) entregaram uma carta diretamente a Lula pedindo que o governo federal reverta a venda da refinaria ou busque uma forma de retomar o protagonismo da Petrobras no setor.

“Refinaria que não refina”: a principal denúncia

Segundo os petroleiros, a Ream, hoje sob controle do Grupo Atem, deixou de exercer sua função principal: o refino do petróleo. Marcus Ribeiro, coordenador do Sindipetro-AM, foi direto: “Hoje temos uma refinaria que não refina. Isso significa o descumprimento do papel estratégico de abastecimento”.

A denúncia é reforçada por documentos públicos da Agência Nacional do Petróleo (ANP), relatórios do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo e Gás (Ineep) e dados da própria empresa. A unidade, que antes processava mais de 900 mil barris de petróleo por mês, em 2022, passou a funcionar quase exclusivamente como base logística, sem produção significativa de combustíveis.

Com a queda na produção local, os consumidores do Amazonas sentiram rapidamente os efeitos no bolso. Segundo levantamento do Dieese, com base em dados da ANP, a gasolina no estado subiu 52,6% entre 2022 e agosto de 2025. No mesmo período, a média nacional foi de 25,2%.

Esse descompasso evidencia, de acordo com os petroleiros, que a privatização não aumentou a concorrência nem reduziu preços, como prometido no governo Bolsonaro. Pelo contrário, criou um monopólio privado que controla refino, importação e distribuição na região.

ANP aponta irregularidades na operação da refinaria

Em setembro, a ANP notificou oficialmente a Ream por operar de forma irregular. O órgão constatou que, após alegar necessidade de longas manutenções, a empresa voltou apenas parcialmente ao refino e concentrou-se na formulação de combustíveis — prática que não substitui o processamento do petróleo cru.

O superintendente da ANP, Brunno Atalla, destacou em ofício: “A instalação autorizada como refinaria não pode exercer unicamente atividades de formulação”. Caso a norma siga sendo descumprida, a unidade pode ser multada, suspensa ou até ter a autorização de funcionamento revogada.

A venda da antiga Refinaria Isaac Sabbá (Reman) ocorreu em dezembro de 2022, nos últimos dias da gestão de Jair Bolsonaro. A justificativa oficial era ampliar a concorrência no mercado e reduzir preços.

No entanto, dados do Ineep mostram que o efeito foi contrário. Em 2023, o diesel comercializado pela Ream chegou a custar até 25% mais caro do que o vendido pelas refinarias da Petrobras. No caso do gás de cozinha, a diferença foi ainda mais drástica: até 72% a mais.

Para o economista Eric Gil Dantas, do Ineep, a situação é um alerta: “Todas as privatizações de refinarias da Petrobras foram desastrosas, mas o caso da Ream é de longe o pior. Além de cobrar mais caro, ela parou de produzir. Isso gera empobrecimento, perda fiscal e dependência da importação”.

Ream opera com baixa capacidade desde a venda

Antes da privatização, em 2022, a refinaria utilizava 67% de sua capacidade de produção. Em 2024, esse índice despencou para pouco mais de 20%. Ainda assim, o Grupo Atem manteve posição de destaque na oferta de gasolina e diesel no Amazonas, controlando preços sem concorrência significativa.

Essa redução fez com que a empresa aumentasse a importação de derivados prontos, transformando a refinaria em um terminal logístico. Para Marcus Ribeiro, isso compromete o abastecimento e a segurança energética: “A região Norte, que já tem custos logísticos elevados, está sendo penalizada duas vezes, por não produzir e por depender da importação”.

Outra polêmica envolve o preço da refinaria. Segundo o Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), o Grupo Atem obteve, por meio de decisões judiciais, cerca de R$ 1,3 bilhão em isenções fiscais em anos próximos à aquisição. O valor é equivalente ao que foi pago pela refinaria.

Na prática, afirmam economistas, isso significaria que a unidade foi adquirida praticamente sem custo real. “A Atem ‘ganhou’ de volta tudo o que pagou pela refinaria em poucos anos”, observa Eric Dantas.

Petroleiros pedem reestatização e esperam resposta de Lula

Diante desse cenário, a carta entregue a Lula pede que a Petrobras reassuma o comando da refinaria ou, no mínimo, estabeleça parceria operacional para retomar o refino. “O povo do Norte precisa sentir, na prática, os efeitos de uma Petrobras forte, pública e comprometida com a soberania e com o desenvolvimento regional”, diz o documento assinado por FUP e Sindipetro-AM.

Até o momento, a Petrobras não se posicionou oficialmente sobre o pedido. O Cade e o Ministério de Minas e Energia também não responderam às solicitações.

Procurado, o Grupo Atem negou todas as acusações de que a refinaria teria se transformado em “terminal terrestre”. Em nota, afirmou que a redução na produção foi resultado de manutenções programadas em instalações construídas ainda na década de 1950.

Segundo a empresa, durante o período de ajustes, não houve interrupção no fornecimento e o abastecimento foi garantido mesmo em meio às maiores estiagens já registradas na região. Além disso, a companhia destacou investimentos feitos para modernizar os ativos e reforçou que cumpre todas as normas regulatórias.

O peso político entre Lula e Bolsonaro

A situação da refinaria de Manaus também expõe disputas políticas. Para aliados de Lula, o episódio é prova de que a política de privatizações de Bolsonaro foi prejudicial ao país, em especial para regiões mais distantes dos centros econômicos.

Já defensores do ex-presidente afirmam que a venda foi necessária para atrair investimentos privados e reduzir a presença estatal no setor. A escalada nos preços de combustíveis, no entanto, tem sido usada como argumento contrário a essa visão.

Com a pressão dos petroleiros e a indignação popular diante do aumento dos preços, Lula terá de decidir se avança com medidas para reverter a privatização ou se busca alternativas que devolvam à região Norte a autonomia energética perdida após a venda.

Aplicativo CPG Click Petroleo e Gas
Menos Anúncios, interação com usuários, Noticias/Vagas Personalizadas, Sorteios e muitos mais!
Inscreva-se
Notificar de
guest
0 Comentários
Mais recente
Mais antigos Mais votado
Feedbacks
Visualizar todos comentários
Rannyson Moura

Graduado em Publicidade e Propaganda pela UERN; mestre em Comunicação Social pela UFMG e doutorando em Estudos de Linguagens pelo CEFET-MG. Atua como redator freelancer desde 2019, com textos publicados em sites como Baixaki, MinhaSérie e Letras.mus.br. Academicamente, tem trabalhos publicados em livros e apresentados em eventos da área. Entre os temas de pesquisa, destaca-se o interesse pelo mercado editorial a partir de um olhar que considera diferentes marcadores sociais.

Compartilhar em aplicativos
0
Adoraríamos sua opnião sobre esse assunto, comente!x