Exportações de miúdos bovinos brasileiros ganham força na Ásia e desafiam os Estados Unidos, enquanto o Japão avalia habilitar frigoríficos e a Indonésia amplia sua demanda por carne brasileira.
A Abiec afirma que o principal temor dos Estados Unidos, em meio ao tarifaço contra produtos brasileiros, é ver o Brasil ganhar espaço na Ásia com a exportação de miúdos bovinos.
Segundo a entidade, itens como a língua têm valorização muito superior na região e podem render até seis vezes mais do que nos EUA, além de abrirem portas para um fluxo estável de demanda.
O presidente da associação, Roberto Perosa, avalia que existe um “momento diplomático” para o Japão habilitar frigoríficos brasileiros ainda em 2025.
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Miúdos em alta no mercado asiático
Com crescimento populacional e renda em avanço, a Ásia tornou-se a prioridade do setor de carne bovina brasileiro.
Não apenas pelos cortes tradicionais, mas pela venda de miúdos, que têm forte aceitação cultural e religiosa e agregam valor à indústria.
Nas palavras de Perosa, o mercado japonês paga entre US$ 10 e US$ 12 por quilo de língua bovina, enquanto o Brasil exporta o mesmo item por cerca de US$ 2.
A discrepância, sustenta ele, evidencia o potencial de margem para os exportadores. O dirigente recorreu a um exemplo do cotidiano para explicar o apelo local.
“Quem já foi no Japão sabe: numa churrascaria, em vez de servir a picanha fatiada como aqui, servem a língua fatiada, e é considerada um churrasco gourmet.”
O consumo consagrado pela tradição, disse, guia a estratégia do setor brasileiro para ampliar a presença nos nichos de maior valor do mercado asiático.
Temor dos EUA com avanço do Brasil
Perosa afirma que “os Estados Unidos têm receio de perder espaço na Ásia” diante da escala competitiva do Brasil.
Na avaliação dele, a capacidade de produção norte-americana e a da Austrália enfrentam limites mais rígidos, enquanto o Brasil reúne volume e regularidade para abastecer uma demanda crescente.
Pelo raciocínio da Abiec, abrir portas na Ásia é um caminho sem volta, tanto pela dimensão do consumo quanto pela preferência por cortes e miúdos que o país pode ofertar em grande quantidade.
Japão avalia habilitação de frigoríficos
A interlocução com Tóquio ganhou fôlego desde março de 2025, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva realizou visita de Estado ao Japão — a primeira organizada pelo país desde 2019.
A agenda incluiu a assinatura de atos de cooperação em diversas áreas, inclusive a agropecuária.
Na sequência, técnicos japoneses vieram ao Brasil para inspecionar frigoríficos, em um dos mercados com critérios sanitários mais rigorosos do mundo para carne bovina.
Para a Abiec, as conversas evoluíram, mas as decisões estão nas mãos do Ministério da Agricultura, responsável por negociar a abertura com as autoridades japonesas.
“Existe um momento diplomático para haver esse anúncio”, afirmou Perosa, indicando a COP30, que ocorrerá de 10 a 21 de novembro em Belém (PA), como uma possível vitrine para formalizar habilitações — hipótese que, frisa, depende de agenda e validação do governo japonês.
Indonésia amplia compras e libera novos produtos
Enquanto o Japão avalia novas habilitações, a Indonésia autorizou, na segunda-feira (8), mais 17 plantas brasileiras, elevando para 38 o total de frigoríficos aptos a exportar ao país.
O governo indonésio também liberou a entrada de carne com osso, miúdos e produtos preparados, ampliando o leque de itens que o Brasil pode ofertar.
No acumulado de 2025, as vendas para o mercado indonésio somam 15,4 mil toneladas e US$ 71,6 milhões, alta de 258,9% em valor e 253% em volume frente ao mesmo período de 2024.
Exportações superam projeções em 2025
No período de janeiro a agosto, o Brasil embarcou 2 milhões de toneladas de carne bovina, crescimento de 20% em relação a 2024.
A receita atingiu US$ 10,7 bilhões, avanço de 33% na mesma comparação.
A China segue como principal destino, com 1 milhão de toneladas e US$ 5,4 bilhões, consolidando a liderança asiática no consumo da proteína brasileira.
Os números superam as projeções apresentadas pela Abiec em dezembro passado, quando a entidade estimava alta de 12% no volume e 14% no faturamento em 2025.
“Para minha surpresa, isso está mantido, e está dando acima”, disse Perosa.
Segundo ele, o resultado parcial indica 12% de incremento no volume e 16% no faturamento, ritmo beneficiado pelo maior apetite asiático e por ganhos em mercados específicos, como a própria Indonésia.
Tarifaço dos EUA e a diversificação geográfica
A entidade reconhece os efeitos do tarifaço aplicado pelos Estados Unidos, mas sustenta que a diversificação geográfica tem amortecido impactos.
Alguns países aumentaram as compras, outros reduziram, observa Perosa, porém o saldo global dos embarques permanece equilibrado.
Nesse contexto, abrir e consolidar mercados asiáticos — em especial para miúdos — figura como prioridade para elevar o valor por tonelada e reduzir a dependência de destinos sensíveis a medidas tarifárias.
Perspectivas para China e mercados asiáticos
Para os próximos meses, a Abiec prevê novas rodadas de conversas na China em busca de ajustes regulatórios e maior previsibilidade de fluxo.
A estratégia combina volume em cortes tradicionais com rentabilidade via miúdos, hoje reconhecidos como um trunfo comercial pela indústria brasileira.
A leitura do setor é que, na Ásia, estão o crescimento do consumo e as melhores oportunidades para capturar valor, sobretudo onde há tradição culinária associada a esses produtos.
A aposta na região não elimina a necessidade de rigor sanitário, rastreabilidade e compliance ambiental, condições que o Japão e outros países asiáticos tendem a exigir com mais severidade.
Nesse sentido, o esforço para habilitar plantas, padronizar protocolos e adequar documentação é visto como decisivo para converter o momento diplomático em acesso efetivo e, na sequência, em contratos de longo prazo.
Escala produtiva e disputa global
A visão da Abiec é direta: escala produtiva e mix de produtos dão ao Brasil uma vantagem estrutural para abastecer um continente que paga mais por miúdos e mantém demanda firme.
Se o país amplia o acesso no Japão e aprofunda parcerias no Sudeste Asiático e na China, a “guerra” tarifária perde poder de pressão sobre os preços e margens do exportador brasileiro.
O ponto de atenção, reforça o setor, é converter a janela política de 2025 em novas habilitações e rotas comerciais que se sustentem no médio prazo.
Com a COP30 no horizonte e uma agenda ativa em Tóquio e Pequim, o Brasil deve priorizar habilitações no Japão para capturar valor imediatamente ou acelerar acordos com outros mercados asiáticos para ganhar escala, qual é o caminho mais eficaz na sua avaliação?