1. Início
  2. / Transporte Ferroviário
  3. / Por que uma ferrovia de R$ 15 bilhões ainda está inacabada após quase 20 anos e ameaça escoamento agrícola no Nordeste?
Tempo de leitura 5 min de leitura Comentários 0 comentários

Por que uma ferrovia de R$ 15 bilhões ainda está inacabada após quase 20 anos e ameaça escoamento agrícola no Nordeste?

Escrito por Alisson Ficher
Publicado em 07/08/2025 às 17:41
Ferrovia Transnordestina segue inacabada após 20 anos e ameaça o escoamento agrícola no Nordeste, impactando o agronegócio regional.
Ferrovia Transnordestina segue inacabada após 20 anos e ameaça o escoamento agrícola no Nordeste, impactando o agronegócio regional.
Seja o primeiro a reagir!
Reagir ao artigo

Projeto bilionário segue em atraso no Nordeste, com obras paralisadas, disputas políticas e incerteza sobre conclusão, afetando diretamente o transporte de grãos e a competitividade agrícola da região.

A construção da Ferrovia Transnordestina, orçada em R$ 15 bilhões, ilustra como desafios políticos, administrativos e econômicos podem impedir o avanço de grandes projetos logísticos no Brasil.

Vinte anos após o início das obras, a ferrovia permanece inacabada e ameaça diretamente a competitividade do agronegócio no Nordeste, especialmente no escoamento da produção de grãos do Matopiba — região que engloba Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia.

Projetada para impulsionar a integração e reduzir custos logísticos, a Ferrovia Transnordestina soma dois grandes trechos, ambos ainda sem conclusão total.

Segundo dados oficiais, dos R$ 15 bilhões previstos, aproximadamente R$ 8 bilhões já foram consumidos, restando R$ 7 bilhões para finalização.

A divisão entre os dois principais eixos evidencia as dificuldades: o trecho que liga Eliseu Martins (PI) ao Porto do Pecém, em Fortaleza (CE), segue com obras em ritmo acelerado graças ao suporte financeiro do governo federal e da concessionária Transnordestina Logística (TLSA), subsidiária da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN).

No entanto, o ramal pernambucano, que deveria ligar Salgueiro ao Porto de Suape, encontra-se estagnado desde 2016, tendo sido oficialmente devolvido pela TLSA em 2022, devido à inviabilidade econômica.

A responsabilidade pela retomada passou ao governo federal, que ainda não definiu previsão concreta para a conclusão, apesar de ter anunciado novo edital para o segundo semestre deste ano.

Atrasos e disputas de recursos na ferrovia Transnordestina

A execução do projeto foi marcada por frequentes interrupções, embates políticos e disputas por orçamento.

Um dos episódios mais recentes foi a demissão do então superintendente da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), Danilo Cabral, em julho de 2025.

O desligamento ocorreu em meio a divergências com o governo do Ceará, envolvendo a destinação de verbas para o trecho pernambucano da Transnordestina.

Embora Cabral tenha conseguido incluir parte das obras no Novo PAC 2025, garantindo inicialmente R$ 450 milhões, o valor foi considerado insuficiente por representantes locais.

O Fundo de Desenvolvimento do Nordeste (FDNE), responsável por financiar projetos estruturais na região, redirecionou integralmente seu orçamento anual de R$ 1 bilhão até 2026 para a conclusão do trecho cearense.

O reforço financeiro, que já garantiu R$ 3,6 bilhões ao projeto, gerou insatisfação entre políticos pernambucanos e líderes de outros estados, que alegam desequilíbrio na destinação de recursos para o desenvolvimento regional.

Avanço do trecho cearense e cronograma revisto

A reestruturação do projeto no Ceará, iniciada em 2022, permitiu avanço físico relevante: dos 1.200 km previstos, 676 km já foram entregues.

Em julho de 2025, o governo federal anunciou novo aporte de R$ 1,4 bilhão, proveniente do FDNE e de bancos públicos, assegurando a inauguração do trecho entre Bela Vista do Piauí (próximo a Simplício Mendes), no Piauí, até Iguatu (CE) já em outubro.

Este segmento de cerca de 500 km permitirá o transporte de grãos em composições de até 126 vagões, capacidade equivalente a 380 caminhões, com expectativa de reduzir em até 30% os custos logísticos e encurtar em 40% o percurso até os portos.

Em contrapartida, o trecho pernambucano soma 160 km já concluídos, mas necessita de mais 370 km para chegar ao Porto de Suape, o que deve demandar investimentos adicionais de aproximadamente R$ 5 bilhões.

A incerteza quanto à continuidade das obras gera apreensão entre produtores rurais e especialistas em infraestrutura, pois a conclusão total da ferrovia é vista como essencial para garantir a eficiência do escoamento agrícola no Nordeste.

Desafios de integração e limitações estruturais

Especialistas em logística apontam que a concepção da Transnordestina apresenta limitações, principalmente pela falta de integração com outras ferrovias do Centro-Oeste e Sudeste do país, dificultando o pleno aproveitamento do potencial logístico da linha.

Essa ausência de interconexão amplia a dependência do modal rodoviário para longas distâncias, elevando custos e diminuindo a competitividade da produção nordestina nos mercados nacional e internacional.

Além disso, outra ferrovia fundamental para a região, a Ferrovia Transnordestina Logística (FTL) — que não se confunde com os trechos em construção — também enfrenta desafios.

Com 1.237 km ligando Fortaleza (CE) a São Luís (MA), a FTL está sob concessão desde 1998 e pode ter seu contrato de renovação, solicitado até 2062, questionado pelo Tribunal de Contas da União (TCU).

A concessionária propôs devolver 3 mil km de trechos considerados “não operacionais”, concentrando investimentos nos ramais ativos e oferecendo como contrapartida a construção de Veículos Leves sobre Trilhos (VLTs) em Campina Grande (PB) e Arapiraca (AL).

O TCU, no entanto, apontou questões complexas sobre indenizações e exigiu garantias para renovação da concessão.

Segundo a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), parte das obrigações contratuais não foi cumprida durante a vigência do contrato, o que amplia o cenário de incertezas para o futuro ferroviário nordestino.

Impactos para o agronegócio e infraestrutura regional

O impasse na conclusão da Transnordestina e o atraso na renovação da FTL têm consequências diretas para o agronegócio do Matopiba.

A região, considerada uma das principais fronteiras agrícolas do país, depende do modal ferroviário para garantir preços competitivos, aumentar a produtividade e expandir a participação no mercado global.

Relatórios oficiais indicam que a plena operação da ferrovia pode transformar o perfil logístico do Nordeste, trazendo ganhos estruturais para toda a economia regional.

Enquanto o trecho cearense avança com previsão de entrega do principal eixo até o segundo semestre de 2027, o futuro do ramal pernambucano e a integração nacional seguem indefinidos.

A expectativa é de que decisões sobre investimentos e contratos sejam tomadas nos próximos meses por órgãos federais e pelo TCU.

O cenário atual levanta uma dúvida relevante: por que, mesmo com tantos investimentos públicos e privados, o Nordeste ainda enfrenta desafios para garantir uma infraestrutura ferroviária à altura do seu potencial agrícola e logístico?

O que você acredita ser o principal entrave para que projetos estratégicos como a Transnordestina avancem com eficiência no Brasil?

Inscreva-se
Notificar de
guest
0 Comentários
Mais recente
Mais antigos Mais votado
Feedbacks
Visualizar todos comentários
Fonte
Alisson Ficher

Jornalista formado desde 2017 e atuante na área desde 2015, com seis anos de experiência em revista impressa, passagens por canais de TV aberta e mais de 12 mil publicações online. Especialista em política, empregos, economia, cursos, entre outros temas. Registro profissional: 0087134/SP. Se você tiver alguma dúvida, quiser reportar um erro ou sugerir uma pauta sobre os temas tratados no site, entre em contato pelo e-mail: alisson.hficher@outlook.com. Não aceitamos currículos!

Compartilhar em aplicativos
0
Adoraríamos sua opnião sobre esse assunto, comente!x