Projeto de Lei 4802/2024 simplifica partilhas no Brasil e permite que inventários de até R$ 1,5 milhão sejam feitos em cartório, reduzindo tempo e custos.
Uma das maiores mudanças no direito sucessório brasileiro pode estar prestes a acontecer. O Projeto de Lei 4802/2024, em tramitação na Câmara dos Deputados, propõe que inventários e partilhas de bens de até mil salários mínimos, cerca de R$ 1,5 milhão — possam ser resolvidos diretamente em cartório, sem a necessidade de processo judicial.
O texto busca simplificar e acelerar o processo de transmissão de bens após o falecimento, reduzindo burocracia, custos e o tempo que hoje pode se arrastar por anos na Justiça. Segundo o autor do projeto, deputado Jonas Donizette (PSB-SP), o objetivo é “libertar famílias de processos lentos e caros, que muitas vezes duram mais do que o valor dos bens herdados”.
O que o PL 4802/2024 muda na prática
Hoje, pela regra do Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), o inventário pode ser feito em cartório apenas se todos os herdeiros forem maiores, capazes e estiverem de acordo, e se não houver testamento.
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Mesmo assim, o procedimento exige advogado, escritura pública e pagamento de taxas cartorárias, o que torna o processo lento e oneroso.
O novo projeto muda esse cenário:
- O arrolamento sumário passaria a ser a única forma de inventário para espólios de até mil salários mínimos;
- As custas e honorários seriam reduzidos, permitindo que famílias de menor renda resolvam o processo de forma acessível;
- O cartório teria competência plena para emitir escritura de partilha com validade imediata;
- E, em caso de divergência, o acesso ao Judiciário continuaria garantido, mas apenas se algum herdeiro questionar o resultado.
Um processo que hoje leva anos pode durar semanas
De acordo com dados do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), o Brasil registra cerca de 1 milhão de inventários abertos por ano, e boa parte deles demora mais de dois anos para ser concluída. Em muitos casos, os bens ficam paralisados, impedindo a venda, uso ou transferência de titularidade.
Com o PL 4802/2024, o inventário simplificado poderá ser concluído em até 30 dias, conforme previsão da minuta do projeto.
Esse prazo se tornaria possível porque toda a documentação seria analisada pelo tabelião, sem necessidade de despacho judicial ou perícia.
Acesso facilitado e menos burocracia
A proposta também traz benefícios sociais importantes. Famílias de baixa renda que herdam imóveis modestos, pequenos terrenos ou valores de poupança muitas vezes deixam de fazer o inventário por falta de recursos para custas e advogado — o que bloqueia o uso do bem por anos e acumula impostos.
Com o novo formato, essas famílias poderão resolver a sucessão sem intermediários, desde que comprovem consenso entre os herdeiros e inexistência de dívidas que impeçam a partilha. Além disso, o texto abre espaço para que o procedimento seja 100% digital, seguindo o modelo dos cartórios eletrônicos instituído pelo CNJ em 2025.
Impactos esperados no Judiciário
Especialistas apontam que, se aprovado, o PL 4802/2024 pode reduzir em até 40% a demanda de processos de inventário na Justiça. Para o setor cartorário, a medida representa um avanço semelhante ao que ocorreu em 2007, quando a Lei nº 11.441 autorizou pela primeira vez os inventários extrajudiciais.
Na época, a mudança provocou uma queda imediata no número de ações judiciais, aliviando varas cíveis e de família.
Agora, com a ampliação do limite de valor para R$ 1,5 milhão, a expectativa é de um impacto ainda maior.
Discussão e próximos passos
O projeto foi apresentado na Câmara dos Deputados em agosto de 2024 e encaminhado à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), onde aguarda parecer. Se aprovado, seguirá para o Senado Federal antes de sanção presidencial.
O texto recebeu apoio de representantes da Anoreg (Associação dos Notários e Registradores), que consideram a proposta “um passo decisivo na desjudicialização do país”.
O Ministério da Justiça também acompanha o debate, já que a medida deve alterar a lógica da transmissão patrimonial no Brasil.
Uma mudança que pode transformar o direito sucessório
Se aprovado, o PL 4802/2024 marcará um divisor de águas no direito de família e sucessões.
Pela primeira vez, o inventário deixará de ser um símbolo de burocracia e dor de cabeça judicial, passando a ser um ato administrativo ágil, acessível e eletrônico.
Para milhões de famílias, especialmente as de classe média e baixa, o projeto pode representar a diferença entre ter um imóvel bloqueado por anos ou receber legalmente o patrimônio em semanas.
Em resumo: o PL 4802/2024 ainda aguarda votação, mas já é tratado como um dos projetos mais transformadores da década no campo da herança. Ele promete não apenas reduzir custos, mas humanizar e modernizar o processo de sucessão — tornando a herança algo mais próximo da vida real do brasileiro comum.