Banco Central prepara regras para o PIX Parcelado, modalidade que pode ampliar o acesso ao crédito, mas traz custos e riscos maiores que o cartão. O tema envolve taxas, IOF, CET e preocupa entidades de defesa do consumidor.
O Banco Central deve regulamentar o PIX Parcelado até o fim deste mês, criando regras únicas para uma funcionalidade já oferecida por bancos e fintechs.
A padronização tende a ampliar o uso do PIX no varejo e facilitar compras de maior valor, pois o lojista recebe o total à vista.
Para o cliente, porém, trata-se de crédito: é preciso atenção ao CET, ao IOF e às políticas de aprovação, já que o custo pode superar o do cartão de crédito.
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O que muda com a norma do BC
A regulamentação busca dar transparência, padronizar informações e estimular o uso responsável.
Na prática, o pagamento parcelado por PIX permite ao comércio antecipar o recebimento integral e pode atingir consumidores que ainda não usam cartão.
Apesar disso, a modalidade não é um “PIX para todos”.
Segundo reportagem publicada pelo g1, será destinada a quem já tem relacionamento com instituições financeiras e dispõe de uma linha de crédito liberada.
“O PIX Parcelado vai ser utilizado por quem é bancarizado. Essa pessoa já tem uma linha de crédito disponível para ele, e vai poder utilizar essa linha e parcelar os pagamentos utilizando o PIX”, afirmou Walter Faria, diretor-adjunto de Serviços e Segurança da Federação Brasileira de Bancos.
Quem poderá usar e quais critérios pesam
Não basta ter conta ativa.
Bancos e fintechs avaliam histórico de pagamentos, score de crédito, movimentação da conta e renda para definir limite e condições.
Em outras palavras, o PIX Parcelado se apoia na mesma análise usada para empréstimos e cartões.
PIX em alta: alcance e volume
Desde o lançamento do sistema, cerca de 70 milhões de pessoas passaram a usar serviços financeiros digitais.
O PIX se consolidou como o principal meio de transferência do país.
No segundo trimestre de 2025, o Banco Central contabilizou 19,3 bilhões de operações via PIX.
O volume foi 53,5% acima das transações com cartões (crédito, débito e pré-pago), que somaram 12,6 bilhões no período.
Também ficou 335% superior às cobranças por boleto, convênio e débito direto, de 4,4 bilhões.
O g1 também apontou que o PIX já responde pela maior parte das transferências realizadas por brasileiros, muito acima dos meios tradicionais.
Parcelamento é crédito, não função original do PIX
Como o parcelamento não integra as funções básicas do sistema de pagamentos instantâneos, ele opera como uma operação de crédito oferecida pelas instituições.
O uso do PIX segue gratuito, mas a linha de parcelamento envolve juros e condições contratuais.
Para Marcelo Sá, diretor de Negócios do Braza Bank, um ponto crucial da regulação será esclarecer como os bancos serão remunerados pelo risco assumido.
Segundo ele, há duas vias: uma taxa por transação cobrada do estabelecimento ou a cobrança direta de juros do consumidor.
Nesse segundo caso, avalia, o PIX Parcelado pode perder competitividade ante o cartão, frequentemente vendido como alternativa “sem juros”.
“Com taxas na casa dos 2% ao mês, por se tratar de uma operação financeira, o PIX Parcelado pode tornar a compra mais cara. [Isso porque] ainda tem a cobrança do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) — o que não ocorre nos parcelamentos com o cartão”, disse em entrevista ao g1.
Transparência: papel do CET na decisão
A clareza sobre custos é mandatória. O Custo Efetivo Total (CET) deve reunir todas as despesas da operação, incluindo juros, tributos e tarifas.
No PIX Parcelado, essa métrica permite saber quanto será pago, do início ao fim do contrato.
Como ressalta Walter Faria, o serviço de transferência em si não tem tarifas ou juros. O que gera custos é a operação de crédito acoplada, que precisa expor o CET de forma padronizada e compreensível.
Comparação com o cartão: quando pode sair mais caro
O cartão de crédito costuma ser apresentado com parcelamento “sem juros” no varejo, embora embuta condições comerciais negociadas com o lojista.
Se os bancos optarem por repassar juros diretamente ao consumidor do PIX Parcelado e houver incidência de IOF, a compra pode ficar mais onerosa.
A regra, portanto, não elimina a comparação. Cada cliente deverá confrontar taxas, prazos e encargos antes de decidir.
Alerta do Idec: risco de confusão e superendividamento
O Instituto de Defesa de Consumidores teme que os usuários confundam o parcelamento do PIX com uma simples divisão de pagamento.
Na visão da entidade, a modalidade é efetivamente um crédito que envolve juros, tarifas e contrato.
“O PIX nasceu como uma política pública de democratização dos pagamentos. Transformá-lo em um canal de crédito pouco regulado é colocar em risco essa conquista”, alerta o Idec.
De acordo com apuração do g1, a entidade defende que a solução tenha identidade própria (sem uso da marca PIX), siga regras idênticas às de outros produtos de crédito, traga contratos claros com direitos assegurados, adote medidas reais contra o superendividamento, funcione apenas por ativação explícita do usuário e passe por consulta pública ampla com foco na proteção do consumidor.
Como o mercado opera hoje
Sem padronização específica, cada instituição define modalidade, taxas e condições do chamado PIX Parcelado, em geral como crédito pessoal vinculado ao relacionamento do cliente.
Segundo apuração do g1, os principais bancos e fintechs já oferecem versões próprias, enquanto o Banco Central foi procurado para comentar a regulação, mas não concedeu entrevista.
Quem deve aderir primeiro
A economista Carla Beni, professora da FGV e integrante do Corecon-SP, vê três perfis com maior probabilidade de adesão inicial.
Um grupo reúne quem tem crédito aprovado e não possui cartão para compras grandes, como eletroeletrônicos, usando o parcelamento “quase como um carnê do passado”.
Outro segmento contempla clientes com cartão que encontrarem taxas competitivas no PIX Parcelado ou decidirem combiná-lo com pagamento de entrada à vista, aproveitando descontos.
Há ainda os que buscam crédito adicional: consumidores com limite do cartão esgotado podem enxergar na nova modalidade uma linha extra, inclusive em outra instituição.
Inadimplência em foco
O cenário de endividamento pressiona a necessidade de cautela.
O Relatório de Crédito do Ministério da Fazenda, com dados do BC, indica que o cartão de crédito é hoje o principal motor das dívidas das famílias.
Em julho, o pagamento parcial da fatura — o rotativo — respondeu por 60,5% dos casos de inadimplência entre pessoas físicas.
A trajetória de uma década mostra aumento desse tipo de pendência, com impacto mais severo nas rendas baixas, justamente as que enfrentam as piores condições de acesso a crédito.