O aumento dos processos trabalhistas rumo a 2,3 milhões em 2025 não se deve a novos direitos criados, mas a decisões do STF e do TST que enfraqueceram pontos centrais da reforma de 2017 e ampliaram a concessão da justiça gratuita, até para pessoas de alta renda.
O Brasil pode registrar em 2025 2,3 milhões de processos trabalhistas, o maior número desde a reforma de 2017. Segundo levantamento divulgado pela Gazeta do Povo, apenas no primeiro semestre já foram ajuizadas 1,150 milhão de ações, contra 1,044 milhão no mesmo período de 2024. Mantido esse ritmo, o volume de ações superará os 2,1 milhões registrados no ano passado, evidenciando uma reversão do cenário de queda observado após a reforma.
Especialistas explicam que o crescimento não se deve a novos direitos criados, mas a decisões do STF e do TST que enfraqueceram pontos centrais da reforma trabalhista, especialmente no que se refere à justiça gratuita e aos custos de quem perde uma ação.
Esse movimento tem incentivado o aumento de litígios e traz preocupação sobre os impactos financeiros e institucionais para o sistema de Justiça e para as empresas.
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Como a reforma de 2017 mudou o cenário
A reforma aprovada no governo Michel Temer tinha como objetivo reduzir a insegurança jurídica e desestimular ações frívolas.
Duas medidas foram centrais: limitar a concessão de justiça gratuita a quem ganhava até 40% do teto do INSS e obrigar trabalhadores derrotados a arcar com custas e honorários advocatícios. O efeito foi imediato: o número de processos caiu de 2,7 milhões em 2016 para 1,4 milhão em 2020.
Esse ambiente de menor litigiosidade foi apontado em estudos da USP e do Insper como favorável à geração de empregos.
Entre 2017 e 2022, foram criadas 1,7 milhão de vagas formais, resultado atribuído, em parte, à maior previsibilidade das relações de trabalho.
Decisões judiciais mudaram a trajetória
O quadro começou a se alterar em 2021, quando o STF considerou inconstitucional a cobrança de honorários periciais e de sucumbência de beneficiários da justiça gratuita.
A decisão eliminou o chamado “risco financeiro”, que desestimulava trabalhadores a entrar com ações de baixo potencial de ganho.
Em 2024, o TST ampliou ainda mais a concessão da gratuidade, permitindo que trabalhadores com renda acima de 40% do teto do INSS conseguissem o benefício apenas com uma autodeclaração de hipossuficiência econômica. Na prática, basta alegar não ter condições financeiras para obter a isenção.
Essa brecha abriu caminho para distorções. Casos levantados pelo sociólogo José Pastore (USP) mostram exemplos emblemáticos: um reclamante com duas BMW avaliadas em R$ 800 mil cada e uma Harley-Davidson de R$ 240 mil obteve justiça gratuita; outro, funcionário do setor financeiro com salário de R$ 43,6 mil, recebeu isenção e, ao final do processo, indenização de R$ 960 mil paga pelo Estado.
Custos bilionários e impacto no sistema
Segundo dados da Justiça do Trabalho, entre 2019 e 2024, 79,8% dos pedidos de gratuidade foram aceitos com base apenas em autodeclarações, gerando uma perda estimada em R$ 5,59 bilhões em custas e R$ 300 milhões em honorários periciais.
Para críticos, essa flexibilização estimula ações temerárias e transfere para o Estado custos que deveriam ser arcados pelos litigantes.
Além do impacto fiscal, o aumento de processos eleva a insegurança para empresas, que voltam a enfrentar custos inesperados e incertezas jurídicas.
Economistas lembram que, no auge da reforma, a redução das ações ajudou a reduzir o desemprego em até 1,7 ponto percentual. Agora, há receio de que o efeito contrário volte a pesar no mercado de trabalho.
Debate sobre ativismo judicial e proteção ao trabalhador
A reversão das barreiras criadas em 2017 reacendeu o debate sobre o papel da Justiça do Trabalho. Críticos falam em “ativismo judicial” e “paternalismo”, que enfraquecem o texto aprovado pelo Congresso e reforçam uma visão de que as relações trabalhistas ainda são marcadas por conflito.
Para o professor Paulo Renato Fernandes, da FGV, “relações de trabalho não podem ser de luta de classes. Sem empresa, não há emprego”.
Por outro lado, defensores das mudanças afirmam que a justiça gratuita é um direito constitucional e que as restrições da reforma de 2017 limitaram o acesso de muitos trabalhadores à Justiça.
Para eles, o aumento de ações reflete demandas reprimidas e não pode ser interpretado apenas como litigância excessiva.
O que esperar para 2025
O julgamento no STF sobre a validade da autodeclaração de hipossuficiência segue pendente após pedido de vista do ministro Gilmar Mendes.
O resultado pode redefinir os critérios de gratuidade e impactar diretamente o volume de processos nos próximos anos.
Enquanto isso, o crescimento acelerado dos processos trabalhistas em 2025 já indica uma mudança estrutural.
O país volta a se aproximar dos patamares pré-reforma, colocando em xeque o equilíbrio entre proteção ao trabalhador e segurança jurídica para empresas.
E você, acredita que o aumento dos processos trabalhistas representa um avanço no acesso à Justiça ou uma ameaça à segurança jurídica das empresas?
Deixe sua opinião nos comentários queremos ouvir a sua experiência sobre esse tema que impacta milhões de brasileiros.