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Níquel brasileiro vai parar nas mãos da China, e EUA pedem que Trump reaja para evitar avanço sobre monopólio global do mineral

Escrito por Alisson Ficher
Publicado em 27/08/2025 às 16:21
EUA pressionam Trump contra compra chinesa do níquel brasileiro da Anglo American, em disputa estratégica por suprimento global.v
EUA pressionam Trump contra compra chinesa do níquel brasileiro da Anglo American, em disputa estratégica por suprimento global.
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Disputa internacional pelo níquel brasileiro coloca Brasil, China e Estados Unidos no centro de um embate estratégico que envolve aço inoxidável, baterias de veículos elétricos e o controle de cadeias globais de suprimento.

O principal lobby do aço dos Estados Unidos pediu ao governo Donald Trump que atue para evitar que a MMG Limited, controlada pelo conglomerado estatal chinês China Minmetals, conclua a compra do negócio de níquel da Anglo American no Brasil.

Na semana passada, o American Iron and Steel Institute (AISI) enviou ofício ao Representante de Comércio dos EUA solicitando que o tema seja levado ao governo brasileiro.

Segundo matéria publicada nesta quarta-feira (27) pelo jornal Folha de S. Paulo, o argumento foi de que a transação ampliaria o controle da China sobre cadeias globais de suprimento do mineral.

Pedido formal ao governo Trump

No documento, assinado por Kevin M. Dempsey, o AISI afirma que a aquisição “é esperada para o 3º trimestre deste ano” e que, se efetivada, daria a Pequim influência direta sobre parte relevante das reservas brasileiras, somando-se à sua posição dominante na Indonésia.

O instituto solicita que Washington “leve essas preocupações ao governo do Brasil” e defende que o país preserve a propriedade orientada pelo mercado desses ativos e garanta acesso aberto e justo ao níquel no futuro, segundo a Folha de S. Paulo.

Ainda de acordo com a entidade, 65% da demanda global de níquel está vinculada ao aço inoxidável, o que torna o insumo estratégico para a siderurgia norte-americana.

O AISI diz que reservas estão concentradas em poucos países e reforça que, com a soma de Brasil e Indonésia, os recursos do mineral chegam a quase metade do total mundial, cenário que ampliaria vulnerabilidades de suprimento, conforme noticiado pela Folha de S. Paulo.

O que está em jogo no Brasil

A transação envolve as operações da Anglo American no país, com produção anual próxima de 40 mil toneladas de níquel em ferroníquel.

O pacote inclui duas unidades industriais em GoiásBarro Alto e Codemin (Niquelândia) — e projetos de crescimento como Jacaré e Morro Sem Boné.

O acordo anunciado em 18 de fevereiro de 2025 prevê até US$ 500 milhões em pagamento, sendo US$ 350 milhões à vista e parcelas condicionais adicionais.

A conclusão é esperada para o 3º trimestre de 2025, sujeita a aprovações regulatórias.

A compradora, MMG Limited, tem sede em Melbourne e Hong Kong e é controlada pela China Minmetals, por meio da Minmetals HK, que detém cerca de 67,5% do capital. A China Minmetals é uma estatal supervisionada pela SASAC, órgão do Conselho de Estado chinês.

Por que a China preocupa o setor

O receio exposto pela indústria norte-americana se ancora em dois movimentos paralelos.

De um lado, investimentos chineses na Indonésia ampliaram a produção local e consolidaram o país como o maior produtor e detentor das maiores reservas de níquel do mundo.

De outro, a aquisição de ativos no Brasil aumentaria a exposição da China a outra frente relevante de recursos.

Dados públicos indicam que as reservas globais se concentram em Indonésia, Austrália e Brasil, com participação combinada de Indonésia e Brasil próxima a 54% do total.

Regras brasileiras: o que muda (e o que não muda)

No Brasil, jazidas e recursos minerais pertencem à União, e a exploração ocorre por autorização ou concessão.

A transferência de direitos minerais depende de anuência prévia do poder público.

Em operações como a venda da Anglo para a MMG, portanto, muda o titular da concessão — não a propriedade do minério em si.

Esse arranjo constitucional preserva a capacidade do Estado de impor condições e fiscalizar o uso do recurso.

Relações comerciais e pano de fundo geopolítico

O envio do ofício ocorreu dentro da consulta pública aberta pelo USTR em investigação Seção 301 sobre atos e políticas do Brasil em temas como comércio digital, meios de pagamento, tarifas e etanol.

O processo foi instaurado em 15 de julho de 2025 e aceita manifestações de partes interessadas, como o AISI.

O governo brasileiro já apresentou contestação, defendendo a legalidade de suas práticas e questionando a via escolhida por Washington.

Paralelamente, Anglo American vem ajustando seu portfólio global desde 2024.

Ao mesmo tempo em que decidiu sair do níquel, a mineradora firmou memorandos de entendimento na China para desenvolver o mercado de polihalita com Sinochem Fertilizer e BeiFeng AMP, com foco em pesquisas em culturas como milho, soja, batata, cítricos e maçã.

Os acordos ilustram a expansão de relações comerciais da empresa no mercado chinês, embora sem relação direta com a venda no Brasil.

Impacto potencial para a cadeia do aço inox

A preocupação dos produtores de inox dos EUA é que uma maior concentração de oferta primária sob influência chinesa possa afetar preços, condições comerciais e previsibilidade de fornecimento.

O AISI sustenta que subsídios estatais e restrições à exportação adotados por Pequim em minerais críticos já provocaram distorções nas cadeias globais, e que o níquel não deveria repetir o padrão visto em outros insumos estratégicos.

O instituto, por isso, pede que Washington atue preventivamente nesse caso brasileiro.

Próximos passos e sinais que merecem atenção

Até o momento, não há resposta oficial pública da Casa Branca ou do USTR especificamente ao pedido do AISI sobre o níquel.

O desfecho depende tanto da tramitação regulatória da compra — no Brasil e em outras jurisdições — quanto da evolução da investigação Seção 301 sobre o Brasil.

A efetivação do negócio pela MMG continua projetada para o 3º trimestre de 2025, condicionada às aprovações usuais.

Diante desse quadro, o debate central passa por equilíbrio entre segurança de suprimento, regras de mercado e soberania sobre recursos naturais.

Caberá ao Brasil arbitrar a transferência dos títulos minerários dentro de seus marcos legais e, ao mesmo tempo, aos Estados Unidos definir se e como reagirão ao avanço de empresas sob controle estatal chinês em ativos críticos no hemisfério.

Em última análise, que condições o Brasil e os EUA considerarão necessárias para garantir previsibilidade no fornecimento sem fechar portas a investimento produtivo?

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Alisson Ficher

Jornalista formado desde 2017 e atuante na área desde 2015, com seis anos de experiência em revista impressa, passagens por canais de TV aberta e mais de 12 mil publicações online. Especialista em política, empregos, economia, cursos, entre outros temas. Registro profissional: 0087134/SP. Se você tiver alguma dúvida, quiser reportar um erro ou sugerir uma pauta sobre os temas tratados no site, entre em contato pelo e-mail: alisson.hficher@outlook.com. Não aceitamos currículos!

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