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Motorista de Uber é CLT? Tribunal brasileiro obriga Uber a registrar trabalhador com salário de R$ 4,5 mil

Escrito por Alisson Ficher
Publicado em 21/07/2025 às 17:00
TRT-4 obriga Uber a registrar motorista com salário de R$ 4,5 mil e pagar direitos trabalhistas entre 2019 e 2023.
TRT-4 obriga Uber a registrar motorista com salário de R$ 4,5 mil e pagar direitos trabalhistas entre 2019 e 2023.
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Decisão inédita do TRT-4 reconhece vínculo empregatício entre motorista e Uber, estabelecendo salário e direitos trabalhistas para período de mais de quatro anos.

Uma decisão recente da 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4) determinou que a Uber registre em carteira de trabalho (CTPS) um de seus motoristas como empregado, com salário fixado em R$ 4,5 mil.

Segundo informações do portal Migalhas, o julgamento, realizado de forma unânime, reconheceu o vínculo empregatício entre o motorista de aplicativo e a empresa, estabelecendo um valor provisório de condenação de R$ 100 mil.

O caso envolveu um trabalhador que atuou entre abril de 2019 e setembro de 2023, reivindicando direitos trabalhistas clássicos como férias, 13º salário, FGTS e aviso prévio.

A decisão ganha relevância nacional diante do cenário de incertezas jurídicas sobre a relação entre plataformas digitais e trabalhadores no Brasil.

No processo, o motorista argumentou que estavam presentes todos os elementos legais que caracterizam uma relação de emprego segundo a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT): onerosidade (pagamento pelo serviço), pessoalidade (impossibilidade de substituição por terceiros), subordinação (controle exercido pela plataforma) e habitualidade (atividade exercida com frequência e regularidade).

Segundo o trabalhador, a plataforma Uber controlava aspectos centrais do trabalho, como aceitação de corridas e eventual aplicação de sanções em caso de recusas.

Ele relatou que a recusa em atender chamadas de passageiros gerava advertências e o risco de desativação do acesso ao aplicativo, fato que, segundo a argumentação, equivaleria a uma demissão.

Outro ponto destacado foi a ausência de autonomia plena, uma vez que a rotina era determinada pelas regras e algoritmos da plataforma.

Argumentos da Uber para afastar vínculo empregatício

Por outro lado, a Uber defendeu-se sustentando que não existe vínculo de emprego, mas sim uma relação comercial de parceria, na qual o motorista atua como autônomo.

A empresa alegou que o pagamento é feito diretamente pelos usuários do aplicativo e que o motorista tem liberdade para se conectar e desconectar quando desejar, além de poder escolher os horários de trabalho.

Em primeira instância, a Justiça do Trabalho acatou a tese da Uber, não reconhecendo a relação empregatícia.

Decisão do TRT-4 reconhece vínculo e direitos trabalhistas

Entretanto, ao recorrer ao TRT-4, o motorista obteve decisão favorável.

O relator, desembargador Clóvis Fernando Schuch Santos, destacou que estavam presentes todos os requisitos da relação de emprego, especialmente a subordinação ao funcionamento do aplicativo.

Segundo o magistrado, a Uber controla a atividade do motorista, determina regras, monitora a rotina dos profissionais e remunera de acordo com o serviço prestado, evidenciando a existência de vínculo empregatício, mesmo diante de discussões pendentes no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Tribunal Superior do Trabalho (TST).

O acórdão determinou que a Uber registre a CTPS do motorista, garantindo todos os direitos previstos na legislação trabalhista, referentes ao período de atuação.

A remuneração de R$ 4,5 mil mensais foi definida como base, com a inclusão de férias proporcionais e vencidas, 13º salários, aviso prévio, depósitos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e liberação do seguro-desemprego.

Debate nacional sobre vínculo empregatício em aplicativos

O reconhecimento judicial do vínculo empregatício entre motoristas de aplicativos e empresas como a Uber vem sendo alvo de debates intensos no sistema judiciário brasileiro.

O tema ainda não está pacificado.

No STF, tramita o Recurso Extraordinário (RE) 1.446.336, apresentado pela própria Uber, contestando decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que reconheceu a relação de emprego entre a plataforma e uma motorista.

De acordo com dados apresentados pela empresa, mais de 10 mil processos semelhantes tramitam em diferentes instâncias do Judiciário.

O centro do debate é definir se a relação entre plataformas digitais e motoristas deve ser enquadrada como vínculo empregatício, segundo a CLT, ou se pode ser considerada um contrato civil/autônomo, baseado em prestação de serviços e parceria comercial.

O Supremo Tribunal Federal já firmou entendimento reconhecendo a licitude de outros formatos de trabalho além da CLT, o que gerou certa divergência com a Justiça do Trabalho.

Enquanto esta, em geral, adota posição mais restritiva e reconhece a chamada “pejotização” como irregular, o STF tem defendido maior liberdade contratual e a terceirização inclusive em atividades-fim.

Impactos do reconhecimento do vínculo trabalhista

Com a decisão do TRT-4, a Uber terá de cumprir obrigações trabalhistas típicas de empregadores brasileiros, como registro formal, pagamento de encargos e benefícios.

Para o trabalhador, isso significa acesso a direitos como:

  • férias remuneradas
  • 13º salário
  • FGTS
  • seguro-desemprego
  • aviso prévio

No entanto, a empresa ainda pode recorrer, e o tema aguarda posicionamento definitivo do STF.

Além dos aspectos jurídicos, o impacto social e econômico dessas decisões é expressivo.

Especialistas alertam para possíveis mudanças no modelo de negócios das plataformas digitais no Brasil.

O reconhecimento do vínculo pode encarecer a operação dessas empresas, alterar a dinâmica do mercado de trabalho e influenciar outros setores que também adotam a lógica de aplicativos e prestação de serviços sob demanda.

Jurisprudência internacional e comparações com o Brasil

Em outros países, decisões semelhantes já vêm sendo discutidas.

No Reino Unido, por exemplo, a Suprema Corte decidiu em 2021 que motoristas de aplicativo deveriam ser considerados “trabalhadores” (workers) e, portanto, ter acesso a uma série de direitos trabalhistas.

Na Espanha, legislação específica reconheceu motoristas de aplicativos como empregados formais das plataformas.

O Brasil, no entanto, ainda busca uma resposta definitiva, enquanto a categoria segue judicializando a questão.

Diferenças entre CLT, contrato autônomo e parceria comercial

A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) estabelece direitos e deveres típicos da relação de emprego, como salário fixo, jornada controlada e benefícios obrigatórios.

No contrato autônomo, o trabalhador presta serviço sem subordinação, com liberdade para definir como, quando e onde irá atuar, sem garantias de estabilidade.

A parceria comercial, modelo defendido pelas plataformas, transfere ao trabalhador os riscos e a autonomia do negócio, retirando obrigações trabalhistas da empresa.

Você concorda com o reconhecimento do vínculo empregatício entre motoristas de aplicativos e plataformas como a Uber?

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Alisson Ficher

Jornalista formado desde 2017 e atuante na área desde 2015, com seis anos de experiência em revista impressa, passagens por canais de TV aberta e mais de 12 mil publicações online. Especialista em política, empregos, economia, cursos, entre outros temas. Registro profissional: 0087134/SP. Se você tiver alguma dúvida, quiser reportar um erro ou sugerir uma pauta sobre os temas tratados no site, entre em contato pelo e-mail: alisson.hficher@outlook.com. Não aceitamos currículos!

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