Brasil discute criar habilitação específica para motos acima de 300 cilindradas; proposta quer exigir curso e teste diferenciados para reduzir acidentes e adequar o Código de Trânsito.
O avanço das motocicletas de alta cilindrada no Brasil reacendeu uma discussão que há anos circula entre especialistas em trânsito, montadoras e o poder público: deve existir uma habilitação específica para quem pilota motos potentes? Essa é a base do Projeto de Lei 1745/2025, que tramita na Câmara dos Deputados e propõe novas exigências para condutores de motocicletas com mais de 300 cilindradas. O texto pretende criar uma categoria especial na Carteira Nacional de Habilitação (CNH), com cursos e testes diferenciados para esse tipo de veículo, ampliando o controle sobre o segmento de motos esportivas e de grande porte.
A iniciativa surge em um momento de alta expressiva na frota nacional de motocicletas. Segundo o Denatran, o Brasil ultrapassou em 2024 a marca de 33 milhões de motos em circulação, das quais cerca de 12% possuem motores acima de 300 cilindradas. Esses modelos, conhecidos pelo desempenho e aceleração, respondem também por um número crescente de acidentes fatais em rodovias e perímetros urbanos. A proposta legislativa busca reduzir o índice de sinistros envolvendo motociclistas experientes, mas sem treinamento específico para conduzir máquinas que podem ultrapassar 200 km/h em poucos segundos.
O que propõe o texto do PL
O PL 1745/2025 altera dispositivos do Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/1997) e propõe que a atual categoria “A” da CNH, válida para condução de qualquer motocicleta — seja dividida em subcategorias de acordo com a potência e o peso do veículo.
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Na prática, o piloto precisaria obter uma habilitação adicional para conduzir motos acima de 300 cilindradas, semelhante ao modelo já adotado em países da União Europeia, como Alemanha e Espanha.
A proposta também prevê que os cursos de formação incluam módulos de pilotagem defensiva para alta velocidade, frenagem de emergência, controle de torque e gestão de estabilidade. Esses treinamentos seriam realizados em autódromos ou pistas homologadas e supervisionados por instrutores credenciados pelo Denatran. O objetivo é preparar o condutor para situações de risco específicas de motocicletas de grande porte, que exigem domínio técnico superior e reflexos calibrados.
Motivos e estatísticas que motivam a proposta
O crescimento dos acidentes com motos de alta cilindrada é um dos pilares do debate. Dados da Confederação Nacional de Transportes (CNT) indicam que, entre 2020 e 2024, o número de ocorrências fatais envolvendo motocicletas acima de 300 cc aumentou 27%, enquanto os registros com modelos de baixa cilindrada cresceram apenas 5%.
Esses veículos também se destacam pela energia cinética envolvida em colisões: uma moto de 600 cilindradas, a 120 km/h, tem três vezes mais energia de impacto que um modelo de 150 cc na mesma velocidade. Especialistas afirmam que a falta de preparo técnico agrava o risco em situações de frenagem brusca, curvas fechadas e uso em vias urbanas.
Além da segurança, o projeto considera a evolução tecnológica das motocicletas. Modelos recentes trazem sistemas de aceleração eletrônica, controle de tração, modos de pilotagem e freios ABS de múltiplos estágios, exigindo conhecimento sobre recursos que vão além do treinamento padrão das autoescolas.
Segundo o autor da proposta, o deputado Henrique Vieira (PSB-RJ), “a CNH atual não distingue um scooter de 125 cc de uma superesportiva de 1.000 cc, o que é uma lacuna evidente em termos de segurança pública”.
Debate entre especialistas e o setor automotivo
A discussão divide opiniões entre motociclistas e especialistas. Entidades de segurança viária apoiam a criação de uma categoria específica, destacando que a formação atual é insuficiente para lidar com o comportamento dinâmico de motos potentes. Já representantes do setor automotivo e grupos de motociclistas temem que a nova exigência desestimule o mercado e aumente os custos para os condutores.
Para a Associação Brasileira dos Fabricantes de Motocicletas (Abraciclo), o país ainda precisa avançar primeiro na fiscalização e manutenção das vias, que continuam sendo fatores determinantes nos acidentes. A entidade reconhece, porém, que programas de capacitação diferenciada podem reduzir sinistros em rodovias e melhorar o perfil técnico do piloto brasileiro.
O professor Rafael Campos, especialista em segurança viária da Universidade de Brasília (UnB), avalia que a criação de uma habilitação especial é coerente com padrões internacionais:
“Nos países europeus, há progressão de categoria conforme a potência. Isso evita que um novo condutor pule de um modelo urbano para uma motocicleta de 1.200 cilindradas sem o preparo necessário. O Brasil ainda trata todos como iguais, o que gera uma falsa sensação de domínio sobre o veículo.”
Tramitação e próximos passos
O projeto segue em tramitação na Comissão de Viação e Transportes (CVT) e, posteriormente, será analisado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Por alterar o Código de Trânsito, deverá passar também pelo Plenário da Câmara e, se aprovado, seguirá para o Senado.
O texto ainda não tem prazo definido para votação, mas já desperta apoio entre parlamentares da Frente Parlamentar de Trânsito Seguro.
Se aprovado, o Conselho Nacional de Trânsito (Contran) terá prazo de até 180 dias para regulamentar as novas exigências, definir o conteúdo programático dos cursos e as faixas de cilindrada que exigirão habilitação específica.
Durante o período de adaptação, pilotos com CNH válida poderão continuar conduzindo normalmente, mas precisarão se adequar caso optem por adquirir modelos mais potentes.
Impactos esperados e desafios
A medida pode alterar profundamente a estrutura das autoescolas e dos centros de formação de condutores. Será necessário criar infraestrutura para aulas práticas em motos de alta cilindrada, o que hoje é raro fora de centros urbanos. Além disso, o custo de habilitação tende a aumentar, já que a etapa extra incluirá locação de motocicletas, seguro e treinamento supervisionado.
Por outro lado, autoridades acreditam que a mudança trará redução significativa nas taxas de mortalidade de motociclistas, que atualmente representam 35% das mortes no trânsito brasileiro, segundo o DataSUS.
O Brasil tem uma das maiores proporções de óbitos de motociclistas do mundo — e as motos potentes, embora minoritárias na frota, estão associadas a acidentes de maior gravidade.
SENATRAN e Governo federal se unem
O governo federal, por meio da Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran), acompanha o debate e já estuda revisar as diretrizes de formação de condutores para adequar o país a padrões internacionais. A ideia é que a CNH reflita o tipo de veículo pilotado, garantindo que quem conduz modelos mais fortes receba treinamento compatível com o nível de risco.
A possível criação de uma habilitação exclusiva para motocicletas de alta potência reacende a discussão sobre o equilíbrio entre liberdade e segurança no trânsito brasileiro.
O país vive uma expansão do mercado de motos esportivas e touring, mas também enfrenta índices alarmantes de mortalidade entre condutores. Se a proposta avançar, o Brasil dará um passo semelhante ao da Europa, que há anos diferencia o motociclista amador do condutor técnico e isso pode redefinir o futuro da pilotagem no país.



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