Encontro com ganhadores do Nobel e especialistas nucleares expõe temor de que a inteligência artificial assuma decisões sobre o arsenal atômico mundial.
No mês passado, ganhadores do Prêmio Nobel se reuniram com especialistas nucleares para discutir inteligência artificial e riscos globais. A pauta central foi o potencial da IA assumir o controle de arsenais nucleares.
A reunião, relatada pela Wired, mostrou um consenso preocupante: para muitos, é apenas questão de tempo até que uma IA obtenha acesso a códigos nucleares. A sensação de inevitabilidade e ansiedade marcou os relatos.
O major-general aposentado da Força Aérea dos EUA, Bob Latiff, membro do Conselho de Ciência e Segurança do Boletim dos Cientistas Atômicos, comparou a IA à eletricidade. Segundo ele, essa tecnologia tende a se infiltrar em todas as áreas.
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Riscos e possíveis cenários
Já foi demonstrado que sistemas de IA exibem comportamentos obscuros, como recorrer à chantagem contra usuários quando ameaçados de desligamento.
No contexto de segurança nuclear, esses riscos crescem exponencialmente. Há, inclusive, a preocupação de uma IA super-humana se rebelar e usar armas nucleares contra a própria humanidade, cenário semelhante ao enredo do filme O Exterminador do Futuro.
No início do ano, o ex-CEO do Google, Eric Schmidt, alertou que uma IA de nível humano pode deixar de ter incentivo para “nos ouvir”.
Para ele, as pessoas não compreendem as consequências de uma inteligência nesse patamar. Apesar disso, Schmidt e outros reconhecem que, atualmente, as IAs ainda sofrem com erros e “alucinações” que comprometem sua utilidade.
Ameaça cibernética
Outro risco apontado é o de falhas na tecnologia deixarem brechas na segurança digital.
Essas vulnerabilidades podem permitir que adversários humanos ou até outras IAs acessem sistemas de controle de armas nucleares. Nesse cenário, não é necessário um sistema superinteligente para criar uma ameaça real.
Jon Wolfsthal, diretor de risco global da Federação de Cientistas Americanos, destacou que nem mesmo os especialistas têm uma definição clara sobre o que é IA.
Apesar disso, houve acordo em um ponto central: é preciso garantir controle humano efetivo sobre qualquer decisão envolvendo armas nucleares. Latiff reforçou que deve haver uma pessoa claramente responsável por essas escolhas.
Pressão política e avanços militares
Durante o governo Donald Trump, houve empenho em expandir o uso da IA em todos os domínios possíveis, mesmo diante de alertas de especialistas sobre os riscos e limitações atuais.
Neste ano, o Departamento de Energia chamou a IA de “próximo Projeto Manhattan”, em referência ao programa que criou as primeiras bombas atômicas na Segunda Guerra Mundial.
Em outro movimento significativo, a OpenAI, criadora do ChatGPT, fechou acordo com os Laboratórios Nacionais dos EUA para usar IA no fortalecimento da segurança de armas nucleares.
A parceria chamou atenção por aproximar uma das maiores empresas de IA do mundo do núcleo estratégico de defesa dos Estados Unidos.
Visão do comando militar
O general da Força Aérea Anthony Cotton, responsável pelo estoque de mísseis nucleares dos EUA, declarou no ano passado que o Pentágono está ampliando o uso da IA para melhorar a tomada de decisão. Ele vê na tecnologia um reforço para operações estratégicas.
No entanto, Cotton foi claro ao afirmar que a decisão final sobre armas nucleares deve permanecer com humanos.
“Mas nunca devemos permitir que a inteligência artificial tome essas decisões por nós”, disse o general, reforçando a necessidade de limites claros para o uso dessa tecnologia no setor militar.
O mais importante, segundo especialistas, é que a discussão não se limite à teoria.
Com o avanço rápido da tecnologia e o interesse militar crescente, cresce também a urgência de estabelecer regras e barreiras para evitar que a IA ganhe poder decisório sobre o arsenal nuclear. Para eles, o risco é real e pode se tornar inevitável se não houver ação imediata.