Projeto da EF-118 prevê 245 quilômetros entre Espírito Santo e Rio de Janeiro, com ligação direta ao Porto do Açu e investimento estimado em R$ 6,12 bilhões, mesmo após o fracasso das negociações entre governo federal e Vale.
O governo federal decidiu manter o cronograma da Estrada de Ferro 118 (EF-118), entre Espírito Santo e Rio de Janeiro, mesmo sem os cerca de R$ 2 bilhões que pretendia obter com a repactuação contratual da Vale.
A primeira etapa, de 245 quilômetros entre Santa Leopoldina (ES) e São João da Barra (RJ), onde fica o Porto do Açu, teve projeto técnico enviado à ANTT e deve seguir para análise do TCU em outubro de 2025, com oferta ao mercado prevista para o primeiro semestre de 2026.
O pacote desse trecho soma R$ 6,12 bilhões em investimentos e inclui aporte público estimado em R$ 1,82 bilhão para viabilizar a concessão, segundo apuração divulgada pelo setor.
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Impasse com a Vale e impacto no financiamento
As negociações para rever os contratos da EF Vitória-Minas (EFVM) e da Estrada de Ferro Carajás (EFC), renovados antecipadamente em 2020, foram encerradas sem acordo em 28 de agosto de 2025.
A União informou que, diante da falta de consenso, adotará medidas administrativas e judiciais para buscar a “precificação justa” dos ativos, movimento que reduz a probabilidade de a Vale aportar recursos na EF-118 como se pretendia.
Sem o dinheiro da mineradora, o Ministério dos Transportes sustenta que há outras fontes para fechar a conta do trecho inicial, mantendo o plano de licitar o ativo após a validação dos órgãos de controle.
A avaliação é que a modelagem poderá se apoiar em aporte público para fechar a equação econômico-financeira e destravar a obra, como já admitido pelo governo em audiências públicas sobre a EF-118.
O que vai a leilão e como é o traçado
O escopo que avança prioriza a ligação direta da malha da Vitória-Minas à área do Porto do Açu, criando um corredor dedicado para cargas de minério, siderurgia, celulose e granéis.
A etapa de 245 km conecta Santa Leopoldina, ponto terminal do projeto no Espírito Santo, a São João da Barra, no norte fluminense, ampliando a competitividade do Açu e aliviando gargalos rodoviários da BR-101.
A estimativa é de R$ 6,12 bilhões em capex e R$ 1,82 bilhão em aporte público de viabilidade, valores já informados ao mercado ao lado do calendário regulatório.
Paralelamente, o desenho amplo da EF-118 — também chamada de Anel Ferroviário do Sudeste — prevê um eixo total de cerca de 575 km, construído do zero entre Nova Iguaçu (RJ) e Santa Leopoldina (ES).
Esse traçado prevê conexões aos sistemas MRS e EFVM e acesso a portos estratégicos, como Ubu (Anchieta), Porto Central (Presidente Kennedy) e o próprio Açu.
Calendário regulatório e janela de mercado
O envio ao TCU é o passo final antes do edital.
A sinalização atual é de que a documentação chegue ao tribunal em outubro de 2025, abrindo espaço para a publicação do edital e a disputa no 1º semestre de 2026, se não houver exigência de ajustes relevantes.
Em paralelo, declarações recentes do Ministério dos Transportes projetam leilões ferroviários até o fim de 2026, com a EF-118 entre as prioridades, o que reforça o objetivo de preservar a janela de investimento do setor.
Modelo econômico e participação da União
O governo vem defendendo um modelo com participação direta da União para equilibrar risco e retorno, sobretudo em trechos greenfield.
Na EF-118, a diretriz é combinar investimento privado com aporte público de forma escalonada, concentrado nos primeiros anos do contrato, para acelerar a implantação e induzir ganhos de escala no escoamento via Açu.
Essa lógica já foi apresentada em audiências e materiais oficiais desde o início de 2025.
Ainda que haja divergências sobre o tamanho exato da primeira fase em diferentes comunicados ao longo do ano — com menções a configurações alternativas, como um “trecho central” reduzido —, a orientação atual nas tratativas com o mercado aponta para o recorte Santa Leopoldina–São João da Barra com 245 km.
Ajustes poderão ocorrer no TCU, etapa em que se refinam estudos de demanda, engenharia e matriz de riscos.
Por que a EF-118 é estratégica
Ao integrar malhas e oferecer acesso ferroviário direto a terminais portuários, a EF-118 pretende reduzir custos logísticos, ampliar a previsibilidade de prazos e diversificar rotas de exportação.
O Porto do Açu, polo de energia e indústria no norte fluminense, vem recebendo investimentos e tem capacidade para absorver aumento significativo de carga, o que cria sinergia com a nova ferrovia.
Essa combinação é vista por governos estaduais e pela iniciativa privada como um vetor para atrair novos projetos produtivos no corredor ES–RJ.
O que observar nos próximos meses
A atenção se volta, primeiro, à análise do TCU.
Em seguida, ao detalhamento do edital, que trará metas de desempenho, regras de acesso e cronograma de aportes públicos.
Por fim, ao apetite de investidores em meio ao cenário macro: a presença de operadores ferroviários e fundos de infraestrutura será determinante para a competição e para o custo de capital do projeto.
Com a disputa por recursos mais acirrada e a ausência do aporte da Vale, que fatores devem pesar mais na decisão do investidor para disputar o trecho inicial da EF-118: o desenho do aporte público, o risco de demanda ou a integração logística com o Porto do Açu?