Projeto ferroviário bilionário entre Brasil e China volta à pauta em 2025 após anos de incertezas políticas e geopolíticas, prometendo transformar a logística e a integração sul-americana.
Um projeto ferroviário de proporções inéditas na América do Sul volta ao centro das atenções em 2025, após quase uma década de interrupção.
Trata-se da ferrovia transcontinental Atlântico-Pacífico, planejada para conectar o litoral brasileiro ao Oceano Pacífico, impulsionando a logística, a economia e as relações internacionais do Brasil.
O empreendimento, que esteve paralisado desde o impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff em 2016, ressurgiu com novo fôlego e investimentos bilionários, marcando uma nova fase na integração entre Brasil e China.
-
Por que uma ferrovia de R$ 15 bilhões ainda está inacabada após quase 20 anos e ameaça escoamento agrícola no Nordeste?
-
De “ferrovia fantasma” a salvação do agro? A saga da obra de R$ 5,4 bilhões que agora enfrenta uma nova crise
-
URBOS 100, 7 vagões e 400 passageiros: trens que vão transformar o transporte em Salvador já estão quase prontos
-
VLI apresenta plano de R$ 24 bi e avança na disputa para manter Ferrovia Centro-Atlântica por mais 30 anos
Ferrovia Atlântico-Pacífico: acordo interrompido e retomada estratégica
O plano inicial, anunciado em maio de 2015, durante a visita do então primeiro-ministro da China, Li Keqiang, ao Brasil, previa a construção de uma ferrovia bioceânica ligando o Porto de Ilhéus, na Bahia, à costa do Peru, passando por importantes polos agrícolas do Centro-Oeste.
O acordo, formalizado no Palácio do Planalto, incluiu a assinatura de 30 parcerias entre os dois países, com destaque para o compromisso chinês de investir cerca de US$ 50 bilhões em infraestrutura brasileira, especialmente na logística ferroviária.
A expectativa era que a ferrovia Atlântico-Pacífico transformasse a dinâmica do transporte de cargas, escoando grãos, minérios e outros produtos do agronegócio brasileiro diretamente para o mercado asiático, reduzindo distâncias e custos logísticos.
Segundo estimativas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e da Empresa de Planejamento e Logística (EPL), a rota poderia encurtar em até 40% o percurso das exportações brasileiras rumo a destinos como Xangai, Tóquio e Busan, eliminando a necessidade de cruzar o Canal de Suez ou o estreito de Taiwan.
Contudo, a instabilidade política decorrente do processo de impeachment de Dilma Rousseff, concluído em agosto de 2016, mudou completamente o cenário.
Com a posse de Michel Temer, o projeto perdeu prioridade, e um decreto assinado em outubro daquele ano interrompeu os avanços da ferrovia bioceânica.
A medida suspendeu os acordos bilaterais firmados com a China e inviabilizou a captação de recursos internacionais para a obra, que chegou a ser apontada como estratégica para a competitividade brasileira.
Geopolítica e influência internacional no projeto ferroviário
O contexto geopolítico da época também influenciou diretamente o destino do projeto.
A crescente rivalidade entre Estados Unidos e China no cenário internacional contribuiu para o distanciamento do Brasil de grandes investimentos chineses em setores considerados sensíveis, como infraestrutura de transporte.
Documentos e análises de organismos internacionais sugerem que a postura norte-americana, aliada ao novo posicionamento do governo brasileiro, afastou o país de uma agenda de integração com a Ásia, especialmente via corredores bioceânicos.
Retomada da ferrovia bioceânica e investimento bilionário em 2025
A retomada do projeto em 2025 ocorre em um ambiente econômico e político distinto.
Após nove anos de indefinição, o governo federal reincorporou a ferrovia Atlântico-Pacífico ao Novo Programa de Aceleração do Crescimento (Novo PAC), com previsão de investimentos estimados em R$ 28,7 bilhões, segundo dados atualizados pelo Ministério dos Transportes em junho de 2025.
A expectativa é construir cerca de 2,7 mil quilômetros de trilhos entre a Bahia, Goiás e Mato Grosso, interligando áreas produtoras e facilitando o acesso aos portos do Peru.
O financiamento contará novamente com participação significativa de instituições chinesas, reforçando a parceria estratégica entre Brasil e China.
O projeto prevê que a linha ferroviária ligue o Porto de Ilhéus ao Porto de Chancay, no Peru, conectando diretamente o Atlântico ao Pacífico.
Estima-se que a ferrovia facilite o escoamento de commodities agrícolas e minerais de estados como Mato Grosso, Goiás, Rondônia, Acre e Bahia, regiões responsáveis por grande parte da produção de soja, milho, carne bovina e minérios exportados para a Ásia.
Logística, exportações e impacto no agronegócio brasileiro
Além do impacto sobre o comércio exterior, a nova ferrovia deve contribuir para a modernização da matriz de transportes brasileira, reduzindo a dependência do modal rodoviário e os custos com combustíveis fósseis.
A expectativa é de que a integração ferroviária estimule a geração de empregos, aumente a eficiência logística e atraia novos investimentos ao país, fortalecendo o Brasil como elo fundamental na rota comercial sino-sul-americana.
O estudo técnico do IPEA destaca que a implantação do corredor Atlântico-Pacífico pode resultar em uma economia de até 8 mil quilômetros no transporte de cargas para a China, dependendo do trajeto escolhido, o que representa ganhos logísticos e ambientais expressivos.
Para o agronegócio nacional, a possibilidade de acessar mercados asiáticos de forma mais ágil e competitiva tem potencial para aumentar receitas, consolidar parcerias e promover o desenvolvimento regional.
Integração regional e futuro do transporte de cargas
A decisão de reviver o projeto também abre caminho para uma maior integração sul-americana, aproximando o Brasil de países vizinhos como Peru e Bolívia, com os quais a infraestrutura ferroviária deverá se conectar ao longo dos próximos anos.
A expectativa de autoridades do setor é que a ferrovia bioceânica impulsione a diversificação de rotas e amplie a capacidade de exportação do país, consolidando o Brasil como protagonista no fluxo comercial do Atlântico ao Pacífico.
Com a reativação desse megaprojeto logístico, Brasil e China reafirmam seu compromisso de cooperação em grandes obras de infraestrutura, apesar dos desafios históricos enfrentados desde 2015.
A volta da ferrovia Atlântico-Pacífico ao centro da agenda governamental reflete o interesse crescente dos dois países em fortalecer seus laços econômicos e ampliar o intercâmbio comercial com a Ásia, especialmente diante das transformações globais em curso.
A retomada da ferrovia Atlântico-Pacífico conseguirá, enfim, transformar a logística brasileira e consolidar o Brasil como ponte estratégica entre a América do Sul e a Ásia?