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Exportações sufocadas: setor da madeira no Brasil entra em colapso sob pressão das tarifas dos Estados Unidos

Escrito por Noel Budeguer
Publicado em 07/08/2025 às 18:56
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Brasil perde competitividade no setor de madeira e enfrenta onda de suspensões: entenda o que está por trás da nova crise industrial

O conflito comercial entre Brasil e Estados Unidos, intensificado nos últimos meses por medidas protecionistas unilaterais, atingiu em cheio um dos setores mais tradicionais do país: a indústria da madeira. O aumento repentino das tarifas imposto pelo governo norte-americano gerou um efeito dominó em toda a cadeia produtiva, provocando cancelamento de pedidos, acúmulo de estoque, suspensão de turnos e, mais recentemente, paralisações em massa de trabalhadores.

O caso mais simbólico desse colapso foi divulgado em 22 de julho de 2025, quando a empresa BrasPine, uma das maiores exportadoras de madeira industrializada do Brasil, anunciou a concessão de férias coletivas para 1.500 funcionários, o que representa cerca de 60% de sua força de trabalho. A medida afetou as unidades de Jaguariaíva e Telêmaco Borba, no interior do Paraná, e escancarou o que já vinha sendo comentado nos bastidores: a indústria florestal brasileira está à beira de um colapso nas exportações.

Foto: Unidade da BrasPine, uma das maiores exportadoras de madeira industrializada do Brasil, localizada no interior do país. Fundada há 28 anos, a empresa emprega cerca de 2.500 pessoas e mantém operações estratégicas voltadas principalmente para o mercado externo

Tarifas proibitivas: a raiz da crise

O gatilho dessa crise foi o reajuste tarifário imposto por Washington, que elevou os impostos sobre produtos madeireiros brasileiros para até 50%, enquanto países como Canadá, Chile e Suécia seguem pagando entre 10% e 20% para acessar o mesmo mercado.

Essa disparidade tornou a madeira brasileira comercialmente inviável para seus principais parceiros, especialmente os Estados Unidos, que até este ano eram o principal destino das exportações do setor. As empresas começaram a ver seus pedidos sendo cancelados e suas margens de lucro evaporando de um dia para o outro.

“Estamos enfrentando uma perda total de competitividade. Mesmo com toda a eficiência e certificação ambiental que temos, já não conseguimos competir em condições de igualdade”, afirmou recentemente um representante do sindicato florestal do sul do Brasil em entrevistas à imprensa local.

O impacto social: mais do que números

A situação se torna ainda mais grave ao observar os efeitos diretos nas comunidades que dependem desse setor. Somente no Paraná, estima-se que o setor florestal empregue mais de 80 mil pessoas, muitas delas em cidades pequenas cuja economia gira em torno da indústria madeireira e do cultivo de pínus para corte. As suspensões como a da BrasPine, portanto, não são casos isolados, mas um sinal de alerta sobre o que pode se tornar uma crise nacional.

Em Jaguariaíva e Telêmaco Borba, municípios profundamente ligados à cadeia da madeira, o clima é de incerteza total. Comerciantes, transportadoras e fornecedores já sentem a redução da circulação de renda, e os governos municipais temem uma explosão do desemprego se não houver uma reação rápida das autoridades.

Produção sustentável, mas sem saída comercial

Paradoxalmente, o Brasil possui um dos sistemas florestais mais avançados do mundo. O país conta com mais de 9 milhões de hectares de florestas plantadas, principalmente de eucalipto e pínus, geridas sob normas rígidas de reflorestamento e rastreabilidade ambiental. Empresas como a BrasPine e outras do setor investiram milhões em certificações internacionais para garantir a sustentabilidade de sua produção.

No entanto, essa vantagem ambiental não tem sido suficiente para proteger o país no jogo geopolítico do comércio internacional. As medidas dos Estados Unidos respondem mais a interesses internos de proteção de sua própria indústria do que a critérios técnicos ou ambientais. Como resultado, o Brasil é penalizado por sua eficiência, sem acesso aos benefícios prometidos a quem segue boas práticas ambientais.

Brasil conta com mais de 9 milhões de hectares de florestas plantadas, principalmente de eucalipto e pínus, geridas sob normas rígidas de reflorestamento e rastreabilidade ambiental. Empresas como a BrasPine e outras do setor investiram milhões em certificações internacionais para garantir a sustentabilidade de sua produção

O silêncio do governo e o medo do efeito dominó

Até o momento, o governo brasileiro tem se mostrado reticente em fazer pronunciamentos firmes sobre o assunto. Embora tenham sido mencionadas tratativas diplomáticas, não há sinais concretos de que o Brasil esteja negociando de forma ativa a redução das tarifas ou aplicando medidas comerciais equivalentes. O Ministério das Relações Exteriores não emitiu nenhum comunicado oficial, e o Ministério da Indústria apenas reconheceu “preocupação” com os casos recentes no Paraná.

Para analistas do setor, esse vácuo institucional pode trazer consequências graves: “Se essa questão não for resolvida rapidamente, outras indústrias como a de papel, celulose ou móveis também podem começar a cortar operações. É um efeito dominó perigoso para o modelo industrial brasileiro”, explicou um especialista da Confederação Nacional da Indústria (CNI) em entrevista à revista Exame.

E agora?

O futuro do setor madeireiro no Brasil está nas mãos de decisões que vêm de fora do país. Enquanto os Estados Unidos não revisarem suas políticas tarifárias, as empresas brasileiras continuarão perdendo espaço e sendo forçadas a cortar custos — o que inclui suspensões, demissões e redução de investimentos.

O caso da BrasPine não é o problema em si: é o sintoma mais visível de uma crise que ameaça se espalhar com rapidez. Sem uma reação firme do Estado brasileiro, a maior floresta plantada do hemisfério sul corre o risco de se transformar em um gigante paralisado, sem mercado, sem estímulo e, pior, sem proteção.

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Noel Budeguer

Sou jornalista argentino, baseado no Rio de Janeiro, especializado em temas militares, tecnologia, energia e geopolítica. Busco traduzir assuntos complexos em conteúdos acessíveis, com rigor jornalístico e foco no impacto social e econômico.

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