A Agência Nacional do Petróleo (ANP) liberou 275 novos blocos de exploração de petróleo e gás natural, elevando para 451 o total de áreas disponíveis no país. Decisão provoca alerta sobre impactos ambientais e sociais às vésperas da COP30.
A poucos meses da COP30, a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) autorizou a inclusão de 275 novos blocos exploratórios e cinco áreas com acumulações marginais na nova rodada da Oferta Permanente de Concessão (OPC), conforme noticiado nesta quinta, 09. A decisão eleva para 451 o total de áreas disponíveis para exploração de petróleo e gás natural em território nacional.
A medida, embora considerada estratégica para a expansão da indústria petrolífera, despertou preocupação entre organizações socioambientais. O Instituto Internacional Arayara alertou para riscos ambientais, sociais e legais que podem comprometer comunidades tradicionais e áreas protegidas.
Instituições apontam irregularidades e possíveis violações de direitos
De acordo com um estudo técnico elaborado pela equipe de Geociências da Arayara, os novos blocos apresentam sobreposições diretas e indiretas com terras indígenas, territórios quilombolas, Unidades de Conservação (UCs) e assentamentos rurais. As áreas atingidas abrangem estados como Maranhão, Bahia, Minas Gerais, Rondônia e Roraima.
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O levantamento também indica potenciais violações à legislação socioambiental e ao direito de consulta prévia previsto na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) — tratado internacional do qual o Brasil é signatário.
O advogado e gerente jurídico da entidade, Lucas Kannoa, reforçou a gravidade da situação. “Mesmo as fases iniciais de pesquisa já causam impactos ambientais e aflição às comunidades expostas. É imprescindível respeitar os protocolos de consulta e os tratados internacionais assinados pelo País”, afirmou.
Blocos de petróleo ameaçam comunidades e áreas protegidas
Em Rondônia, o bloco PRC-T-54 incide diretamente sobre a Terra Indígena Cassupá e Salamãi, uma área de restrição já reconhecida por órgãos ambientais. Em Roraima, os blocos TCT-T-01 e TCT-T-02 estão localizados nas proximidades das Terras Indígenas Bom Jesus, Canauanim, Jabuti, São Marcos e Serra da Moça, ampliando o risco de conflitos e degradação ambiental.
No Maranhão, blocos como PN-T-29, PN-T-65, PN-T-84, PN-T-101 e PN-T-114 se sobrepõem a mais de 10 mil hectares de terras indígenas, incluindo as Caru, Rio Pindaré, Cana Brava/Guajajara e Bacurizinho. Já na Bahia e no Maranhão, outros blocos — entre eles TUC-T-176, PN-T-14, PN-T-32 e PN-T-49 — interceptam territórios quilombolas reconhecidos, como Tapera Melão, Juçaral/Santa Helena e Santo Antônio dos Pretos, totalizando 70 mil hectares sob risco direto.
Assentamentos rurais e unidades de conservação também estão na área de risco
O estudo da Arayara identificou ainda 361 assentamentos rurais afetados, onde vivem aproximadamente 31 mil famílias. Em 96 desses casos, as áreas ultrapassam o limite de 2.500 hectares definido pela Instrução Normativa nº 112/2021 do INCRA, o que exigiria autorização prévia do Congresso Nacional antes da exploração.
Além disso, blocos de exploração em Minas Gerais e Rondônia se sobrepõem a Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs) e Áreas de Proteção Ambiental (APAs). Essa sobreposição contraria normas em vigor, como a Portaria Interministerial nº 1/2022 e a Nota Técnica Conjunta nº 8/2024, que determinam a exclusão obrigatória de áreas protegidas e comunidades tradicionais das rodadas de oferta pública de petróleo.
Especialistas pedem mais transparência e revisão dos blocos ofertados
O gerente de geociências da Arayara, George Mendes, destacou que a decisão da ANP representa um retrocesso nas políticas de sustentabilidade. Segundo ele, “a expansão da fronteira fóssil avança sobre territórios legalmente protegidos e comunidades tradicionais, comprometendo o cumprimento das metas climáticas assumidas pelo Brasil”.
Para especialistas do setor, a aprovação de novos blocos de exploração de petróleo neste momento sensível — com a COP30 prestes a começar em Belém (PA) — reacende o debate sobre o equilíbrio entre desenvolvimento econômico e preservação ambiental. A pressão internacional por uma transição energética mais rápida e limpa contrasta com a ampliação das fronteiras fósseis dentro do território nacional.