A ministra Marina Silva reconhece desafios e contradições na transição energética brasileira e defende que parte dos lucros do petróleo seja direcionada ao investimento em fontes limpas, como energia solar, eólica e hidrogênio verde.
O debate sobre o papel do petróleo na transição energética voltou ao centro das discussões do governo. A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, reconheceu publicamente que o país vive “desafios e contradições” ao tentar conciliar o avanço econômico com a preservação ambiental. A fala surge após o aval do governo federal para que a Petrobras inicie a exploração na Margem Equatorial, região sensível da costa norte do Brasil.
Durante entrevista ao O Globo, Marina afirmou que o desenvolvimento do setor petrolífero não precisa, necessariamente, caminhar em direção oposta à agenda climática — desde que os lucros do petróleo sejam utilizados como instrumento de transição. Segundo ela, os recursos obtidos com a exploração devem ser aplicados em projetos de energia limpa, como hidrogênio verde, energia solar e energia eólica.
“Não basta querer sair da dependência dos combustíveis fósseis, temos que criar as bases para isso. É preciso usar parte do lucro do petróleo para investir na transição energética”, disse a ministra.
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Petrobras no centro de um impasse político e ambiental
As declarações de Marina expõem um dilema que divide o governo Lula. De um lado, está a necessidade de manter o crescimento econômico e a arrecadação garantida pelo setor petrolífero, ainda essencial para o país. De outro, a pressão — tanto interna quanto internacional — para que o Brasil adote uma postura mais coerente com a agenda de neutralidade climática, especialmente às vésperas da COP30, que ocorrerá em Belém, em 2025.
Para Marina Silva, o movimento da Petrobras deve ser entendido como parte de um processo de “transição justa”, e não como um retrocesso ambiental. A ministra reforça que a companhia precisa reformular seu papel e se preparar para um futuro em que os combustíveis fósseis terão relevância reduzida.
“O presidente tem dito que a Petrobras precisa deixar de ser uma empresa de exploração de petróleo e se transformar urgentemente numa empresa de produção de energia”, destacou Marina.
Margem Equatorial: esperança econômica e alerta ambiental
A Margem Equatorial, localizada entre o Amapá e o Rio Grande do Norte, tem sido apontada por especialistas e pelo mercado como o “novo pré-sal”, com potencial de tornar o Brasil um dos maiores produtores de petróleo do mundo. Contudo, ambientalistas alertam para os riscos dessa exploração em uma área de alta biodiversidade marinha e com ecossistemas costeiros interligados à Amazônia.
Marina reconhece essas preocupações, mas rejeita a ideia de uma ruptura abrupta com os combustíveis fósseis. Para ela, a transição energética deve ser planejada de forma gradual e responsável.
“Não é possível abandonar combustíveis fósseis por decreto, porque haveria um colapso energético global”, afirmou. “O Brasil é o país com maior vantagem comparativa, por já ter matriz energética 45% limpa e matriz elétrica 90% limpa.”
A declaração reforça o argumento de que o país pode liderar a transição energética global se souber utilizar o petróleo como alavanca para financiar tecnologias limpas.
Entre o pragmatismo econômico e a coerência climática
A posição da ministra evidencia um ponto de equilíbrio entre pragmatismo econômico e coerência ambiental. Essa linha tênue reflete também a estratégia do presidente Lula, que tenta projetar o Brasil como referência internacional em sustentabilidade sem abrir mão do potencial econômico do petróleo.
Dentro do próprio governo, o tema divide opiniões. A equipe econômica e o setor de energia defendem a aceleração da exploração na Margem Equatorial, enquanto o Ministério do Meio Ambiente e organizações da sociedade civil pedem cautela e transparência nas decisões. O desafio é equilibrar a urgência por receitas com o compromisso climático assumido nos fóruns internacionais.
Pressões aumentam às vésperas da COP30
As falas de Marina ocorreram em Belém, cidade que sediará a COP30, conferência do clima que colocará o Brasil no foco do debate global sobre emissões de carbono e uso de combustíveis fósseis. O contexto político adiciona complexidade à questão, especialmente após o Senado aprovar a ampliação de subsídios ao carvão mineral — uma decisão criticada pela ministra.
“Foi um sinal na contramão dos esforços que precisam ser feitos. É um absurdo que algo com essa complexidade seja votado em seis minutos, às vésperas da realização do maior evento para o enfrentamento da mudança do clima”, declarou.
As críticas refletem a dificuldade do governo em alinhar discurso e prática diante das pressões econômicas e das demandas ambientais globais.
Por trás das declarações, Marina reforça a importância de transformar o modelo energético brasileiro e utilizar o lucro obtido com o petróleo como ponte para o futuro. Essa estratégia, contudo, exige vontade política, planejamento e clareza sobre a destinação dos recursos.
A ministra defende um discurso de “realismo climático”, no qual as contradições fazem parte do processo de mudança, mas não impedem o avanço rumo a uma economia mais limpa.
“Quem quiser sair da dependência dos fósseis tem que criar as condições para isso. O Brasil está disposto a fazer isso pela justiça climática”, concluiu.


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