A batalha entre os aplicativos Rappi, Keeta e 99Food chegou ao Cade e acende o debate sobre o novo monopólio no delivery, após denúncias de cláusulas de exclusividade com restaurantes, possíveis restrições contratuais e risco de concentração que ameaça a concorrência e a entrada de novos players no mercado brasileiro
A disputa entre as gigantes do delivery Rappi, Keeta e 99Food saiu dos celulares e foi parar no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão que regula a concorrência no Brasil. A Rappi pediu para ingressar em um processo aberto contra a 99Food, alegando práticas anticompetitivas e cláusulas de exclusividade que impediriam restaurantes de operar com outros aplicativos.
Segundo O Globo, caso ocorre meses após a entrada da Keeta, do grupo chinês Meituan, no país e levanta novamente o alerta sobre o risco de um novo monopólio no delivery, em um mercado já concentrado pelo iFood. A 99Food, por sua vez, se defende dizendo que as cláusulas são parciais, temporárias e legítimas, mas especialistas alertam que a disputa pode redefinir o equilíbrio competitivo entre as plataformas.
As acusações de práticas anticompetitivas
Segundo a representação apresentada ao Cade, a Rappi acusa a 99Food de adotar cláusulas contratuais restritivas que proíbem restaurantes de manter relações comerciais com concorrentes como Rappi e Keeta durante a vigência dos contratos. Em caso de descumprimento, haveria multas pesadas, além de extensão das restrições para franquias e filiais.
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A Keeta, que pretende começar as operações no Brasil ainda este ano, fez denúncia semelhante. Ambas as empresas alegam que o modelo de exclusividade prejudica a livre concorrência e o direito de escolha dos restaurantes, reproduzindo práticas já combatidas em 2023, quando o Cade firmou acordo com o iFood após investigações semelhantes.
A defesa da 99Food e a alegação de “retórica”
Nos documentos enviados ao Cade, a 99Food nega irregularidades e afirma que a chamada “cláusula de banimento” não possui respaldo jurídico, sendo apenas uma retórica inflada por competidores. A empresa sustenta que as exclusividades seriam parciais e temporárias, ligadas a investimentos diretos em marketing e estrutura dos restaurantes, o que, segundo ela, justificaria contrapartidas comerciais.
A 99Food também argumenta que sua participação no mercado ainda é marginal, sem poder de fechar o acesso de concorrentes ou alterar de forma relevante as dinâmicas do setor. A companhia voltou recentemente às operações no Brasil, atuando em São Paulo e Goiânia, e tenta reconquistar espaço em um mercado dominado por grandes players.
O risco de um novo monopólio no delivery brasileiro
A disputa reacende o temor de formação de um duopólio entre iFood e 99Food, caso o Cade não imponha limites às práticas de exclusividade. Para a Rappi, repetir condutas consideradas nocivas à concorrência seria um retrocesso para o mercado e uma barreira direta à entrada de novos players, o que reduziria oportunidades de negócios e afetaria entregadores e consumidores.
Nos bastidores, analistas destacam que o mercado de delivery no Brasil movimenta bilhões e que a competição saudável é essencial para manter preços justos e ampliar a inovação. Um novo monopólio no delivery poderia gerar efeitos em cadeia, como queda nas comissões pagas a entregadores, aumento de taxas aos restaurantes e menor diversidade de aplicativos disponíveis.
O papel do Cade e o impacto para o setor
O Cade, responsável por zelar pela livre concorrência, já interveio em 2023 no caso iFood, impondo restrições a contratos de exclusividade com restaurantes. O novo processo com a 99Food será um teste para a efetividade da regulação no segmento de tecnologia e plataformas digitais, cada vez mais concentrado.
Especialistas em direito concorrencial destacam que, se confirmadas as denúncias, o Cade pode exigir mudanças contratuais, aplicar multas e determinar compromissos de cessação de conduta. Isso poderia reconfigurar o mercado, equilibrando o poder entre plataformas e restaurando o princípio de acesso igualitário à base de clientes e entregadores.
Entregadores e restaurantes no centro da disputa
Por trás das disputas jurídicas e cifras bilionárias, estão os restaurantes e entregadores, que sentem na prática os efeitos das exclusividades. Quando um aplicativo concentra o mercado, os estabelecimentos perdem poder de negociação e ficam mais dependentes de uma única plataforma para gerar vendas.
Da mesma forma, entregadores podem ter sua renda impactada, já que a falta de concorrência reduz a margem de ganho e o número de corridas disponíveis. Com mais players ativos, o setor tende a pagar melhor e oferecer condições mais flexíveis, estimulando um equilíbrio mais justo.
Um mercado em transformação e vigilância
A entrada da Keeta e o embate entre Rappi e 99Food mostram que o mercado de delivery está em nova fase de consolidação. Os próximos meses serão decisivos para definir se o Brasil manterá um ecossistema competitivo ou se voltará a concentrar poder nas mãos de poucos aplicativos.
A decisão do Cade poderá criar um precedente para outros setores digitais e sinalizar como o país lida com monopólios de plataformas. Enquanto isso, restaurantes, entregadores e consumidores observam os desdobramentos que podem mudar preços, taxas e relações de trabalho em todo o setor.
A batalha entre Rappi, Keeta e 99Food no Cade vai muito além da concorrência entre aplicativos, coloca em jogo o futuro da competição e da liberdade comercial no delivery brasileiro.