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Comunidades pesqueiras do RN denunciam instalação de boia da Petrobras para energia eólica offshore sem consulta prévia: especialistas apontam violação da Convenção 169 da OIT

Escrito por Rannyson Moura
Publicado em 04/11/2025 às 08:33
Pescadores de Pedra Grande (RN) encontraram uma boia da Petrobras usada para estudos de energia eólica offshore em área tradicional de pesca. Comunidades denunciam falta de consulta prévia e especialistas alertam para violação da Convenção 169 da OIT.
Pescadores de Pedra Grande (RN) encontraram uma boia da Petrobras usada para estudos de energia eólica offshore em área tradicional de pesca. Comunidades denunciam falta de consulta prévia e especialistas alertam para violação da Convenção 169 da OIT.
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Pescadores de Pedra Grande (RN) encontraram uma boia da Petrobras usada para estudos de energia eólica offshore em área tradicional de pesca. Comunidades denunciam falta de consulta prévia e especialistas alertam para violação da Convenção 169 da OIT.

Uma boia de medição identificada com os logotipos da Petrobras, SENAI, ANP e BRAVO foi encontrada por pescadores artesanais na costa de Enxu Queimado, no município de Pedra Grande (RN). O equipamento, parte de um projeto de energia eólica offshore, apareceu em uma área de pesca tradicional sem que houvesse qualquer diálogo ou aviso prévio às comunidades locais.

A presença inesperada da estrutura provocou preocupação e revolta entre os moradores, que afirmam não ter sido informados sobre a natureza do experimento. O caso reacende o debate sobre o direito à Consulta Livre, Prévia e Informada, previsto na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário.

O que é a Boia Bravo e como ela se conecta ao projeto de energia eólica offshore

A chamada Boia Remota de Avaliação de Ventos Offshore (BRAVO) é um equipamento de alta tecnologia usado para medir ventos, ondas e outros parâmetros oceanográficos essenciais para o desenvolvimento de usinas eólicas no mar.

O projeto, segundo informações oficiais da Petrobras, foi criado em parceria com o Instituto Senai de Inovação e recebeu investimentos milionários via Aneel, dentro do esforço para impulsionar o avanço da energia eólica offshore no Brasil.

Relatórios públicos da estatal revelam que a campanha de testes da Bravo 2.0 teve início a cerca de 20 km da costa de Areia Branca (RN), com o apoio da Marinha do Brasil e do Terminal Salineiro de Areia Branca. No entanto, a aparição da boia em Pedra Grande, município vizinho, indica uma possível expansão não comunicada da área de testes, agora em pleno território de pesca artesanal.

Para as comunidades, a falta de transparência e de diálogo representa uma ruptura grave no processo de implantação de projetos energéticos em áreas costeiras.

Comunidades denunciam violações e exigem respeito aos direitos territoriais

Lideranças locais e organizações sociais consideram o episódio uma sequência de violações de direitos fundamentais. Segundo elas, a forma como o equipamento foi instalado fere não apenas tratados internacionais, mas também a confiança construída entre instituições públicas e populações tradicionais.

Entre as principais irregularidades apontadas estão:

  • Violação da Convenção 169 da OIT: a ausência de consulta prévia fere um direito garantido às comunidades tradicionais sobre qualquer projeto que possa afetar seus territórios e modos de vida.
  • Ignorância ao saber tradicional: pescadores artesanais detêm conhecimento detalhado sobre correntes, ventos e comportamento marítimo, elementos cruciais para estudos ambientais. A exclusão dessas vozes representa uma perda de informação científica valiosa.
  • Falta de transparência: os pescadores alegam não ter sido informados sobre o tempo de permanência da boia, os possíveis impactos ambientais e os riscos à segurança da navegação e da pesca.
  • Licenciamento ambiental desconectado da realidade: ainda que exista autorização do Ibama, líderes comunitários afirmam que ela não considerou adequadamente a presença das comunidades tradicionais na região afetada.

Para os moradores de Enxu Queimado, o caso reflete um padrão recorrente: grandes empreendimentos avançam sobre áreas pesqueiras sem considerar os impactos sociais e culturais.

O mar como território de vida: a energia eólica offshore e a transição justa

O Brasil vive um momento de forte expansão dos investimentos em energia eólica offshore, considerada uma das principais apostas da transição energética global. No entanto, especialistas e movimentos sociais alertam que a transição não pode ser apenas tecnológica — precisa ser também socialmente justa.

As comunidades pesqueiras são as primeiras a sentir as mudanças provocadas por novos empreendimentos costeiros. Para elas, o mar é mais do que um espaço de trabalho: é um território de vida, memória e sustento. A presença de equipamentos sem consulta ameaça esse equilíbrio, transformando o processo de modernização energética em uma fonte de tensão social.

“O mar é nosso campo, nossa roça. A gente não foi chamado para conversar, só viu o equipamento aparecer”, relatou um pescador da região. “Ninguém explicou o que é, se pode pescar perto ou se traz algum perigo.”

Especialistas apontam falhas no processo de diálogo e licenciamento

Pesquisadores e advogados ambientais também manifestaram preocupação com o episódio. Para eles, a falta de consulta prévia e diálogo efetivo é um erro que pode comprometer a credibilidade de toda a agenda de energia limpa no país.

Segundo a advogada ambiental Camila Vasconcelos, especialista em direitos socioambientais, “o licenciamento ambiental de projetos offshore deve seguir padrões internacionais de participação social. O Brasil, como signatário da Convenção 169 da OIT, tem obrigação legal de realizar consultas antes de qualquer intervenção em territórios tradicionais.”

Ela acrescenta que o caso de Enxu Queimado revela uma lacuna estrutural na política energética brasileira: “O país avança tecnologicamente, mas ainda não consolidou mecanismos de governança que garantam o protagonismo das comunidades afetadas.”

Pescadores exigem retirada da boia e abertura de diálogo transparente

Diante do ocorrido, as comunidades locais e organizações sociais listaram uma série de exigências dirigidas à Petrobras, ao SENAI e aos órgãos fiscalizadores:

  1. Esclarecimentos públicos imediatos sobre o escopo do projeto BRAVO e as razões da presença da boia em Enxu Queimado.
  2. Retirada temporária do equipamento, até que todos os protocolos de consulta sejam devidamente cumpridos.
  3. Início de um processo de Consulta Livre, Prévia e Informada, com linguagem acessível, prazos adequados e respeito às tradições locais.
  4. Atuação do Ibama e do Ministério Público Federal (MPF) para investigar as irregularidades e garantir que os direitos das comunidades sejam assegurados.

As lideranças reforçam que não são contra a energia eólica offshore, mas sim contra o modelo de decisão unilateral que desconsidera quem habita e trabalha nos territórios impactados.

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Rannyson Moura

Graduado em Publicidade e Propaganda pela UERN; mestre em Comunicação Social pela UFMG e doutorando em Estudos de Linguagens pelo CEFET-MG. Atua como redator freelancer desde 2019, com textos publicados em sites como Baixaki, MinhaSérie e Letras.mus.br. Academicamente, tem trabalhos publicados em livros e apresentados em eventos da área. Entre os temas de pesquisa, destaca-se o interesse pelo mercado editorial a partir de um olhar que considera diferentes marcadores sociais.

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