Rede de fornecimento entre China e Rússia mantém produção de drones mesmo sob sanções, revelando brechas e acordos comerciais secretos
Uma série de documentos recém-obtidos revela como a Rússia tem conseguido manter e até expandir sua produção de drones militares, mesmo diante de pesadas sanções impostas por países ocidentais. Segundo noticiou o portal Xataka Brasil, A descoberta envolve empresas chinesas, acordos comerciais secretos e uma estrutura de fornecimento cuidadosamente camuflada.
O caso levanta questionamentos sobre a neutralidade da China no conflito e expõe falhas no sistema internacional de sanções.
Peças chinesas em drones russos
O alerta partiu da inteligência ucraniana. Durante os ataques de drones russos, foram recuperadas peças de origem chinesa nos modelos Shahed-136/Geran-2, utilizados em Kiev.
-
Nova lei ambiental da União Europeia ameaça exportações brasileiras de madeira tropical e derivados até 2030 — produtores temem barreiras comerciais, enquanto China amplia espaço no mercado
-
De blindados soviéticos a soldados: este é o poder bélico da Venezuela em meio à tensão com os EUA
-
Após envio de navios ao Caribe, governo Trump promete usar “todo poder americano” contra Maduro enquanto militares aguardam telefonema do “Rei da América”
-
Irã estaria ainda mais motivado a buscar a bomba atômica após ataques dos EUA e Israel, afirma especialista
Para as autoridades ucranianas, isso confirma que empresas chinesas continuam abastecendo o complexo militar russo com componentes eletrônicos e tecnologia de ponta.
Vladyslav Vlasiuk, comissário de sanções da Ucrânia, afirmou que a China não apenas fornece logística, mas também já replica tecnologias ocidentais, o que amplia sua capacidade de apoiar a Rússia.
Esse fornecimento constante de peças chinesas tem sido essencial para a continuidade da produção de drones por Moscou.
Documentos reveladores
O envolvimento chinês ficou mais claro após uma investigação da Bloomberg. Documentos revelaram uma rede de colaboração entre empresas russas e chinesas, que inclui zonas alfandegárias especiais, intermediários e acordos ocultos.
Mesmo com as sanções, a Rússia conseguiu importar componentes sensíveis e tecnologia para fortalecer sua linha de produção.
A empresa russa Aero-HIT, sediada em Khabarovsk, no extremo leste da Rússia, tornou-se peça-chave nesse processo.
Desde os primeiros estágios da invasão da Ucrânia, ela vem fabricando drones militares com apoio direto ou indireto de empresas chinesas.
A fábrica de Khabarovsk
A cidade de Khabarovsk, localizada a apenas 30 quilômetros da fronteira chinesa, abriga a fábrica da Aero-HIT.
Essa empresa, até então pouco conhecida, tornou-se uma das maiores fabricantes de drones da Rússia. Seu modelo principal, o Veles, é um drone FPV de baixo custo, já usado em operações na região de Kherson.
O Departamento do Tesouro dos EUA sancionou a Aero-HIT por seu papel na guerra, mas sua produção segue ativa. Isso se deve, em parte, ao apoio da fabricante chinesa Autel Robotics.
Apesar de negar qualquer envolvimento com a Rússia desde 2022, a empresa aparece em correspondências e planos da Aero-HIT, inclusive em projetos de investimento conjunto de US$ 90 milhões.
Parceria técnica com a Autel Robotics
Segundo uma carta divulgada pela Bloomberg, a Aero-HIT e a Autel Robotics retomaram contatos técnicos em junho de 2025.
A negociação envolvia a produção local do drone civil Autel EVO Max 4T, considerado eficaz no combate por resistir à interferência eletrônica.
O acordo previa ainda transferência de firmware, métodos de depuração e técnicas de reparo.
O EVO Max 4T seria integrado a sistemas russos, aumentando a eficiência da linha de drones militares. A aliança entre as empresas indicava um avanço na capacidade tecnológica da Rússia em plena guerra.
Conexões políticas e acadêmicas
As conexões não paravam nas empresas. A Bloomberg relatou que, desde 2022, acordos foram firmados entre a Komax (empresa ligada ao ex-agente da KGB Konstantin Basyuk) e representantes do governo chinês.
Estavam envolvidos funcionários da Zona de Livre Comércio de Harbin e do Instituto de Tecnologia de Harbin (HIT), uma universidade ligada ao exército chinês.
Os planos incluíam a criação de uma fábrica de montagem em Khabarovsk com incentivos fiscais. Centenas de kits de drones foram enviados da China, e executivos russos visitaram fábricas em Shenzhen, inclusive a sede da Autel.
O projeto recebeu apoio do Kremlin e foi declarado “prioritário” por Yury Trutnev, enviado especial para o Extremo Oriente.
Rede de disfarces comerciais
Para ocultar a parceria com a China, a Aero-HIT usou uma rede de empresas de fachada. Os negócios eram mascarados como serviços de catering, logística, comércio de frutos do mar ou imobiliário.
Essas empresas cuidavam de pedidos, faturamento e envio de componentes.
Relatórios de 2024 mostram entregas diretas de drones às tropas russas e pedidos oficiais do Ministério da Defesa para milhares de unidades do modelo Veles.
A Renovatsio-Invest e a Shenzhen Huasheng Industry, ambas sancionadas pelos EUA, foram identificadas como principais fornecedoras de peças e eletrônicos, mesmo após as restrições comerciais impostas pela China.
Algumas empresas chinesas abandonaram o projeto após novas regras comerciais em 2023, com receio de punições internacionais.
No entanto, foram rapidamente substituídas por outras fornecedoras, garantindo que a produção não fosse interrompida.
O esquema conseguiu manter a cadeia logística em funcionamento mesmo sob vigilância internacional.
Negativas oficiais e contradições
Apesar das evidências, a Autel Robotics continua negando qualquer envolvimento com a Rússia. A empresa diz operar apenas no setor civil, sem vínculos militares.
Segundo seu comunicado, ela segue regras rigorosas de conformidade e cortou relações com Moscou desde fevereiro de 2022.
Contudo, os documentos obtidos pela Bloomberg indicam que engenheiros, subsidiárias e fornecedores intermediários ainda mantêm a conexão.
As evidências apontam que o fluxo de tecnologia da Autel chega à Rússia, mesmo que de forma indireta.
A posição da China
O governo chinês afirma não fornecer armas letais a nenhum dos lados e sustenta que controla com rigor as exportações de itens de uso duplo, como drones.
No entanto, não está claro até que ponto o governo tem conhecimento — ou controle — sobre o envolvimento de suas empresas no esforço de guerra russo.
A continuidade no envio de tecnologia para Moscou coloca em xeque a neutralidade declarada de Pequim. Ao mesmo tempo, desafia a eficácia das sanções aplicadas por Estados Unidos e aliados.
Crescimento da produção de drones
A fábrica da Aero-HIT já produzia entre 200 e 300 drones por mês no final de 2024. A meta é chegar a 10 mil unidades mensais até o fim de 2025.
O presidente ucraniano Volodymyr Zelensky declarou que a Rússia quer alcançar uma produção de 500 drones por dia, para sustentar ataques em massa com enxames de drones.
Esse número se alinha aos bombardeios recentes, em que até 500 drones foram usados em uma única noite.
O impacto sobre áreas civis foi severo, o que reforça a importância dos drones como arma no atual estágio da guerra.
Sofisticação e risco
A capacidade da Rússia de manter a produção em massa de drones, mesmo sob sanções, revela uma rede sofisticada de cooperação técnica e comercial com a China.
O uso de fachadas, intermediários e zonas especiais permite que Moscou drible os bloqueios e fortaleça seu poder militar.
A colaboração entre Rússia e China também revela as fragilidades do sistema de sanções globais. Mesmo com empresas sendo punidas, outras surgem para manter o fluxo.
O caso da Aero-HIT mostra como a guerra moderna se adapta à pressão internacional. As alianças entre empresas, universidades e governos permitem a continuidade da produção bélica, mesmo em cenários de bloqueio.
A investigação da Bloomberg lança luz sobre essas conexões ocultas e alerta para os limites da diplomacia em tempos de conflito prolongado.
Em tempos de guerra prolongada, a ameaça não vem mais apenas da linha de frente. Ela se camufla, voa sob radar… e muitas vezes vem com etiqueta de “Made in China”.
Com informações de Xataka.