Mais da metade dos municípios brasileiros encerrou 2024 com déficit e pode repetir o resultado em 2025. A pressão por aumento no repasse do Fundo de Participação dos Municípios cresce, enquanto novas despesas ampliam o desequilíbrio fiscal.
Mais da metade dos municípios brasileiros terminou 2024 com déficit nas contas públicas e pode repetir o cenário em 2025.
Segundo levantamento da Confederação Nacional de Municípios (CNM), 54% das prefeituras registraram resultado negativo, somando R$ 33 bilhões de desequilíbrio.
A Associação Paulista de Municípios (APM) avalia que, sem novas fontes de receita, o percentual deve se manter ou aumentar neste ano.
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Municípios pedem aumento do Fundo de Participação
O presidente da APM, Fred Guidoni, defende a aprovação da PEC 25/2022, que prevê aumento de 1,5% na parcela do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), recurso formado por tributos federais repassados pela União.
Segundo ele, a mudança adicionaria entre R$ 10 bilhões e R$ 12 bilhões anuais aos cofres das prefeituras, sendo cerca de R$ 2 bilhões destinados ao Estado de São Paulo.
“Na associação temos o Movimento Municipalista, porque é na cidade que a vida acontece. A repartição tributária atual não atende às necessidades da população. A PEC 25 prevê 1,5% a mais na participação do FPM, o que significaria de R$ 10 bilhões a R$ 12 bilhões a mais para os municípios”, afirmou Guidoni.
De acordo com a APM, o aumento de repasses permitiria compensar parte do crescimento das despesas locais com saúde, educação e transporte, que vêm subindo acima da média de arrecadação.
O movimento municipalista cobra do Congresso prioridade na tramitação da proposta, que ainda aguarda votação no plenário.
Aposentadoria especial pressiona finanças municipais
Prefeitos também apontam preocupação com medidas aprovadas em Brasília que geram impacto financeiro sem previsão de compensação.
Um exemplo é a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que institui aposentadoria especial para agentes comunitários de saúde e de combate às endemias, aprovada em 7 de outubro de 2025 pela Câmara dos Deputados e encaminhada ao Senado.
A CNM estima que a medida pode representar custo adicional de R$ 69,9 bilhões para os municípios.
O texto garante integralidade e paridade aos profissionais após 25 anos de atividade, permitindo que o valor da aposentadoria corresponda ao último salário da carreira e receba os mesmos reajustes aplicados aos servidores ativos.
Segundo Guidoni, o impacto da nova regra preocupa os gestores locais.
“Nada contra a profissão, que tem de ser dignificada. Mas isso vai gerar um custo às cidades em um único movimento. Quem vai pagar essa conta?”, questionou.
Crescimento de gastos e queda de receita desafiam cidades
A CNM aponta que o crescimento das despesas obrigatórias e a queda real de transferências federais e estaduais agravaram a situação fiscal em 2024.
O estudo mostra que o problema atinge municípios de todos os portes, mas é mais acentuado nas cidades médias e grandes, que concentram os serviços de maior custo.
Para as entidades municipalistas, a principal causa é o desequilíbrio na repartição tributária, que teria se tornado defasada desde a Constituição de 1988.
De lá para cá, os municípios passaram a responder por parte crescente da execução de políticas públicas, sem aumento proporcional de receitas.
Reforma tributária pode modernizar arrecadação
A Reforma Tributária do consumo, aprovada em 2023 e em fase de regulamentação, é vista como uma possível via de alívio financeiro.
A proposta cria o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), com cobrança no destino e mecanismos de distribuição automática de receitas.
Guidoni avalia que a modernização pode melhorar a arrecadação e reduzir a sonegação, mas ressalta que o resultado dependerá da execução.
“É uma reforma audaciosa, totalmente digitalizada. O tributo é enviado para o ente federado imediatamente a partir de um sistema. Vai melhorar muito a arrecadação tributária no Brasil. O que precisa ser ajustado são pequenos detalhes para que funcione bem para toda a sociedade”, disse.
Em junho de 2025, a Receita Federal lançou um projeto-piloto para testar sistemas de arrecadação digital no modelo de split payment, em que o imposto é separado no ato da operação comercial e transferido automaticamente aos entes federativos.
A fase experimental ocorre em conjunto com empresas do setor financeiro e de tecnologia.
Emendas constitucionais e programas sem custeio
Guidoni também destacou a existência de normas constitucionais que proíbem a criação de programas voltados aos municípios sem a definição de fontes de custeio.
Segundo ele, essa regra vem sendo contornada por meio de emendas à Constituição que impõem novas obrigações sem garantir a transferência correspondente de recursos.
“Nossa luta é por um diálogo construtivo com os entes federados, para que reconheçam a importância dos municípios e confiem em suas gestões. O objetivo é garantir que as cidades tenham recursos para inovar e melhorar a qualidade dos serviços públicos”, afirmou.
Perspectivas e desafios para 2025
O movimento municipalista concentra esforços na aprovação da PEC 25/2022 e na defesa de um mecanismo de compensação automática quando novas responsabilidades forem criadas sem aumento de repasses.
A APM também orienta prefeitos a adotar ajustes administrativos para conter gastos e buscar eficiência na gestão, como revisão de contratos e modernização da arrecadação.
Em São Paulo, Guidoni calcula que o reforço do FPM significaria R$ 2 bilhões adicionais por ano, o que permitiria reduzir parte das pressões sobre as finanças locais.
Segundo ele, a situação fiscal seguirá delicada enquanto os municípios acumularem obrigações sem aumento proporcional das receitas.
Com 54% das prefeituras em déficit e novas despesas previstas para 2025, a dúvida central é se a ampliação do FPM e a modernização tributária serão suficientes para evitar que as cidades brasileiras fechem mais um ano no vermelho.