Setor automotivo nacional enfrenta retração histórica, com montadoras tradicionais registrando vendas mínimas e cogitando saída do Brasil, enquanto especialistas apontam causas econômicas e fiscais para a crise atual do mercado.
O cenário do setor automotivo brasileiro vive um dos momentos mais delicados dos últimos anos.
Segundo análise do professor e economista Josué Aragão, apresentada em vídeo publicado em seu canal no YouTube, marcas consolidadas como Kia, Suzuki, Lexus e JAC enfrentam vendas em declínio acelerado e podem até mesmo deixar de operar no Brasil, repetindo movimentos semelhantes ao da Ford, que encerrou suas operações fabris no país em 2021.
De acordo com Josué Aragão, a crise atual do mercado automobilístico nacional se intensificou ao longo de 2025, impactando não apenas marcas de menor expressão, mas também nomes tradicionais que, em anos anteriores, figuravam entre os favoritos dos consumidores.
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O especialista destaca que, em alguns casos, o volume de veículos vendidos por determinadas montadoras não chegou sequer a 500 unidades ao longo do ano, evidenciando a gravidade do quadro.
Carga tributária e preço dos veículos no setor automotivo brasileiro
Conforme analisado no vídeo, fatores como a elevação dos preços dos carros novos, a forte carga tributária e a interferência do Estado no setor automotivo vêm inviabilizando o crescimento e a sustentabilidade das operações dessas montadoras no Brasil.
Aragão ressalta que, enquanto países como China e Estados Unidos mantêm alíquotas de impostos sobre veículos em patamares de 5% e 7%, respectivamente, o Brasil chega a tributar até 44% do valor de um automóvel, cenário que tende a se agravar com a implementação da reforma tributária prevista para entrar em vigor em 2026.
Segundo dados apresentados por Josué Aragão, para adquirir um modelo como o Toyota Corolla, o consumidor brasileiro desembolsa cerca de R$ 150.790, dos quais mais de R$ 66 mil são destinados apenas ao pagamento de impostos.
Para um trabalhador que recebe o salário mínimo, seriam necessárias mais de 23 mil horas de trabalho para adquirir esse veículo, enquanto, nos Estados Unidos, esse tempo cai para pouco mais de duas mil horas.
Marcas tradicionais enfrentam queda nas vendas no mercado automobilístico nacional
Entre as montadoras com desempenho crítico, a Kia Motors chama atenção.
A marca, que já teve forte presença no mercado nacional, vendeu menos de mil veículos em 2025 — sendo 600 deles caminhões Bongo.
Assim, menos de 400 carros de passeio foram comercializados no período.
De acordo com Aragão, essa retração está diretamente ligada à dependência da importação, agravada pela alta do dólar e pela concorrência acirrada de SUVs nacionais e importados.
O modelo Kia Sportage, por exemplo, parte de R$ 270 mil, valor superior ao de concorrentes mais equipados.
Já a Suzuki, outra montadora tradicional, enfrenta situação igualmente delicada.
Conforme destacou o economista, foram apenas 430 unidades emplacadas no ano, a maioria do modelo Jimny Sierra, que parte de R$ 170 mil.
A ausência de lançamentos recentes e a falta de campanhas publicitárias agravam o cenário de estagnação da marca japonesa, que opera no Brasil em parceria com a HPE Automotores e a Mitsubishi.
A divisão de luxo da Toyota, Lexus, também sente o impacto da crise.
No primeiro trimestre de 2025, foram apenas 258 veículos vendidos no país, todos com preços acima de R$ 299 mil. O modelo RX, por exemplo, ultrapassa os R$ 670 mil.
Segundo Josué Aragão, o alto valor agregado e a discreta atuação da marca em território nacional contribuíram para a retração.
A JAC Motors, montadora chinesa que desembarcou no Brasil em 2011 com propostas inovadoras e preços competitivos, praticamente deixou de atuar no segmento de carros de passeio.
Dos menos de 350 veículos comercializados em 2025, 70% correspondem a caminhões elétricos.
Aragão explicou que a nova estratégia da empresa, focada em elétricos, foi duramente atingida pelo aumento das taxas de importação promovidas pelo governo brasileiro.
A tributação sobre carros híbridos, por exemplo, saltou de 15% para 30% entre janeiro de 2024 e julho de 2025, e deve chegar a 35% em julho de 2026.
Para os elétricos, a alíquota subirá para 35% no mesmo período.
Outras montadoras e impacto da crise no setor automotivo brasileiro
Outras marcas tradicionais, como Land Rover e Subaru, também enfrentam resultados abaixo do esperado.
De acordo com o vídeo de Josué Aragão, a Land Rover vendeu apenas 267 unidades em fevereiro de 2025, enquanto a Subaru teve somente 12 veículos emplacados em março do mesmo ano.
Modelos de luxo, como o Defender e o Velar, facilmente ultrapassam R$ 500 mil, tornando-se inacessíveis para a maioria dos consumidores.
Além disso, Aragão citou o contexto global de crise enfrentado por gigantes como Volkswagen e Stellantis, grupo responsável por marcas como Fiat, Jeep, Peugeot e Citroën.
Embora ainda liderem o mercado brasileiro, essas empresas registram queda nas vendas devido ao aumento da concorrência chinesa, ao custo de produção elevado e à instabilidade econômica.
Em junho de 2025, a Fiat detinha 21,1% de participação no mercado nacional, seguida por Volkswagen (15,9%), GM (12,6%), Toyota (quarto lugar), Hyundai e Renault.
Causas da retração e futuro do setor automotivo brasileiro
Mas, afinal, o que explica esse cenário de retração?
Segundo o economista, o principal fator é o chamado “custo Brasil”, expressão que sintetiza a combinação de carga tributária elevada, burocracia excessiva, custos trabalhistas e energia cara.
Como resultado, a fabricação de veículos no país se torna menos competitiva, aumentando a dependência de importações, que, por sua vez, também estão cada vez mais onerosas devido ao câmbio desfavorável e às novas tarifas de importação.
Para Aragão, decisões de políticas públicas que aumentam a tributação sobre veículos importados — especialmente híbridos e elétricos — prejudicam o consumidor, limitam a concorrência e reduzem a oferta de modelos inovadores no mercado nacional.
O economista observa que, ao contrário do que se propõe com a proteção da indústria local, a falta de incentivos e o excesso de tributos enfraquecem o setor, diminuem os empregos e retardam a modernização da frota.
O debate sobre o futuro do setor automotivo brasileiro permanece em aberto.
Como destacou Josué Aragão em seu canal no YouTube, “quanto menor a concorrência, menores as chances de inovação e de acesso a veículos com preços mais justos para a população”.
Você acredita que o setor automotivo nacional conseguirá se reinventar diante desse cenário, ou estamos caminhando para um mercado cada vez mais restrito e elitizado?