Durante décadas, uma história curiosa circulou como exemplo de desperdício americano e pragmatismo soviético. Diziam que, enquanto a NASA gastava milhões desenvolvendo uma caneta que funcionasse no espaço, os russos simplesmente usavam lápis. Mas essa versão dos fatos está longe da realidade.
Durante décadas, circulou uma história curiosa sobre a corrida espacial entre Estados Unidos e União Soviética. De um lado, os americanos teriam gasto milhões para desenvolver uma caneta que funcionasse em gravidade zero.
Do outro, os russos teriam resolvido o mesmo problema de forma simples e barata: usando lápis.
Essa anedota, muitas vezes usada como crítica à burocracia e ao desperdício de recursos públicos, se espalhou pelo mundo como uma “prova” da eficiência russa frente ao exagero americano.
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Mas a realidade é um pouco diferente — e bem mais interessante.
O começo com lápis
Nos primeiros anos da corrida espacial, tanto a NASA quanto a agência espacial soviética utilizavam lápis para anotar informações durante os voos.
Era uma escolha prática à primeira vista, já que lápis funcionam independentemente da gravidade e são leves.
No entanto, logo surgiram problemas. A grafite das pontas podia se soltar, quebrar e flutuar no interior da cabine, ameaçando entrar em equipamentos delicados ou causar curto-circuitos.
Além disso, lápis eram inflamáveis, e incêndios são extremamente perigosos em um ambiente confinado como uma nave espacial.
Outro fator era a legibilidade: a grafite se apagava facilmente e não era ideal para registros permanentes.
Portanto, a ideia de substituir os lápis por um instrumento mais seguro e eficiente fazia sentido — e foi isso que abriu espaço para a famosa caneta espacial.
A criação da Fisher Space Pen
Ao contrário do que diz a lenda, a NASA não desenvolveu a caneta espacial nem gastou milhões nisso.
Quem fez isso foi Paul C. Fisher, fundador da Fisher Pen Company, uma empresa privada dos Estados Unidos.
Em 1965, Fisher investiu recursos próprios para criar uma caneta que funcionasse em microgravidade.
O resultado foi a Fisher Space Pen AG-7, com um cartucho de tinta pressurizado, que permitia escrever de cabeça para baixo, em superfícies molhadas, em temperaturas extremas e no vácuo.
Depois de extensos testes, a NASA aprovou a caneta para uso oficial.
A empresa vendeu cerca de 400 unidades para a agência espacial em 1967, ao custo de US$ 2,39 cada — valor equivalente a aproximadamente US$ 25 hoje. Nada próximo dos “milhões de dólares” que o mito popular costuma mencionar.
O mais curioso é que, pouco depois, a União Soviética também adotou a mesma caneta. A agência russa comprou 100 unidades da Fisher e também alguns cartuchos de tinta.
Ou seja, tanto os americanos quanto os soviéticos acabaram escrevendo no espaço com a mesma tecnologia norte-americana.
Por que o mito se espalhou
A história da caneta versus o lápis foi provavelmente espalhada como uma crítica à suposta ineficiência da burocracia americana.
É uma narrativa simples, com um toque de ironia e fácil de lembrar — ingredientes perfeitos para uma lenda urbana.
Mas, como muitas histórias com boas intenções ou mensagens políticas, ela distorce os fatos para caber em um formato mais impactante. Na prática, a decisão de buscar uma solução mais segura e eficiente para anotações no espaço foi sensata e bem-sucedida.
Um legado que continua
Hoje, a Fisher Space Pen ainda está em produção e é vendida em diversas versões. Astronautas seguem usando o modelo ou suas variações nas missões da Estação Espacial Internacional.
O cartucho pressurizado continua sendo uma tecnologia útil em ambientes extremos.
A caneta virou item de colecionador, presente corporativo e símbolo de inovação. E mais do que isso, ela representa como a iniciativa privada pode oferecer soluções práticas até mesmo para os desafios mais inusitados da exploração espacial.
Portanto, embora o mito da caneta milionária seja falso, a história real por trás dela mostra algo ainda mais interessante: criatividade, engenharia inteligente e cooperação entre países — tudo isso condensado em uma simples caneta.