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O acordo União Europeia–Mercosul promete bilhões em tarifas eliminadas, mas acusam o Brasil de ameaçar a Amazônia e a produção local europeia

Escrito por Noel Budeguer
Publicado em 03/09/2025 às 10:50
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O acordo UE–Mercosul prevê cortes bilionários em tarifas e abertura de mercados agrícolas, mas enfrenta forte oposição por riscos de desmatamento, impacto ambiental e ameaça à agricultura europeia

A Comissão Europeia deve apresentar nesta quarta-feira a proposta formal do acordo entre União Europeia (UE) e Mercosul para análise do Parlamento Europeu e aprovação dos Estados membros.

O tratado, que vem sendo negociado há mais de duas décadas, pode se tornar um dos maiores pactos comerciais do planeta, mas também enfrenta críticas severas de setores agrícolas, ambientalistas e governos nacionais.

Redução de tarifas e novas cotas agrícolas

Entre os pontos centrais do acordo está a eliminação progressiva de tarifas de importação. O Mercosul deverá zerar os tributos sobre 91% das exportações europeias, incluindo automóveis — que hoje enfrentam uma tarifa de 35% — em um prazo de até 15 anos.

Em contrapartida, a União Europeia se compromete a eliminar tarifas sobre 92% das exportações do Mercosul em um período de até 10 anos.

No campo agrícola, a abertura também será significativa. Produtos europeus como vinhos, que hoje enfrentam 17% de imposto, e bebidas alcoólicas, com alíquotas entre 20% e 35%, terão tarifas zeradas gradualmente.

Já o Mercosul obteve cotas adicionais para exportação de carne bovina — cerca de 99 mil toneladas métricas a mais — além de acesso ao mercado europeu para aves, suínos, açúcar, etanol, arroz, mel e milho.

Em contrapartida, a UE poderá vender ao Mercosul até 30 mil toneladas de queijos sem imposto, além de leite em pó e fórmulas infantis.

Outro elemento importante é o reconhecimento de 350 indicações geográficas europeias, protegendo produtos tradicionais como o queijo Parmigiano Reggiano contra imitações.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva se reúne em Bruxelas com Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia (Foto: Yves Herman/Reuters).

Argumentos dos defensores

Os defensores do tratado destacam que ele pode reposicionar o bloco europeu diante da dependência crescente da China.

Países como Alemanha e Espanha enxergam a parceria como estratégica para garantir acesso a minerais essenciais, como o lítio, usado em baterias.

Além disso, o pacto abriria espaço para empresas europeias participarem de licitações públicas no Mercosul em igualdade de condições com fornecedores locais — algo inédito em acordos assinados pelo bloco sul-americano.

Segundo a Comissão Europeia, o acordo representaria a maior redução tarifária já negociada pela UE, com a eliminação de mais de 4 bilhões de euros anuais em tarifas para exportadores europeus.

Bruxelas defende que a quantidade extra de carne bovina e de aves do Mercosul representaria menos de 2% do consumo europeu, o que reduziria os riscos de desequilíbrio no mercado interno. O documento também prevê salvaguardas para reagir a eventuais distúrbios de oferta.

Outro ponto ressaltado é o fortalecimento da posição do Mercosul como parceiro confiável. A União Europeia afirma que, ao ampliar os vínculos comerciais, terá condições de diversificar suas cadeias produtivas e reduzir vulnerabilidades em relação aos Estados Unidos e à Ásia.

As críticas mais fortes

Apesar dos benefícios alegados, a proposta é alvo de forte contestação. A organização ambientalista Friends of the Earth classificou o acordo como um “destruidor do clima”, alegando que ele estimularia o desmatamento na Amazônia e em outras áreas florestais para expandir a produção agrícola e mineral destinada à exportação.

Governos europeus também se dividem. A França, com forte lobby de pecuaristas, condicionou sua assinatura a salvaguardas para proteger o setor agropecuário local.

Itália e Polônia se somaram às críticas, o que coloca em risco a aprovação, já que os três países juntos têm poder de bloquear a medida.

Linha de produção de automóveis no Brasil: setor é um dos principais beneficiados com a redução de tarifas no acordo UE–Mercosul (Foto: Divulgação).

Agricultores europeus vêm protestando contra o risco de entrada de commodities mais baratas, principalmente carne bovina, que segundo eles não atenderia aos rigorosos padrões ambientais e sanitários da UE.

A Comissão Europeia insiste que os padrões não serão flexibilizados, mas sindicatos rurais afirmam que a fiscalização será insuficiente.

Por fim, grupos ambientais alertam que, embora o acordo inclua compromissos para conter o desmatamento até 2030, faltam mecanismos de aplicação efetiva.

Isso alimenta o temor de que a expansão comercial seja feita às custas da sustentabilidade e dos direitos humanos.

Um impasse político e econômico

O acordo UE–Mercosul simboliza a tensão entre interesses comerciais globais e preocupações ambientais e sociais. De um lado, representa a chance de criar uma das maiores zonas de livre comércio do planeta, abrangendo 800 milhões de pessoas e cerca de um quarto do PIB mundial.

Do outro, enfrenta resistência crescente da opinião pública europeia e de setores econômicos preocupados com os impactos ambientais e a concorrência desigual.

Se aprovado, o tratado poderá redefinir a integração econômica entre a América do Sul e a Europa.

Se barrado, reforçará a percepção de que a política climática e agrícola europeia se sobrepõe a interesses comerciais, adiando ainda mais a entrada do Mercosul em grandes cadeias globais de valor.

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Noel Budeguer

Sou jornalista argentino, baseado no Rio de Janeiro, especializado em temas militares, tecnologia, energia e geopolítica. Busco traduzir assuntos complexos em conteúdos acessíveis, com rigor jornalístico e foco no impacto social e econômico.

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