Sem educação formal, Shakuntala Devi transformou números em brinquedos e se tornou a “Computadora Humana”, superando as primeiras máquinas eletrônicas.
A história de Shakuntala Devi (1929-2013) parece desafiar a lógica. Nascida em Bangalore, na Índia, esta menina superdotada nunca frequentou uma escola, mas sua mente se tornou uma das calculadoras mais rápidas e precisas que o mundo já viu. Com uma velocidade que superava os primeiros computadores eletrônicos, ela ganhou o apelido de “Computadora Humana” e um lugar no Livro dos Recordes do Guinness, provando que o potencial do cérebro humano pode florescer fora das estruturas tradicionais de ensino.
Sua jornada começou em um circo e a levou para os palcos das maiores universidades do mundo, onde seu talento era testado publicamente. Mais do que uma calculadora viva, Devi foi uma figura complexa: autora, ativista social e até candidata política, quebrando estereótipos sobre genialidade e o papel das mulheres. A sua vida não é apenas sobre números, mas sobre as profundas questões que ela levanta sobre a natureza da inteligência e os caminhos não convencionais para o conhecimento.
Uma infância sem escola, mas cercada de números
A trajetória de Shakuntala Devi começou de forma inusitada. Nascida em uma família brâmane, seu pai se rebelou contra a tradição de se tornar sacerdote e juntou-se a um circo, onde trabalhou como trapezista e mágico. Foi nesse ambiente de espetáculo que o talento da filha foi descoberto. Aos três anos, enquanto aprendia um truque de cartas, seu pai percebeu sua espantosa capacidade de memorizar números. Reconhecendo o potencial comercializável da habilidade, ele deixou o circo para se tornar empresário da filha.
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Sem dinheiro para pagar a mensalidade escolar, que custava apenas 2 rupias, Devi nunca recebeu educação formal. No entanto, sua aprendizagem foi intensiva e altamente especializada. As “digressões” organizadas por seu pai se tornaram sua sala de aula, onde ela demonstrava suas habilidades em escolas e faculdades, enfrentando problemas numéricos de plateias céticas. Aos seis anos, já se apresentava na Universidade de Mysore. Esse treinamento diário e sob pressão forjou sua velocidade e precisão, tornando-se um modelo de ensino muito mais rigoroso para sua habilidade específica do que qualquer currículo padrão.
Os feitos que chocaram o mundo: superando a máquina
A fama de Devi rapidamente se tornou global. Em 1944, aos 15 anos, mudou-se para Londres e iniciou uma carreira internacional. O feito que a imortalizou aconteceu em 18 de junho de 1980, no Imperial College London. Diante de uma audiência, foi desafiada a multiplicar dois números de 13 dígitos, selecionados aleatoriamente por um computador. Em apenas 28 segundos, ela deu a resposta correta de 26 dígitos, garantindo seu lugar na edição de 1982 do Guinness Book of World Records.
Talvez ainda mais impressionante tenha sido o desafio “Homem vs. Máquina” em 1977, na Southern Methodist University, em Dallas, EUA. A tarefa era calcular a 23ª raiz de um número de 201 dígitos. Shakuntala Devi encontrou a resposta correta em 50 segundos, 12 segundos mais rápido que o supercomputador UNIVAC 1101, que precisou de um programa especial para realizar a tarefa e levou 62 segundos. Essa vitória simbólica do intelecto humano sobre a máquina fria e rígida solidificou sua lenda numa era de crescente ansiedade tecnológica.
Como a mente da “Computadora Humana” funcionava?
A pergunta sobre como uma menina superdotada sem estudos formais conseguia tais proezas intrigou cientistas por décadas. Em 1988, Arthur Jensen, um professor de psicologia da Universidade da Califórnia, Berkeley, realizou a única grande investigação científica sobre suas habilidades. Os resultados foram surpreendentes: os tempos de reação de Devi em tarefas cognitivas básicas e seus resultados em testes de inteligência geral eram considerados normais, nada excepcionais. O “hardware” de seu cérebro não era inerentemente mais rápido.
A conclusão de Jensen foi que o gênio de Devi residia em seu “software” mental. Através de décadas de prática intensiva desde a infância, ela havia desenvolvido uma memória de longo prazo “extremamente bem abastecida com informação numérica” e algoritmos de cálculo altamente eficientes. Para ela, manipular números era como uma língua nativa, um processo automático que contornava as limitações da memória de trabalho que afetam a maioria das pessoas. Seu talento não era uma anomalia biológica, mas sim o auge da otimização mental alcançada por meio de uma prática focada e prolongada.
Muito além dos cálculos: a mulher por trás do gênio
Apesar da fama, Shakuntala Devi se recusava a ser definida apenas por sua habilidade com números. Ela construiu uma carreira multifacetada como autora prolífica, escrevendo livros que popularizavam a matemática, como Figuring: The Joy of Numbers, mas também sobre astrologia, ficção e temas sociais. Em um ato de notável coragem, ela publicou em 1977 o livro The World of Homosexuals, considerado o primeiro estudo acadêmico sobre a homossexualidade na Índia, pedindo “aceitação plena e completa” em uma época em que o tema era um tabu e criminalizado.
Sua ambição também a levou à política. Em 1980, concorreu como candidata independente ao parlamento indiano, desafiando diretamente a então primeira-ministra Indira Gandhi. Embora não tenha sido eleita, o ato demonstrou sua recusa em ser confinada ao papel de uma mera performer. A história dessa menina superdotada mostra uma mulher complexa, que usou sua plataforma para explorar sistemas complexos, fossem eles numéricos, sociais ou políticos, deixando um legado que vai muito além de seus recordes mundiais.
A história de Shakuntala Devi nos faz questionar: o que realmente define a genialidade? Você acredita que talentos extraordinários como o dela podem ser desenvolvidos com treinamento intenso, ou são um dom inato? Deixe sua opinião nos comentários queremos saber o que você pensa sobre os limites da mente humana.