No deserto australiano, Coober Pedy desafia o calor extremo com casas subterrâneas que oferecem conforto, economia e inspiração para cidades do futuro
No coração árido da Austrália, Coober Pedy se tornou símbolo de resistência e criatividade. Diante de temperaturas que chegam a 52°C, a população encontrou no subsolo a melhor forma de sobreviver. A maioria vive em casas escavadas nas rochas, solução que garante conforto térmico e economia.
Essa escolha, que parece excêntrica, pode apontar caminhos para o futuro das cidades em um mundo mais quente.
Localizada a quase 850 km de Adelaide, Coober Pedy impressiona pela paisagem singular. Pirâmides de areia marcam o solo, resultado direto da mineração de opala.
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Esses montes também indicam a presença de moradias subterrâneas. Tubos brancos de ventilação são os sinais mais visíveis de vida no subsolo.
Cerca de 60% dos 2,5 mil moradores vivem em casas dentro das rochas, adaptando-se ao ambiente hostil do deserto.
O calor que obriga a inovar
No verão, as temperaturas alcançam níveis insuportáveis. Pássaros caem do céu e equipamentos eletrônicos precisam ser guardados em refrigeradores.
No inverno, morar sob a terra pode parecer extravagante, mas no auge do calor essa decisão se mostra essencial. A estabilidade térmica do subsolo garante condições de vida que seriam inviáveis na superfície.
A prática de se abrigar sob a terra não é nova. Povos antigos recorreram a esse recurso em diferentes partes do mundo.
Ferramentas encontradas na África do Sul e vestígios de neandertais na França confirmam essa estratégia milenar. Até chimpanzés no Senegal foram observados buscando cavernas em dias de calor extremo.
Um dos exemplos mais impressionantes é a cidade subterrânea de Derinkuyu, na Turquia, descoberta em 1963.
Capaz de abrigar 20 mil pessoas, tinha estábulos, igrejas e poços de ventilação. O clima constante de 13°C no subsolo tornava a vida mais confortável e segura.
As vantagens de morar no subsolo
Em Coober Pedy, a temperatura das casas subterrâneas fica estável em torno de 23°C. Enquanto o calor na superfície pode ser sufocante, o interior das residências permanece agradável durante todo o ano.
Essa condição reduz a necessidade de energia elétrica, tornando o estilo de vida mais barato. Jason Wright, morador local, explica que viver acima do solo exige altos gastos com aquecimento e refrigeração, algo impraticável para muitos.
Além da economia, o valor dos imóveis subterrâneos é surpreendentemente acessível. Casas de três quartos podem custar 40 mil dólares australianos, bem abaixo dos 700 mil cobrados em Adelaide.
Outro benefício inesperado é a ausência de insetos, já que moscas evitam entrar nos ambientes escuros e frios. O silêncio e a falta de poluição luminosa tornam a vida subterrânea ainda mais atrativa.
Casas de luxo subsolo
Embora muitas moradias sejam simples, algumas se destacam pelo luxo. Existem casas com piscinas subterrâneas, salões de jogos e grandes banheiros.
Um morador chegou a construir um “castelo”, com 50 mil tijolos aparentes e portas em arco. Wright afirma que há verdadeiras surpresas escondidas sob a cidade, visíveis apenas para convidados.
Até a segurança contra pequenos tremores é citada como vantagem, já que vibrações passam despercebidas sob o solo.
A rocha que facilita tudo
Um dos segredos de Coober Pedy está no tipo de rocha. Arenito e siltito locais são macios e fáceis de escavar, muitas vezes até com a unha.
Essa característica permitiu que moradores ampliassem casas com ferramentas simples ou aproveitassem minas abandonadas como base.
Hoje, máquinas modernas aceleram o processo, removendo metros cúbicos de rocha por hora. A estrutura permanece estável sem necessidade de reforços adicionais, possibilitando salões amplos e criativos.
Curiosamente, a mineração ocasional ainda rende surpresas. Um morador encontrou uma grande opala ao abrir espaço para um chuveiro.
Um hotel descobriu pedras avaliadas em 1,5 milhão de dólares durante uma reforma. Em Coober Pedy, escavar significa tanto morar quanto ter a chance de enriquecer.
Onde esse modelo não funciona
Apesar de seus benefícios, a vida subterrânea não pode ser aplicada em qualquer lugar. Regiões úmidas enfrentam sérios desafios.
O metrô de Londres, por exemplo, exigiu várias camadas de impermeabilização no século XIX. Ainda assim, problemas de mofo persistem.
Cavernas em Israel, construídas em rocha porosa, sofrem com umidade dobrada, tornando os espaços inóspitos.
Em Coober Pedy, o cenário é diferente. A cidade está sobre arenito seco, que permite a circulação de ar pelos poços de ventilação.
Isso garante conforto e evita a deterioração causada pela umidade. O clima árido faz da região um caso especial, difícil de ser replicado em locais mais úmidos.
Os riscos e o futuro
Embora existam relatos de desabamentos ocasionais, como o que atingiu a antiga casa de Barry Lewis, do centro turístico local, os moradores consideram a vida subterrânea segura.
Wright reforça que a experiência compensa qualquer preocupação. Para ele, basta sentir o calor de 50°C na superfície para valorizar o abrigo fresco de sua casa.
O exemplo de Coober Pedy mostra a capacidade humana de se adaptar a condições extremas. Com o avanço das mudanças climáticas, soluções parecidas podem ganhar espaço em outras partes do mundo.
O subsolo, visto muitas vezes como alternativa curiosa, pode se tornar resposta prática a um planeta cada vez mais quente.
Assim, se novas ondas de calor se espalharem, outras cidades talvez sigam o modelo australiano. Pirâmides de areia semelhantes às do deserto australiano podem surgir em diferentes regiões, marcando um futuro em que morar sob a terra deixa de ser exceção e passa a ser estratégia essencial de sobrevivência.
Com informações de Gazeta de São Paulo.