Governo adota abordagem cautelosa para transição energética e gera alerta sobre riscos à sustentabilidade, ao protagonismo internacional e às metas climáticas
A transição energética representa um dos temas mais urgentes do século XXI. Embora o mundo inteiro busque reduzir suas emissões de gases de efeito estufa, o processo exige não apenas compromissos formais, mas principalmente mudanças estruturais.
No caso do Brasil, apesar de possuir um vasto potencial em fontes limpas como solar, eólica e hidrelétrica, o governo ainda aposta em uma abordagem cautelosa para transição energética, o que preocupa especialistas e organizações da sociedade civil.
Embora o Instituto Talanoa reconheça o avanço representado pela publicação da Estratégia Nacional de Mitigação, a entidade alerta para a necessidade de decisões mais ousadas. Por isso, ao analisar o plano, que será parte fundamental do Plano Clima, o Talanoa destaca que ele ainda permite a continuidade dos combustíveis fósseis.
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Dessa forma, em vez de impulsionar a descarbonização do setor energético, o documento projeta estagnação ou até aumento das emissões até 2035.
Por conseguinte, essa postura pode dificultar o cumprimento das metas do Acordo de Paris, além de comprometer o papel do Brasil na nova economia de baixo carbono.
Ainda que o país tenha feito promessas públicas, sua conduta prática revela contradições que, segundo o Talanoa, precisam ser enfrentadas com urgência.
Compromissos globais e o papel histórico do Brasil
Para compreender essa hesitação, é essencial retomar o contexto histórico. Desde a criação da Convenção do Clima da ONU nos anos 1990, o Brasil tem participado de maneira ativa das negociações multilaterais.
Embora o Protocolo de Kyoto não exigisse metas dos países em desenvolvimento, o Brasil se apresentou como uma voz influente. Posteriormente, em 2015, o Acordo de Paris consolidou um novo paradigma, no qual todos os países — inclusive o Brasil — passaram a ter compromissos climáticos voluntários.
Apesar disso, o país segue adotando uma postura tímida na prática. Embora tenha assumido metas ambiciosas em suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), a aplicação dessas metas encontra obstáculos internos.
Por exemplo, o setor energético, um dos mais estratégicos para a mitigação climática, continua apoiado em combustíveis fósseis e recebe subsídios que perpetuam esse modelo.
Por outro lado, a maioria dos países que compõem o G20 já acelera seus investimentos em energias limpas. Dessa maneira, o Brasil corre o risco de perder oportunidades econômicas e de inovação, além de comprometer sua imagem internacional.
Assim, a abordagem cautelosa para transição energética pode parecer estratégica em um primeiro momento, mas revela sérias fragilidades no longo prazo.
Matriz energética nacional e abordagem cautelosa para transição energética
Embora a matriz energética brasileira seja mais limpa que a média global, o país começou a ampliar o uso de termoelétricas a gás, carvão e óleo diesel nas últimas décadas, especialmente em momentos de crise hídrica.
Enquanto isso, países como China, Estados Unidos e Alemanha aceleram investimentos em energia solar e eólica, tornando-se líderes em inovação e capacidade instalada.
Ainda assim, o Brasil continua investindo abaixo do seu potencial em fontes renováveis. Isso se reflete no conteúdo da Estratégia Nacional de Mitigação, que não impõe limites rígidos à expansão dos combustíveis fósseis.
Assim, o plano falha em cumprir o que se espera de uma política pública voltada à sustentabilidade.
Além disso, especialistas apontam que manter essa dependência de fontes poluentes compromete a segurança energética e climática do país.
Nesse sentido, é possível dizer que o Brasil perde uma chance de liderar um novo modelo energético que combina eficiência, baixo custo e respeito ao meio ambiente. Portanto, mudar essa direção é não apenas necessário, mas inevitável.
Contradições internas e crítica do Instituto Talanoa
A crítica do Instituto Talanoa se concentra nas incoerências presentes dentro do próprio Plano Clima. Enquanto o eixo de Adaptação apresenta soluções concretas, o de Mitigação se mostra limitado.
Como afirmou Natalie Unterstell, presidente da organização: “Usar a crise climática como desculpa para travar renováveis é dar um tiro no pé.”
Além disso, Natalie defende que Mitigação e Adaptação devem caminhar juntas. Portanto, permitir retrocessos em uma das áreas compromete a eficácia da outra.
Ao permitir a expansão dos combustíveis fósseis sob justificativa de segurança energética, o governo contradiz os próprios objetivos de longo prazo.
Por outro lado, a sociedade civil pode e deve ocupar espaço nesse debate. Afinal, políticas climáticas precisam refletir os anseios da população.
Quando há participação social, a política pública se torna mais legítima, eficaz e democrática.
Participação social como chave para mudanças
Diante disso, o governo abriu uma consulta pública sobre a Estratégia Nacional de Mitigação. O prazo se estende até meados de agosto e representa uma oportunidade decisiva para que a sociedade influencie o rumo da política energética.
A pressão da sociedade civil tem sido fundamental para que avanços aconteçam em diversas áreas, e com a energia não é diferente.
Portanto, engajar-se nesse debate é essencial. Ao contribuir com sugestões, críticas e propostas, a sociedade ajuda a evitar retrocessos.
Além disso, fortalece o vínculo entre ciência, política pública e democracia. Embora esse processo seja desafiador, ele também é promissor.
Nesse sentido, o próprio Instituto Talanoa acompanha atentamente cada etapa do plano. A entidade oferece análises técnicas e sugestões baseadas em evidências científicas, contribuindo para um debate qualificado.
Assim, a participação social se traduz não apenas em cidadania, mas também em transformação.
Oportunidade de liderança e riscos da hesitação
Por tudo isso, manter uma abordagem cautelosa para transição energética significa abrir mão de um futuro mais seguro e competitivo. Embora o país enfrente desafios econômicos e sociais, há também janelas de oportunidade únicas.
A abundância de sol, vento, biomassa e rios oferece vantagens naturais raras.
Além disso, a descarbonização pode gerar empregos, atrair investimentos e fortalecer o desenvolvimento regional. Países que apostam em inovação e sustentabilidade já colhem resultados.
Por isso, o Brasil precisa alinhar suas decisões aos caminhos mais promissores da economia global.
Enquanto outros aceleram, o Brasil hesita. No entanto, ainda é possível virar o jogo.
Desse modo, substituir os subsídios aos fósseis por apoio à pesquisa, à inovação e à expansão das renováveis é uma das mudanças mais urgentes.
Embora pareça difícil no curto prazo, trata-se de um movimento estratégico para o futuro.
Caminhos para o futuro: mais ação e menos hesitação
Em conclusão, o Brasil se encontra diante de uma encruzilhada. A abordagem cautelosa para transição energética, embora compreensível sob certas perspectivas, não condiz com os desafios climáticos do nosso tempo.
Além disso, compromete o protagonismo internacional do país e mina sua competitividade.
Contudo, há tempo para mudar. Com mais ambição, coerência e participação, o país pode transformar seu potencial em realidade.
Assim, a transição energética deixa de ser um risco e passa a ser uma oportunidade. Por fim, cabe ao Brasil escolher entre a hesitação e a liderança.