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Brasil assume protagonismo logístico na América Latina com megacorredores que ligam Atlântico ao Pacífico e podem reduzir em até 10 dias o tempo de exportação para a Ásia

Escrito por Noel Budeguer
Publicado em 28/06/2025 às 16:23
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O futuro do comércio global passa pelo Brasil: nova ferrovia com China promete acelerar exportações e reduzir custos logísticos em até 40%

Em meio a uma disputa comercial e geopolítica cada vez mais acirrada, China e Estados Unidos analisam diferentes estratégias com o objetivo de encontrar rotas alternativas que permitam o fluxo de mercadorias entre os oceanos Pacífico e Atlântico.

Essas iniciativas têm origem na operação do consórcio formado pelo fundo de investimentos norte-americano BlackRock e a operadora portuária TIL, do grupo MSC, que pretende assumir o controle das operações da multinacional de Hong Kong Hutchison Port Holdings, tanto na extremidade do Pacífico quanto no Atlântico do Canal do Panamá. Os últimos desdobramentos dessa megaoperação teriam frustrado, em parte, a aspiração dos EUA de controlar a operação do Canal, colocando em xeque o domínio deste ponto neurálgico de trânsito interoceânico e abrindo espaço para importantes alternativas logísticas.

Enquanto isso, a América Latina avança com força em uma transformação sem precedentes de sua arquitetura logística: projetos ferroviários, rotas rodoviárias bioceânicas e novas instalações portuárias estão reconfigurando as cadeias de suprimento. Mas essas obras estão associadas a estratégias profundas que merecem análise cuidadosa.

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América Latina no centro do tabuleiro geoestratégico

As rotas comerciais já não são projetadas considerando apenas a eficiência logística — agora também servem como instrumentos de influência política e comercial por parte dos Estados. Graças à sua posição geográfica e ao crescente protagonismo exportador, a América Latina entrou de vez nas disputas globais pelo controle dos novos corredores interoceânicos, com múltiplas propostas espalhadas pelo continente.

Estados Unidos e China, as duas maiores economias do mundo, disputam silenciosamente um lugar nas novas rotas alternativas que pretendem conectar as costas atlântica e pacífica. Interesses logísticos, portuários, diplomáticos e militares se sobrepõem nesses novos projetos.

É fundamental analisar com atenção essa transformação no mapa logístico global, incluindo a criação de quatro novas rotas bioceânicas, para compreender os próximos passos das cadeias de suprimento globais. A mudança de controle das terminais panamenhas, a consolidação de corredores ferroviários entre o Peru e os portos brasileiros, a nova via que fortalece a colaboração entre Chile, Argentina, Paraguai e Brasil, a proposta conjunta entre EUA e Guatemala, além da proposta inovadora que atravessa o istmo mexicano, formam as principais iniciativas — embora não sejam as únicas.

Panamá na origem da disputa comercial

Durante mais de um século, o Canal do Panamá foi o principal “chokepoint” na conexão entre os oceanos. Diante dos recentes acontecimentos geopolíticos e comerciais entre as grandes potências, somados à crise climática que afetou a operação do Canal, tanto Pequim quanto Washington começaram a considerar soluções alternativas de ligação interoceânica.

Há alguns meses, a Hutchison Holdings anunciou sua intenção de vender sua rede de 43 terminais — incluindo Balboa e Cristóbal, em ambas as extremidades do Canal — firmando um acordo com o consórcio liderado pela MSC (por meio da TIL) e a BlackRock. No entanto, a operação foi temporariamente suspensa. A principal razão foi a pressão de Pequim, que viu a transação como uma ameaça à sua influência regional. Em resposta, a MSC iniciou negociações com a COSCO Shipping para integrar o consórcio, buscando assim a aprovação do governo chinês. Segundo a Bloomberg, outras empresas estatais chinesas, como o conglomerado China Merchants Port Holdings, também poderiam se juntar ao acordo.

O plano original previa que a MSC controlaria a maioria das 41 terminais globais, enquanto a BlackRock e seu fundo Global Infrastructure Partners (GIP) ficariam com 51% das terminais panamenhas, deixando os 49% restantes sob controle da MSC. Isso foi interpretado pelo governo dos EUA como uma “vitória estratégica”, por impedir o controle direto da China sobre essa infraestrutura-chave.

No entanto, o administrador do Canal do Panamá, Ricaurte Vásquez, declarou recentemente: “Se houver uma concentração significativa de terminais operados por uma única companhia integrada ou por uma única empresa de navegação, isso ocorrerá às custas da competitividade do Panamá e da neutralidade do Canal”.

Para contornar esse impasse, propôs-se dividir a operação em dois blocos: um com as terminais centro-americanas (Panamá) e outro com as demais. O prazo de exclusividade para negociação entre MSC e Hutchison expira no final de julho. Se não houver acordo, a operação pode ser cancelada por completo.

O Corredor do Dragão: o Plano B de Pequim

No Peru, o porto de Chancay, controlado pela COSCO Shipping, avança como peça central do “Plano B” da China. Por meio de uma aliança com o Brasil, o gigante asiático pretende conectar, por ferrovia, o litoral pacífico ao porto atlântico de Santos. Isso permitiria uma rota direta entre a Ásia e a costa atlântica brasileira, fortalecendo o eixo logístico transpacífico-chinês. Esse megaprojeto, que atravessa regiões andinas e amazônicas, oferece vantagens logísticas claras: redução de tempo, pedágios e exposição a tensões políticas ou marítimas.

A economia no “transit time” pode chegar a 10 dias. Trata-se de uma manobra geopolítica de alto nível. O desvio de cargas a granel (minério de ferro, soja, grãos, etc.) e conteinerizadas para o Pacífico não só oferece uma alternativa mais rápida e barata para os exportadores sul-americanos, como também fortalece a posição da China nas cadeias de suprimento globais.

O porto de Chancay, localizado a 80 quilômetros ao norte de Lima, está projetado para se tornar um dos principais hubs logísticos do Pacífico sul-americano. Esse megaporto de águas profundas será o primeiro do continente inteiramente planejado para receber navios de grande porte sem dragagem contínua. Do ponto de vista técnico, o projeto inclui a construção de quatro berços para navios de até 18.000 TEUs, um túnel logístico de 1,8 km que conectará a área operacional às zonas de serviços logísticos e alfandegários, e uma área de expansão de mais de 800 hectares. Tudo isso ajudará a aliviar a sobrecarga do porto de Callao e integrar-se ao futuro sistema ferroviário.

Do ponto de vista geopolítico, o projeto reforça a presença chinesa na América do Sul. O próprio presidente Xi Jinping classificou Chancay como “projeto estratégico da Rota da Seda Marítima”. Analistas internacionais destacam que esse ponto permite a Pequim projetar sua influência sobre os corredores energéticos e minerais da região andino-amazônica.

O Corredor Bioceânico Capricorniano

Simultaneamente, Chile, Argentina, Paraguai e Brasil estão promovendo o Corredor Bioceânico Capricorniano, uma rodovia de mais de 2.400 km que conecta os portos brasileiros de Santos e Itajaí aos portos chilenos de Antofagasta, Mejillones e Iquique. Essa infraestrutura, prevista para estar operacional em 2027, promete reduzir em até 40% os custos logísticos, consolidando-se como a principal via de cooperação e exportação agroindustrial da região.

Com o Corredor Capricorniano, o Brasil consolida sua liderança como exportador agroalimentar, com participação de 43% nas exportações latino-americanas. Essa ligação terrestre é estratégica para acelerar os fluxos para a Ásia e diversificar as rotas de escoamento do continente.

O Paraguai se beneficiará com a saída de seus produtos para o mar. Setores como agricultura, mineração e pecuária aproveitarão o corredor para alcançar os portos chilenos com rapidez e, a partir deles, o vasto mercado asiático. Trata-se de uma alternativa terrestre às rotas marítimas tradicionais, reduzindo significativamente os custos logísticos. Para exportadores do sul do Brasil e do Paraguai, é especialmente vantajosa por permitir acesso mais ágil à janela exportadora do Pacífico, com economia operacional, de frete e de tempo — além da forte integração econômica entre os países envolvidos.

A proposta conjunta de Guatemala e EUA

As apostas da China em Chancay e a proposta do novo corredor Capricorniano estimularam uma resposta dos Estados Unidos, que vai além de buscar maior influência no Panamá. A estratégia de Washington envolve seu aliado Guatemala, que desponta como peça-chave no desenvolvimento de um corredor interoceânico alternativo em seu território.

O acordo prevê a construção de uma ferrovia de 372 km, evidenciando o interesse dos EUA em estabelecer uma via logística sob sua influência direta, conectando os novos portos de San Luis (Pacífico) e San Jorge (Atlântico). Estes se tornarão os maiores portos da América Central e poderão receber navios porta-contêineres que, por seu tamanho, não conseguem atravessar o Canal do Panamá. A capacidade de movimentação estimada é de até 9 milhões de TEUs por ano, com base nos números atuais da costa leste dos EUA.

Esse projeto, com financiamento misto, busca se tornar a nova “espinha dorsal logística” da América Central, com apoio de instituições como a Corporação Financeira de Desenvolvimento dos EUA (DFC).

O Corredor Interoceânico do Istmo de Tehuantepec

O México também tem sua própria proposta de corredor interoceânico. Uma ferrovia de 308 km conecta os portos de Salina Cruz (Pacífico) e Coatzacoalcos (Atlântico). Liderado pela Secretaria da Marinha, o projeto oferece uma plataforma logística integrada, conectando oceanos por meio de ferrovias, estradas, portos e zonas industriais, transformando o istmo em um grande polo industrial.

De acordo com Octavio Sánchez Guillén, responsável pelo projeto, o corredor terá influência direta sobre os estados de Veracruz, Oaxaca, Tabasco e Chiapas, integrando as operações dos portos de Coatzacoalcos, Salina Cruz, Dos Bocas e Puerto Chiapas.

A economia de tempo é significativa: o trem levaria 72 horas para ligar as duas costas, enquanto o trajeto via Canal do Panamá pode levar de 15 a 20 dias. O impacto econômico é considerável, podendo gerar cerca de 50 mil empregos nos novos polos industriais. A expectativa é de que o projeto esteja concluído até 2026.

Um continente focado em seu desenvolvimento logístico

A venda dos ativos da Hutchison, a saída do Panamá da Rota da Seda, os problemas de congestionamento e os impactos climáticos no Canal sugerem mudanças em direção a países como Chile, Brasil, Peru, Guatemala e México, que emergem como novos nós logísticos interoceânicos.

A América Latina está sendo reconfigurada logisticamente, tanto internamente quanto nas conexões globais, com infraestrutura moderna. A competição entre potências catalisou investimentos, alianças e rotas alternativas, redistribuindo o poder geoeconômico no continente.

Não se trata mais apenas de transportar mercadorias, mas de controlar fluxos, estabelecer dependências e moldar o futuro de um continente que, por sua localização e capacidade produtiva, volta a ser mais cobiçado do que nunca. Conflitos bélicos, pressões geopolíticas e tarifárias realçam o valor de uma América Latina que cresce com estabilidade notável.

Panamá anuncia um ambicioso plano de expansão do Canal

Diante desse cenário, as Autoridades do Canal apresentaram recentemente seu Plano Diretor 2035, que prevê investimentos de até 8 bilhões de dólares. Segundo o administrador Ricaurte Vásquez, o plano inclui a ampliação de portos, criação de um corredor logístico, garantias hídricas para melhorar a operação, construção de um gasoduto de 80 km pelo istmo e reativação do porto de Corozal, entre outras melhorias. Trata-se de uma iniciativa ambiciosa para recuperar o pleno potencial do Canal.

Para atender ao aumento do tráfego de navios transportadores de gás — que deve dobrar na próxima década — será construído um gasoduto como alternativa viável para o transporte de GLP da costa leste à costa do Pacífico. Um dos destaques do plano é a criação de um terceiro conjunto de eclusas, para ampliar a capacidade de operação e reduzir os tempos de espera dos navios.

A simultaneidade dos investimentos no Panamá e o avanço dos novos corredores bioceânicos abrem espaço para que grandes operadores logísticos disponham de diversas alternativas para traçar suas estratégias.

Nos próximos cinco anos, é provável que presenciemos mudanças significativas, impulsionando alguns hubs logísticos em detrimento de outros — mas esse será tema para uma análise estratégica mais aprofundada.

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Noel Budeguer

Sou jornalista argentino, actualmente radicado en Río de Janeiro, Brasil, con trayectoria enfocada en la cobertura de temas militares, defensa, ciencia, tecnología, energía y geopolítica. Mi objetivo es traducir información técnica y compleja en contenidos accesibles y relevantes para un público amplio, siempre manteniendo el rigor periodístico. Sou apaixonado por explorar como a tecnologia y defensa impactam a sociedade eo desenvolvimento econômico. https://muckrack.com/noel-budeguer?

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